Copacabana, cenário político e poesia inspiram coleções do SPFW 25 anos
Marcas como Handred, LED, Renata Buzzo, Juliana Jabour, João Pimenta, Martins, Modem e ÃO apresentaram novidades nos dias 6 e 7
atualizado
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Em meio às limitações da pandemia do novo coronavírus, a edição de 25 anos do São Paulo Fashion Week está sendo realizada 100% digitalmente. O lineup da sexta-feira (6/11) reuniu apresentações com conceitos marcantes, incluindo a criatividade confrontadora da LED; o ar poético da estreante Renata Buzzo; o punk esportivo e romântico de Juliana Jabour; e a coleção ensolarada da Handred; além do desfile crítico e impactante da grife João Pimenta.
Já nesse sábado (7/11), chamaram atenção: o vídeo repleto de movimento da Martins; a reflexão sobre o tempo, da Modem; e o mistério da label ÃO. Na lista abaixo, a coluna reuniu alguns dos principais momentos dos últimos dias.
Vem comigo conferir!
LED
Célio Dias usa a criatividade da moda para questionar o cenário político atual do Brasil na nova coleção da Led, intitulada Brasileira. O trabalho reúne o crochê, técnica muito presente nas criações da marca nos últimos três anos, e customizações que ressignificam peças que estavam no acervo da marca, firmando uma pegada mais sustentável. Tingimentos em cores marcantes, feitos por artesãos locais, e o tie-dye acrescentam personalidade às peças. São 36 looks, ao todo.
No desfile virtual, com direção do vídeo por Carlos Queiroz, rapazes desfilam com peças tradicionalmente estereotipadas como femininas, como calcinhas fio dental, tops e itens vazados e reveladores, subvertendo a ideia de gênero. Uma modelo também divide as peças com modelagens amplas da label. Nas estampas, frases contra o machismo e a LGBTfobia, como “abaixo o macho astral”. O styling foi de Thiago Ferraz, enquanto Max Blum cuidou da trilha sonora.
“É inspirada no momento em que eu estou vivendo. É justamente uma vontade de retomar esse Brasil que eu acho que se perdeu um pouco no momento político em que estamos. Sinto que precisamos dar uma retomada no orgulho de ser brasileiro. Sempre tive orgulho do que o nosso país tem”, destacou o designer na live do SPFW.
Renata Buzzo
A leveza dos novos vestidos de Renata Buzzo é combinada com o tom poético do vídeo que apresenta as peças. Silenciosamente, por meio de legendas, a produção é conduzida por um poema feito pela própria designer em fevereiro. “Gosto de escrever. Falo que escrevo para expurgar todos os medos e, às vezes, esses textos acabam virando coleções”, contou ela na live oficial do evento. O texto, batizado de Estudos Melancólicos, reflete sobre inércia, cansaço e introspecção.
Duas modelos desfilam e posam com vestidos repletos de faixas de tecido, franjas formadas por retalhos amarrados e materiais transparentes. A cintura é ora reta, ora marcada, e o comprimento das mangas varia entre opções longas, estilo bishop, e alças. Como na maioria das criações da estilista, que é estreante no lineup do SPFW, as texturas também dão um tom diferencial, especialmente pelas nervuras. Vale lembrar que a marca é vegana, slow fashion e zero desperdício.
Juliana Jabour
A coleção de Juliana Jabour, exibida em um desfile gravado, mescla romantismo, streetwear e uma pegada punk dos anos 1980, que apareceu especialmente nos acessórios e na maquiagem. Vestidos com camadas de babados e saias esvoaçantes são combinados com moletons urbanos. Outros modelos carregam uma pegada oitentista nos volumes, especialmente nas mangas com ombros exagerados, que também aparecem em blazers.
Nesta coleção, que marca o retorno de Jabour ao SPFW após dois anos, ela traz uma parceria com a New Era, marca que desenvolve os bonés da Liga Norte-Americana de Baseball (MBL, na sigla original). O resultado surge em estampas, bordados e patches na forma de bandeiras esportivas. Em especial, dos times Arizona Diamondbacks, Los Angeles Dodgers, New York Yankees e Pittsburgh Pirates, alguns dos mais aclamados da categoria.
Daniel Ueda assina o styling do desfile e Gui Yoshida, a captação de imagens e edição. Essa coleção deu origem a uma cápsula que estará disponível a partir da semana que vem na loja New Era (São Paulo), e também no e-commerce da grife e no marketplace Cartel 011.
Handred
O ano de 2020 transformou o que seria uma coleção de inverno da Handred em um compilado de peças ensolaradas, para o alto verão. Cada detalhe das roupas ressoa uma homenagem a Copacabana, famoso bairro do Rio de Janeiro. Os shapes e os detalhes geométricos resgatam a nostalgia de outros tempos, como as butiques e confecções das décadas de 1970 e 1980, que também inspiram a pegada das peças.
Uma camisa branca longa, usada com uma calça da mesma cor, abriu o desfile. Peças leves, incluindo macacões e itens estampados, que são a cara da pegada da marca, surgiram numa cartela que reuniu bege, azul marinho e cores quentes nos motivos que remetem a essa parte especial da capital fluminense.
“Chegamos em Copacabana de um jeito natural, sentimos o magnetismo. Bairro que reúne memórias da moda, ícones visuais, ritmos e pessoas. É cultura viva, encontro de fluxos. É, sobretudo, inspiração”, definiu a marca. O filme-desfile foi dirigido por Poliana Pieratti. Já a trilha sonora é de Maria Luiza Jobim.
João Pimenta
Com uma apresentação digital impactante, João Pimenta encerrou o cronograma da sexta-feira (06/11). A ideia foi retratar as dificuldades sem precedentes causadas pela pandemia e a crise geral que assombra o mundo. A forte mensagem foi passada com modelos vestidos da cabeça aos pés, sem pele ou sinais vitais à mostra.
“O ano de 2020 iniciou de maneira irregular e o ser humano teve um choque. Por todo o planeta o medo, a insegurança e a presença de algo imperceptível sobressaltou a todos. Estancados, reviramos a história e por um instante os pulmões interromperam suas atividades. Faltou, literalmente, o ar”, apontou a marca, em comunicado.
O paradoxo da realidade chegou aos visuais. Alegórica e com toque de mistério, a coleção é muito mais crítica do que simplesmente fashionista. Com o objetivo de gerar reflexão, a label nos lembra que não existe mudança sem a existência de uma subcultura. Afinal, o pós-apocalíptico é, de certa forma, uma oposição ao sistema dominante. Algumas referências a palhaços possivelmente remetem aos “bozos” do cenário político, que, na realidade, seguirão mostrando o que há de mais tenebroso na sociedade.
Na paleta, destaque para o cinza e o azul, assim como tons rosáceos e terrosos. O estilista apostou em alfaiataria com sobreposições, visuais compostos por retalhos, rendas, babados, balonês e mangas bufantes. Vale reparar também nas silhuetas retas e no trabalho manual, que pode ser percebido em bordados e crochês. Para completar, a força do punk é retratada com spikes pesados.
Martins
Estreante no evento, a Martins veio da Casa de Criadores. Para o debute SPFW, a etiqueta preparou um filme-conceito que foca “no produto e suas possibilidades enquanto uso”, com direção de Gustavo Zylbersztajn e produção do Estúdio Choix. Em meio a batidas eletrônicas, modelos entraram no ritmo da dança.
Fundador e diretor criativo da marca, Tom Martins manteve a brincadeira com proporções, que está no DNA das criações, tendo o oversized como a regra. O fluido se mistura ao amplo, com caimento despreocupado e movimento.
Mangas exageradas, volumes dramáticos e texturas variadas não poderiam faltar. Um ponto-chave da coleção são as estampas. Padronagens abstratas de tonalidades enérgicas dividem espaço com listras, animal print e xadrez.
Modem
“O que representa o tempo?” foi o questionamento que a Modem levou para a edição de 25 anos do São Paulo Fashion Week. Com foco no resgate do próprio âmago, por meio de uma repaginação do acervo, a label investiu em uma alfaiataria desconstruída em uma paleta sóbria.
O estilista André Boffano, diretor criativo da Modem, escolheu mergulhar nos arquivos de cinco anos da marca, em um vídeo conceitual que reflete sobre fases da vida por meio de depoimentos das modelos convidadas. No total, 15 visuais foram revelados. A pegada industrial marcou presença. Gola alta, luvas e assimetria deram a pitada final.
“A gente fala muito de propósito, de por que ter uma marca de moda hoje em dia. Para mim, a pandemia foi essencial para focar na essência de propósito da Modem”, afirmou André Boffano na live oficial do evento. “São desafios muito diferentes [do presencial para o digital], porque na passarela a gente já tem o entendimento de como cativar o público presente. Mas no vídeo a gente tem que fazer com que o telespectador não feche a tela”, completou.
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ÃO
Anteriormente, a ÃO havia participado da semana de moda paulista por meio do Projeto Estufa, uma espécie de laboratório de novos talentos. Para a primeira vez no calendário oficial, a marca comandada por Marina Dalgalarrondo seguiu a linha já conhecida de que o bizarro pode ser interessante.
A primavera/verão 2021 foi apresentada por meio de um filme dirigido por Vitoria de Mello Franco. Batizado de Serão, o conteúdo foi definido pela grife como “um delírio despertado pela face criativa do medo”.
O curta-metragem se passa na escuridão da floresta, retratando o desconhecido. No local sombrio, equipamentos de ginástica surgem em meio à natureza. “Os reflexos do instinto e o funcionamento mecânico dos aparatos se unificam e formam um todo que contempla o prazer e o terror. Na seriedade, está um tipo extraordinário de alegria”, explicou a ÃO, em nota.
A coleção é a representação da variedade. Os universos do sportwear, da alfaiataria e da moulage (técnica de tridimensionalidade) se misturam com maestria. Desenvolvidas pela Gansho, as padronagens são extremamente inusitadas.
“As estampas surgiram a partir de Quimeras (Combinação incongruente de elementos diversos) e são composições entre partes do corpo (pés, orelhas e mamilos), ecossistemas (florestas inteiras à microrganismos) e objetos ordinários em materiais variados (plásticos, metais e borrachas)”, esclareceu a etiqueta.
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O São Paulo Fashion Week 25 Anos será encerrado neste domingo (8/11). O lineup do último dia traz nomes como Gloria Coelho, Apartamento 03, Aluf, Angela Brito, Neriage e Isaac Silva. A marca homônima do estilista Ronaldo Fraga finalizará a programação.
Colaboraram Rebeca Ligabue e Hebert Madeira