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Centenário da Semana de 1922 reforça a necessidade da moda brasileira

Marco para a cultura brasileira, o evento se propôs a romper com os padrões estéticos e estilísticos antigos e abrir para a modernidade

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Água de Coco/Divulgação
Modelo loura com vestido amplo cuja estampa é um quadro da pintora Tarsila do Amaral
1 de 1 Modelo loura com vestido amplo cuja estampa é um quadro da pintora Tarsila do Amaral - Foto: Água de Coco/Divulgação

A Semana de Arte Moderna de 1922 completa 100 anos neste mês de fevereiro. O evento foi um marco na história brasileira e dividiu a cultura em “antes” e “depois”, afetando, principalmente, as artes plásticas e a literatura. Apesar de a indústria fashion beber frequentemente dessas áreas, segundo especialistas, os artistas responsáveis pela data não respondem pelo estabelecimento de uma moda genuinamente nacional.

Vem entender!

Giphy/Água de Coco/Divulgação

O Centenário da Independência do Brasil foi o gatilho para que um grupo de intelectuais organizasse, entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, um festival que incluía cerca de 100 obras. “Os artistas buscavam uma arte que também fosse independente e dialogasse com as especificidades do país, assim como uma linguagem literária que falasse português brasileiro”, conta Gisele Eberspächer. 

A jornalista, professora e mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) assina o texto que abre a 126ª edição do jornal literário Cândido, editado pela Biblioteca Pública do Paraná. A primeira edição de 2022 traz reflexões sobre o Centenário da Semana de Arte Moderna. “O impacto do evento na literatura e na arte brasileiras é inegável — tanto que é recebida com entusiasmo pelas editoras, pelos museus e por outros espaços culturais”, aponta a especialista.

A moda, portanto, não poderia deixar de ser impactada por esse aniversário. Desde o ano passado, marcas, como a Melissa, de acessórios, e Água de Coco, de beachwear, lançaram coleções em homenagem à Tarsila do Amaral. A dicotomia, porém, é que os artistas da Semana não mostraram preocupação em redefinir as influências do guarda-roupa brasileiro.

Brunno Almeida Maia, pesquisador e curador de moda, explica que, para entender a influência da Semana nas vestimentas, é preciso investigar os movimentos que inspiraram artistas como Anita Malfatti e Oswald de Andrade. “O Fauvismo, o surrealismo e o futurismo, que foram as referências dos intelectuais brasileiros, propuseram temas ligados à moda e à roupa.”

Por outro lado, em apuração para reportagem especial da Folha de S.Paulo, o jornalista Pedro Diniz reforçou a ideia de que a Semana de 22 não trouxe “brasilidade” para a moda do país. “O modernismo brasileiro reafirmou o gosto das elites pelo estilo internacional e uma herança de moda colonial que até hoje repercute na idealização do Brasil sobre o ‘ser chique’”, escreveu.

Convite da Semana de Arte de 1922
Convite que anunciava o último dia da Semana de Arte Moderna

 

A pintora Tarsila do Amaral com vestido xadrez e um de seus quadros ao fundo
Tarsila do Amaral também apostava em uma moda de influência europeia. Era constantemente vista com criações do francês Paul Poiret

 

Quadro de Anita Malfatti exposto no MASP
Em A Estudante, obra de Anita Malfatti, é possível perceber detalhes das vestimentas comuns à época: peças de alfaiataria

 

São Paulo como centro

Estudiosos das artes e da história colocam como hipótese para a falta de abrangência da Semana o fato de ela ter sido “financiada por políticos e figuras da elite financeira paulista, principalmente a oligarquia cafeeira”, como explicou Gisele Eberspächer. Luís Augusto Fischer, professor de literatura na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), escreveu, em coluna na Folha de S.Paulo, que o evento propagou a falsa ideia de que o movimento paulista foi o berço da modernidade no Brasil.

Essa reflexão pode ser trazida para a moda. Ao passo que estamos caminhando para a consolidação de uma moda genuinamente brasileira, marcas que importam as tendências internacionais e reproduzem em ritmo recorde saem à frente das etiquetas que apostam no design autoral e nas técnicas manuais e artesanais para a produção. 

A baiana Adriana Meira é um dos nomes que nada contra a corrente. Apesar de ter morado na capital paulista entre os anos 2010 e 2014, quando trabalhou em outras marcas de moda, manteve o estilo dos apliques manuais e reforçou a importância da história dos tecidos. À coluna a estilista afirma que o leque de etiquetas fora do eixo São Paulo – Rio de Janeiro “tornou-se bastante amplo, seja por um anseio de novidade do consumidor consciente ou pela construção de anos falando sobre a valorização da arte, ancestralidade, moda e artesanato brasileiro”.

Segundo a própria estilista, a estética da Adriana Meira foi definida na base da experimentação. A marca registrada da etiqueta homônima é o uso de recorte e aplicações que formam desenhos inspirados na história de cada cliente ou dos estudos da baiana sobre a sua ancestralidade. Já a confecção das peças segue regional e é dividida entre a cidade de Adriana, Brumado, na Bahia, e Sumé, na Paraíba. 

Modelo loura com roupa da marca Água de Coco em homenagem a Tarsila do Amaral
A estampa Floresta, da Água de Coco, reuniu elementos da fauna e flora das obras de Tarsila do Amaral

 

Modelo negra com roupa da marca Água de Coco em homenagem a Tarsila do Amaral
Em outras peças, a marca reproduziu as obras de forma fiel

 

Estilista Adriana Meira com roupa própria com estampa de Iemanjá
A estilista Adriana Meira com criação própria, um vestido que faz homenagem à Iemanjá, rainha das águas

 

Jaqueta jeans da Adriana Meira com estampa de Cosme e Damião
Apesar de exportar para países, como Estados Unidos, a marca continua com a produção local e em pequena escala. Na foto, a estilista referencia Cosme e Damião

 

Celebração do centenário

O aniversário da Semana de 22 está estimulando o lançamento e o relançamento de diversos livros sobre o tema ou dos pensadores que participaram, como uma reedição de Macunaíma, de Mario de Andrade. Vale destacar o título O Guarda-Roupa Modernista, de Carolina Casarin, que destrincha a relação do casal Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade com a moda.

A marca brasiliense Dobe apresenta uma coleção-cápsula que referencia o trabalho de Di Cavalcanti. Segundo a etiqueta, o artista plástico “contribuiu significativamente para distinguir a arte brasileira de outros movimentos artísticos de sua época, através de suas reconhecidas cores vibrantes, formas sinuosas e temas tipicamente brasileiros”.

Capa do livro Macunaíma, de Mário de Andrade, pela editora Antofágica
A reedição de Macunaíma da editora Antofágica vem com uma capa cheia de brasilidade, graças às ilustrações de Camille Sproesser

 

Camiseta branca da marca DOBE com ilustração do convite de divulgação da Semana de Arte Moderna
Uma das estampas da coleção da Dobe traz o convite desenhado por Di Cavalcanti para a Semana de Arte Moderna de 1922

 

Manequim preto vestindo lenço da marca DOBE com estampa do quadro do artista Di Calvanti
Outro item da coleção inspirada em Di Cavalcanti é um lenço que reproduz a tapeçaria “Músicos”, presente no Palácio da Alvorada, em Brasília

 

O centenário da Semana de Arte Moderna e o bicentenário da Independência do Brasil são ótimas oportunidades para gerar discussões e reflexões sobre a história do nosso país e da nossa cultura, em especial no que tange a moda. Os dois eventos históricos são essenciais para entender a construção da identidade brasileira.

Para outras dicas e novidades sobre o mundo da moda, siga @colunailcamariaestevao no Instagram. Até a próxima!

Colaborou Carina Benedetti

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