Apaixonada pelo Cerrado, escritora Tatiana Nascimento usa amor na arte
Com poemas, livros e canções como parte do repertório profissional, a artista brasiliense evoca variadas subjetividades
atualizado
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Apesar de ser uma “brasiliense sem orgulho”, Tatiana Nascimento reverencia as raízes do Cerrado. Aos 43 anos, a escritora, poetiza e cantora se consolida como uma das principais vozes expoentes do país. Com uma carreira repleta de percalços, a artista constrói uma base sólida de admiradores dos trabalhos, que têm o amor como uma língua em comum. Nesta quinta-feira (25/7), para celebrar o Dia Nacional do Escritor, a coluna apresenta uma entrevista com a autora de obras como Palavra Preta e Três Tigres Tortas.
Vem conhecer!
Tatiana Nascimento
Entre endereços em locais como Plano Piloto, Novo Gama, Águas Claras e Núcleo Bandeirantes, no Distrito Federal, Tatiana Nascimento aprendeu a “ser gente”, como ela mesma define. Formada em letras, pela Universidade de Brasília (UnB), a artista tem uma paixão pelo universo da escrita que vem desde a infância. “Eu escrevo desde muito nova; aquela história clássica de pessoas tímidas. Mas eu queria mesmo era fazer cinema”, lembra.
Com mudanças iniciais durante o período de graduação, os ensinos sobre o feminismo foram um divisor de águas na vida da escritora. “Entrei em 2004 [na UnB], então não tinha quase nenhuma literatura negra; fiz parte da primeira turma de cotas. Nos primeiros anos, a gente era muito atacado. Teve professor que se recusou a compartilhar a emenda da disciplina”, conta.
Sem deixar com que adversidades externas atrapalhassem, a brasiliense trilhou uma caminho de sucesso na área acadêmica, com a perspectiva crítica sobre as experiências. “Me interessava muito pensar sobre as pessoas que escreviam materiais considerados ‘menores’, como poemas, músicas e cartas, e eram desvalorizadas na universidade”.
Pertencente a comunidades dissidentes, Nascimento reflete como a escrita e a linguagem não são acessadas universalmente. “A língua é um retrato das nossas experiências, dos acordos que a gente faz coletivamente e das dinâmicas de poder que organizam as lutas”.
A artista acrescenta: “Quanto mais poder e perto do centro dos padrões da normatividade, a língua vai ser considerada correta e adequada”. Contudo, defende o papel de resistência.
“A gente se organiza em coletividades, por meio das nossas palavras, para que elas façam sentido, e, assim, conseguir ter alguma capacidade de disputar com as linguagens hegemônicas de discurso”, aponta.
Entre livros, poemas e canções, Tatiana Nascimento utiliza as redes sociais como uma forma de ser “lembrada”. “Sou escritora, compositora e cantora, por isso é difícil ter que manejar a decodificação do meu trabalho em pílulas interessantes para serem compartilhadas”, afirma.
Amor como espelho da subjetividade
Como boa parte dos brasileiros, Tatiana Nascimento teve a própria subjetividade afetiva construída por novelas românticas. Nessas narrativas, o amor é o tema central. “A perspectiva é um romance monogâmico, racializado e gordofóbico. Mas, no meu trabalho poético, penso como parte de uma herança afrodiaspórica de fortalecimento de laços comunitários”, avalia.
A pesquisa poética sobre o amor, com destaque para a perspectiva negra, é um dos materiais mais procurados de Tatiana Nascimento. No Instagram, os textos, que seguem uma característica particular de imagética, com um fundo colorido e letras garrafas, fazem sucesso entre os seguidores. “Gosto de enxergar como uma ferramenta de cura e de autocompreensão. O amor é o espelho da nossa subjetividade que melhor nos reflete”.
Brasiliense às avessas, Tatiana Nascimento diz que, mesmo com todos “defeitos”, não consegue silenciar da memória as maravilhas da cidade. “Aprendi a funcionar mental, espiritual e artisticamente a partir dos ciclos do Cerrado. Demorou para entender que preciso de momentos de introspecção e depois de grande vazão”.
Com novos trabalhos a caminho, como a tradução do segundo livro para outro idioma, lançamento de disco e surpresas sobre o destino dos poemas de amor, Tatiana Nascimento espera a chegada da chuva para desabrochar e fluir. “Minha poesia murcha e cresce, assim como amor”, finaliza.
Brasília Fora dos Padrões
A coluna deu início ao quadro Brasília Fora dos Padrões, como uma extensão da série Moda Brasília. Toda semana, apresentamos pessoas que se destacam pelo estilo próprio, a fim de dar ênfase à moda no Distrito Federal, no Centro-Oeste.
O objetivo é compilar fashionistas que usam o vestuário como uma forma de autoexpressão e autenticidade. Os nomes são selecionados de forma independente pela equipe da coluna. A iniciativa também aborda pautas com temas para além do segmento fashion, como música, entretenimento e arte.