Conheça Rita Carreira, modelo gorda e negra que arrasou no SPFW
Uma das estrelas da 48ª edição da semana de moda paulista conversou com a coluna sobre representatividade e quebra de padrões
atualizado
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Durante muito tempo a moda foi um espaço elitizado, excludente e propagador de preconceitos. Felizmente, ao que tudo indica, isso vem mudando, depois de muita luta das minorias e pedidos do público em geral. Prova disso é que a 48ª edição do São Paulo Fashion Week (SPFW), encerrada na última sexta-feira (18/10/2019), ficou marcada pela inclusão e diversidade, além do engajamento social. Uma das estrelas do evento foi Rita Carreira, modelo negra e gorda. Em entrevista à coluna, ela falou sobre dificuldades na carreira, representatividade e quebra de padrões de beleza.
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No SPFW N48, Rita Carreira desfilou para três marcas. Estava no casting de Isaac Silva, uma das estreantes; Cavalera, que também incluiu uma manifestação em prol do respeito trans; e Handred, label que fechou a programação.
“É minha segunda vez no São Paulo Fashion Week. Na primeira, desfilei para a marca do Emicida, a Laboratório Fantasma, mas foi uma apresentação voltada para a representatividade. Agora, está sendo ainda mais especial, porque são três etiquetas completamente diferentes uma das outra”, comemora a modelo.
A paulista acredita que, apesar de ainda haver barreiras a serem quebradas, as mudanças já são significativas.
“O meu objetivo é trazer representatividade para o meu segmento. Busco estar em lugares em que as pessoas dificilmente veriam uma modelo gorda. A moda precisa entender, de fato, que nós existimos, tornar normal”
Rita Carreira
Rita iniciou a carreira de modelo há 10 anos, ao acompanhar a irmã na produção de uma semana de moda plus size. “Era um evento que vinha totalmente na contramão do São Paulo Fashion Week. A diretora me viu e falou que eu poderia ser modelo, só que respondi: ‘Gente, essa mulher está louca! Como assim?’”, lembra.
Mesmo sem acreditar no próprio potencial, refletiu sobre o assunto e quis tentar. Na segunda edição do mesmo evento, passou no casting e já participou. No entanto, a caminhada foi árdua.
“As coisas sempre foram mais difíceis. Quando comecei, não estourei de uma vez. Vim caminhando bem aos poucos”, destaca.
Foi há cerca de quatro anos que Rita decidiu investir de verdade no meio fashion. Largou o emprego como vendedora em uma loja para focar no que realmente queria.
Hoje, aos 26 anos, é agenciada pela Ford Models. Para ela, além do SPFW, um dos trabalhos mais marcantes que já fez foi para a Vogue Brasil. Na september issue deste ano da publicação, Rita participou de um editorial.
Mesmo com todas as vitórias, Rita não deixa de analisar a realidade, que carrega muita discriminação, para buscar mais avanços. Ela enfatiza os grandes empecilhos para as mulheres, principalmente as que fazem parte de grupos mais vulneráveis.
“As marcas e as pessoas eram, e ainda são, muito racistas, principalmente no meu nicho. Vejo que existe uma certa dificuldade em trabalhar com modelos negras. Acho que fica muito na cabeça: você é gorda e ainda é negra, já é muita coisa ao mesmo tempo”, lamenta.
No passado, a modelo enfrentou dificuldades até dentro de casa. “Por mais que muita gente valorize o meu trabalho, o reconhecimento principal é ver minha família, principalmente o meu pai, que sempre teve uma resistência em aceitar minha profissão, comemorando minhas conquistas”, conta Rita.
À coluna, Rita explicou que o termo “plus size” é mercadológico e pode ser usado para se referir a marcas e modelos. Contudo, para ela, a palavra “gorda” ainda precisa ser desmistificada.
“As pessoas precisam entender que é uma característica física, não é algo pejorativo. Tem muito isso de acharem que gorda é um xingamento. Precisamos normalizar a palavra e entender o que ela é”, opina.
É fato que padrões irreais de beleza vêm sendo quebrados. Mas a profissional considera que ainda falta muito para que as mulheres deixem de ser reféns dos estereótipos. Nesse sentido, o movimento Body Positive é essencial para incentivá-las a amarem seus corpos como eles são.
A modelo também destaca que é preciso discernir pressão estética de gordofobia.
“Todas as mulheres, sejam gordas ou magras, sofrem com a pressão estética da sociedade. A gordofobia é diferente”, destaca. “Por exemplo, se eu for ao médico, consigo fazer um exame, mas uma amiga minha que veste 60 não consegue, porque os equipamentos não suportam uma pessoa desse tamanho”, continua Rita. “A gordofobia vem dessa raiz, de não conseguir passar na catraca de um ônibus. Esse tipo de situação eu não passo”, observa.
Atualmente, Rita também toca um workshop junto à irmã, Carol Santos. Com 11 edições no total, o Stand Out foi criado para a conscientização sobre o Body Positive e é aberto a qualquer pessoa. A iniciativa também atua na profissionalização de mulheres, como modelos e influenciadoras plus size.
Colaboraram Rebeca Ligabue e Hebert Madeira