De concorrente a inspiração: a trajetória de Janaina pós-Ortiga
Referência na moda brasiliense, a empresária deixa linha de frente do varejo para, dos bastidores, guiar lojistas de todo o país
atualizado
Compartilhar notícia
Ao anunciar o fechamento da loja que cunhou seu nome na moda local, em 2018, Janaina Ortiga pegou os fashionistas da cidade de surpresa. Após 24 anos inovando o estilo de uma seleta lista de clientes, a empresária decidiu priorizar a família, que há uma década via a brasiliense em jornada intensa entre a capital federal e Belo Horizonte, onde residia desde 2008. No entanto, o que foi visto por muitos como uma perda representou para Janaina o início de nova jornada, marcada pelo reconhecimento de sua bela trajetória profissional.
Vem comigo!
Muito se indagou a respeito dos motivos que levaram Janaina a abandonar seu ponto físico na 309 Norte, hoje ocupado pela Avanzzo. Entre sugestões de crise e desgaste, a brasiliense garante que a escolha foi feita por razões estritamente pessoais.
“Quando abri a loja, aos 19 anos, optei por trabalhar 100% do meu tempo. Abria e fechava a loja, de segunda a sábado. Quando decidi me casar e formar minha família, começou a ficar incompatível, principalmente depois que tive meus filhos. Até uma certa idade, eu vinha a cada dois meses, ficava 15 dias e voltava. Porém, quando começou a alfabetização, os professores começaram a chamar atenção”, conta, com exclusividade à coluna.
Segundo a empresária, o desejo de continuar era grande, mas a crescente quantidade de reuniões e viagens tornou tudo mais complicado. “Combinei com minhas funcionárias que continuaria enquanto desse lucro e elas se comprometeram muito, mas nunca trabalhei menos por isso. Como eu vendia marcas internacionais e de vários lugares do Brasil, precisava viajar muito. Às vezes, vinha para Brasília segunda, voltava terça, e quarta eu estava no Rio. Chegava a viajar três vezes por semana”, lembra Janaina.
Em meio à correria que tomava sua vida, a brasiliense recebeu uma proposta um tanto convidativa. “Daniella Naegele estava procurando um ponto para a Avanzzo na quadra e me pediu ajuda. Como uma pessoa que trabalhava comigo há muitos anos já tinha comentado que estava difícil para mim, ela sugeriu comprar a loja, daí a gente fechou. Foi bom para mim, foi bom para ela”, afirma.
Como a nova dona queria lançar sua próxima coleção no endereço, Janaina precisou encerrar as atividades às pressas. “Nem deu tempo de sofrer. Quando a gente anunciou que ia fechar, uma semana antes, as minhas clientes me encheram tanto de carinho que eu não via motivo para chorar. Sabe quando você fecha um ciclo com sensação de dever cumprido? Foi assim que me senti”, revela a brasiliense.
Depois do fechamento da loja, Janaina tirou um ano sabático para se dedicar à família, mas logo começaram a surgir novas propostas para a empresária. “Muitas pessoas me procuraram para dar consultoria e, como sempre gostei muito de ajudar, resolvi atender algumas”, assinala.
Apaixonada pelos bastidores do varejo, Jana “pegou gosto” pela nova função que se propôs a executar. “Mesmo quando parei com a loja, tudo o que era novidade continuou me interessando, então, continuei estudando o mercado. Amo estudar, por isso me apaixonei pela consultoria. Depois, tive a ideia de criar um projeto em que eu pudesse atender a todos. Fui para o universo on-line, com um Instagram voltado aos lojistas, para passar minha experiência de todos esses anos”, explica.
A nova ferramenta possibilitou que a gestora combatesse algo que sempre a incomodou: a falta de troca de conhecimento entre os lojistas. “A moda é um mundo muito fechado, as pessoas inseridas no meio têm resistência em repassar informações. Nunca aceitei isso bem, porque não tem nada na vida que você não descubra. Se não te dou o fornecedor hoje, daqui a quatro meses você sabe quem é, e sempre gostei muito de compartilhar o que aprendi, nunca quis que ficasse só para mim”, revela.
A notícia que um dos maiores nomes da moda brasiliense estava ofertando os segredos de seu sucesso apeteceu as ex-concorrentes, que passaram a procurar Janaina para ajudar no desenvolvimento de seus negócios.
“Por experiência própria, quando você faz um trabalho legal, o cliente vem. Quando você se dedica ao que sabe, a procura é natural. Você não precisa vender seu produto. Raramente digo que faço consultoria. As pessoas se interessam porque me mostro disponível e procuro atender todo mundo”, pondera.
Tendo obtido sucesso com as coleções próprias da Ortiga, os lojistas começaram a solicitar as expertises da empresária para criarem negócios com a mesma proposta. “Ensino as pessoas a fazerem, acompanhando de perto os processos. No caso da Skaf, executei a coleção inteira, mas meu trabalho é de mentoria. Guio todo o processo, desde o descobrimento do nicho que vai ser trabalhado, passando pela análise do perfil do cliente, até a produção da coleção. A gente estrutura o negócio para depois montar”, destrincha a consultora.
Além da loja de Patricia e Sarah Skaf, Ortiga colabora com mais quatro marcas de Brasília, mas prefere não divulgar quais são. “Tenho contrato de confidencialidade, porque minhas clientes são concorrentes e muito ciumentas. Só em Brasília, atendo cinco lojas. Então, para elas não ficarem me perguntando detalhes das outras, coloco a cláusula”, informa.
De início, Janaina acompanha sua clientela mensalmente, por uma plataforma on-line que se assemelha ao Skype. “Consigo ter acesso ao computador da pessoa e ela consegue ver minha tela, caso seja necessário. O desenvolvimento de coleção, normalmente, acontece em Belo Horizonte, pelas facilidades que tenho de encontrar fornecedores, mas já executei em São Paulo também”, destaca.
Com seus conhecimentos passados adiante, a brasiliense se distancia para que a criatividade do parceiro aflore. “Depois que pega segurança, atendo a cada três meses, apenas para direcionar, conferir e modificar. Tem cliente que eu desenvolvo duas ou três coleções, e a pessoa já consegue andar sozinha”, assegura.
Sabendo a importância que a internet teve para a nova fase de sua jornada, a ex-lojista orienta seus parceiros a explorarem ao máximo as mídias sociais. “É um mundo à parte. A maioria das pessoas não sabe o potencial, alcance e poder financeiro inseridos ali. Hoje, atendo cinco clientes na área de marketing digital, mas tenho mais de 200 alunos on-line. Ano que vem, esse número pode subir para 5 mil. A internet me dá essa possibilidade”, frisa.
Estudando marketing digital desde a época da loja, já que vendia muito via Instagram e WhatsApp, Janaina considera o segmento on-line tão importante quanto os pontos físicos.
“Sempre falo que o on-line tem de ser igual ao off-line. Se você tem uma loja bonita, precisa ter um Instagram bonito. Se você vende bem no off-line, tem de vender bem no on-line. Do mesmo jeito que estou aqui recebendo todo mundo bem, se alguém manda mensagem no Instagram, preciso dar a mesma atenção. O on-line hoje é como uma loja física, mas com custos baixíssimos”, salienta.
Na opinião de Janaina, os e-commerces vão crescer cada vez mais. No entanto, pontua que a venda física nunca vai acabar, principalmente entre o público feminino.
“O produto é energia. Muita gente precisa sentir no corpo. Sempre falei para as minhas vendedoras: se a cliente gostou, faça levar, porque, se deixar esse momento passar, pode ser que ela desista. Tem cliente que faz questão de vestir e provar, então não vai acabar. Você pode ver isso nas grandes marcas. Cada vez mais, elas investem em atendimento e experiência, pois sabem que precisam disso”, avalia.
Questionada sobre os impactos da crise causada pela pandemia do novo coronavírus, Janaina defende que os empresários precisam agir com cautela, focando naquilo que deve ser feito.
“Não é hora de ser aproveitador ou egoísta. O cliente espera senso de comunidade nesse momento. Quem não defender uma causa a partir de agora, não vai sobreviver aos novos valores adquiridos pela sociedade”, analisa a consultora, que dá 10 dicas para os empresários da moda superarem as adversidades geradas pela Covid-19.
Sobre retornar à linha de frente do varejo, a empresária diz que não é algo impossível de acontecer. “Quando vendi a loja, já tinha recebido outras propostas de compra, mas com o nome Ortiga envolvido. Não fechei porque nunca foi meu interesse vender o nome. É uma marca que desenvolvi e não sei se amanhã meus filhos vão crescer e vou querer voltar”, pontua.
“Fiz negócio com a Avanzzo porque incluía tudo, menos meu nome. O nome continua guardado, então pode ser que um dia eu volte. A moda está no meu DNA e é minha vida. Tenho muito prazer em ensinar, mas fazer sempre será uma paixão”, finaliza Janaina Ortiga.
Colaborou Danillo Costa