Evento de moda aborda negócios e bate-papos com estilistas internacionais
Digital e gratuita, a quarta edição do Iguatemi Talks Fashion englobou painéis sobre estilo, economia e comportamento
atualizado
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O Iguatemi Talks Fashion chegou à quarta edição em novo formato. Em meio à pandemia, o evento nacional precisou ser adaptado, tornando-se digital e gratuito. Nos dias 20 e 21, a conferência reuniu debates com foco em diferentes vertentes. Entre os destaques, estão bate-papos com os estilistas internacionais Giambattista Valli e Margherita Missoni. Para completar, painéis sobre o promissor mercado de segunda mão e os negócios de moda, em geral. Nesta quinta-feira (22/10), o cronograma será encerrado.
Vem comigo saber tudo!
Com apresentação principal de Caroline Ribeiro, a iniciativa foi aberta por Carlos Jereissati, CEO da Iguatemi Empresa de Shopping Centers, na terça-feira (20/10). A partir de então, foi dada a largada para uma série de transmissões.
O executivo destacou o propósito de levar conhecimento, inspiração e reflexão de uma forma mais acessível, graças à tecnologia. “Vivemos um momento muito desafiador, mas é interessante ver a capacidade de reinvenção que a indústria tem”, destacou Jereissati. “Fomos capazes, nesse tempo todo, de poder ajustar a nossa programação e a nossa forma de conviver com o público”, assinalou.
Giambattista Valli
O primeiro painel do lineup foi com ninguém menos que Giambattista Valli, entrevistado pela jornalista Maria Prata. O estilista italiano é um dos poucos não franceses que se tornaram referência em alta-costura. Com tules, volumes e drapeados, ele é presença constante nas semanas de moda de Paris.
Recentemente, para a primavera/verão 2021, o designer optou por apresentar a nova coleção virtualmente. Durante o Paris Fashion Week, em 5 de outubro, a marca revelou as peças em um vídeo de pouco mais de 10 minutos. A ideia foi proporcionar uma “viagem introspectiva na natureza poderosamente florescente do Mediterrâneo”.
Na participação no evento brasileiro, Valli contou que em tempos de turbulência tenta carregar otimismo, mas sempre com responsabilidade. “É um momento muito difícil, do ponto de vista de vários aspectos, mas sempre acho que podemos ter boas ideias. Sempre há muitas possibilidades para explorar. Achei que foi muito mais importante transmitir uma mensagem, mais do que dar um contexto do distanciamento social e o uso de máscaras”, declarou.
Para Giambattista Valli, a pandemia fez o público buscar mais conforto e funcionalidade na hora de se vestir. Além disso, o estilista apontou que é possível encontrar equilíbrio entre a originalidade e a criação de roupas que sejam atrativas comercialmente.
“Neste momento, o Instagram levou as pessoas a serem mais visuais, a chamar a atenção. A moda está seguindo esse estilo, e jovens estilistas estão se projetando, mas, por trás disso, também tem a realidade dos compradores”, reconheceu. “É preciso ter uma ideia clara de quem é o seu consumidor final, quem é o seu público-alvo, porque a moda é uma forma de arte, mas não é a arte”, acrescentou Valli, durante a participação no Iguatemi Talks Fashion de 2020.
Na conversa com Maria Prata, o designer também falou sobre a amplitude de possiblidades quando o assunto é criação de moda. Ele relembrou que, no ano passado, fez uma parceria com a H&M para criar peças que uniram a pegada descolada do fast fashion com a elegância da haute couture.
“Foi importante compartilhar essa mensagem com um grupo maior de pessoas: a coleção foi para meninos e meninas, jovens e mais velhos. Foi muito interessante, esgotou em alguns minutos. É muito importante inspirar as pessoas, ter uma mensagem para transmitir; não é só uma questão de preço, é um estilo sem esforço”, opinou Giambattista Valli. “A ideia foi dar pedacinhos de alta-costura para as pessoas, fui honesto”, salientou.
Second hand e economia circular
Temática também abordada na edição de 2019 do Iguatemi Talks Fashion, a sustentabilidade marcou presença mais uma vez. Ernesto Xavier, editor da GQ Brasil, comandou o painel com as convidadas Ana Khouri, Gabriella Constantino, Juliana Santos e Natalia Hohagen. Elas discutiram as novas formas de consumo consciente.
Um dos pontos citados foi que o surto da Covid-19 e a crise sanitária não enfraqueceram o segmento de segunda mão. Pelo contrário, pesquisas recentes mostram que o período de isolamento social fez com que as revendas aumentassem. De acordo com um estudo da plataforma ThredUp, o setor deve movimentar cerca de US$ 64 bilhões até 2024.
Natalia Hohagen é CEO e fundadora do Roupartilhar, leilão beneficente criado durante o período de isolamento social, em abril. No evento de moda, ela explicou que o estigma em relação aos brechós foi deixando de existir. “Há seis anos, isso era outro universo, era muito estereotipado”, lamentou.
“Por estarmos em casa e fazendo mais uso das compras on-line, de pesquisa, e também de ter esse momento interno de olhar para dentro e ressignificar o nosso consumo e entender melhor para onde estamos direcionando nossos recursos, [a pandemia] foi totalmente um acelerador desse mercado”, completou Hohagen.
Uma das convidadas, Ana Khouri fundou o Projeto Ovo em 2014. Radicada nos Estados Unidos, a joalheira criou o brechó virtual no Instagram, com a proposta de destinar 100% do lucro das vendas para ONGs no Brasil. Os produtos são fruto de doações (anônimas ou não). Nos últimos sete meses, a plataforma arrecadou cerca de R$ 2 milhões e ajudou mais de 50 projetos sociais.
Na visão da paulista, a mudança veio para ficar. “Nasceu de uma vontade de ajudar o próximo e de fazer circular, de olhar o todo como parte de nós mesmos”, esclareceu. “A única maneira de ir para frente é focando em reaproveitar o que já existe, afinal a moda polui muito”, ressaltou.
Sócia-diretora da multimarcas Dona Santa, Juliana Santos é a idealizadora do projeto Circular, que une a venda de itens usados a um viés social. No bate-papo, a recifense destacou que, segundo dados globais, o second hand deve ultrapassar o tamanho do fast fashion nos próximos anos. “É uma mudança total de comportamento, por sustentabilidade e conscientização. Observando isso, procuramos atualizar o formato do negócio”, contou.
A empresária também citou que é preciso que as empresas sejam vetores de informação sobre a economia circular, além de terem atitude. “Parte muito da iniciativa de empresas e de pessoas que promovam e façam esse trabalho de conscientizar o consumidor”, apontou Juliana. “É uma grande responsabilidade de todos quem produzem ou vendem moda, fazer com que isso acelere e dê certo”, destacou.
Fundadora do e-commerce de seminovos Pretty New, a brasiliense Gabriella Constantino enfatizou no debate que os adolescentes e os jovens têm importante papel no impulso do mercado de revendas. “Há a ascensão de um novo consumir, que é a geração Z. É um público que questiona muito o seu impacto na forma de consumir; que prioriza marcas com propósito e as peças de segunda mão”.
A empreendedora, que está no setor desde 2014, salientou ainda que grandes marcas vêm aderindo práticas mais conscientes e abraçaram o mercado de segunda mão. “Hoje em dia, uma empresa tem que ter responsabilidade social para poder conseguir sobreviver”, observou. Gabriella mencionou nomes como Levi’s, Gucci, Burberry e Stella McCartney.
Margherita Missoni
Na abertura do segundo dia, a diretora de conteúdo da Vogue Brasil, Paula Merlo, comandou uma entrevista leve com Margherita Missoni. Mais uma convidada internacional para reforçar as participações renomadas no evento. A herdeira da casa de moda Missoni ocupa o cargo de diretora criativa da linha M Missoni desde 2018.
Margherita definiu a linha como “moda real”, que tem a macrotendência da sustentabilidade marcada em seu DNA. “A M tem a ver com as roupas do dia a dia, não só com as tendências, mas com verdadeiras necessidades. Não criamos nada do zero. Pegamos o que já existe, tudo o que foi deixado, que sobrou de outras histórias, pegamos pedacinhos, retalhos e ressignificamos.”
Seguindo as origens da etiqueta da lendária de família, Margherita mora na Itália. Com a chegada da pandemia e da quarentena, a estilista entrou em um momento de aprendizado, crescimento pessoal e profissional.
Para contribuir com os esforços de ajuda para combater o vírus, a designer recorreu ao próprio closet com o intuito de revender alguns de seus itens favoritos, com 100% da renda revertida para a região da Lombardia, uma das áreas mais afetadas no país pela Covid-19.
No momento de reabertura das lojas, bolsas desenvolvidas em parceria com a OrphanAid Africa desembarcaram em solo brasileiro. Margherita está envolvida com a organização sem fins lucrativos desde 2004. “Eu sempre encontro formas de arrecadar fundos para apoiar o projeto. Com a M Missioni, temos o objetivo de criar uma fonte de renda e trabalho em áreas do mundo”, ressaltou.
“Vi um tipo de tecelagem bucatanga e me apaixonei; eles fazem cestas, bolsas e peças lindas. Eu criei dois modelos que são feitos por lá, e a gente finalizou com tecidos e couro na Itália. Parte do lucro vai para a OrphanAid Africa. O principal objetivo foi criar empregos no país”, explicou.
A Missioni inaugurou lojas físicas no Brasil recentemente. Paula Merlo questionou a empresária sobre a moda brasileira. A estilista contou que vê semelhanças. “Acredito que brasileiros e italianos têm uma afinidade estética em relação a estampas e cores. Nós gostamos de nos mostrar e de nos expor, e a M Missioni é bastante ousada nesse sentido”, assinalou.
Essa ousadia se reflete, por exemplo, em uma parceria da marca com a plataforma Awaytomars. Trata-se de uma collab que permite a criação de coleções colaborativas a várias mãos, com todo o apoio e estrutura da grife italiana.
Negócios da moda
A pandemia já mudou o cenário dos negócios de moda. Muitas marcas começaram a abordar a sustentabilidade e implementar novas estratégias. No painel Negócios da Moda, essas adaptações não passaram em branco. Além disso, a ideia foi discutir métodos para a comercialização e produções de roupas. Todos os assuntos foram intermediados por Ivan Padilla, editor executivo de vida e estilo da revista Exame.
Uma das convidadas, Fernanda Hoefel, sócia da empresa McKinsey Brasil, citou uma pesquisa recente que comprova os novos comportamentos dos consumidores. “Fizemos um estudo sobre a geração Z, que é extremamente voltada para a questão da sustentabilidade e o impacto que suas ações tem no planeta e na sociedade. Atualmente, não é o principal driver de compra, mas daqui a 5 anos certamente vai ser um dos principais do mercado”, pontuou.
Ela assinalou ainda que, de acordo com os dados registrados, compradores de todas as regiões do Brasil e de diferentes tipos de renda estão mais ligados em relação aos impactos ambientais. “As pessoas estão cada vez mais preocupadas com a questão da sustentabilidade e com o planeta. Essa crise afetou as pessoas de uma maneira diferente das anteriores, por criar a certeza da perda financeira e uma incerteza enorme sobre o seu bem-estar e dos que estão ao redor”, afirmou a pesquisadora e empresária.
Mesmo diante da pandemia mundial, avanços foram notados na varejista Riachuelo. “Inicialmente, nos preocupamos com nossa equipe e colaboradores. A parte boa foi a ascensão do nosso e-commerce. Foi um ano de muito aprendizado, vamos sair bem mais fortes”, pontuou Marcella Kanner, head de comunicação e marca da empresa. “No começo foi muito difícil, ninguém imaginava que o vírus iria chegar aqui com tanta intensidade. Apostamos na transparência e decidimos ajudar no momento. O que pediríamos fazer? Costurar!”, acrescentou durante o Iguatemi Talks Fashion.
Enquanto grande parte da população respeita as medidas de segurança no Brasil e opta por compras virtuais, dados auxiliam as marcas a mensurar e conhecer melhor seus clientes. De olho nisso, Alexandre Birman redobrou o mapeamento de informações e já planeja as publicidades de fim de ano.
“Desde 2012, começamos a estruturar uma base de dados, e a cada cinco anos temos por hábito trazer uma consultoria de grande porte e refletir sobre o nosso negócio. Esse Natal vai ser um pouco diferente, acho que as pessoas vão evitar as aglomerações, filas, e estamos trabalhando para customizar as listas de presente. Também estamos pensando nos homens, e vamos criar um calendário on-line com 10 dias antecipados”, revelou o CEO da Arezzo & CO.
Programação
O Iguatemi Talks Fashion de 2020 termina nesta quinta-feira (22/10). A programação do último dia será focada em workshops. Entre os conteúdos abordados, estarão tendências de cores, produção de conteúdo de moda para o Instagram e o YouTube, técnicas de fotografia, posicionamento em redes sociais e influência.
Nos dias anteriores, o evento também reuniu painéis sobre temas como o avanço de tecidos antivirais, a transformação do omnichannel e lideranças de mulheres. Para completar, houve uma entrevista com Gwyneth Paltrow sobre empreendedorismo e planos para a Goop, ferramenta de lifestyle comandada pela norte-americana.
Colaboraram Rebeca Ligabue e Sabrina Pessoa