Ana Luisa Fernandes, da Aluf, fala sobre as inspirações da marca
A estilista apresentou sua coleção mais recente no São Paulo Fashion Week N47, e deu entrevista à coluna durante passagem por Brasília
atualizado
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A estilista Ana Luisa Fernandes, paraense radicada no Rio de Janeiro, usa a moda como plataforma para abordar a sustentabilidade e a arterapia. Esses são os dois pilares que inspiram a Aluf, marca criada pela designer em 2017. A etiqueta estreou no São Paulo Fashion Week N46 pelo Projeto Estufa, iniciativa que lança talentos para trazer novas perspectivas para a moda.
A designer esteve em Brasília para a terceira edição do Q.U.A.D.R.A. Design, evento promovido pela multimarcas Q.U.A.D.R.A no dia 30 de abril de 2019. Para a ocasião, que reuniu moda, design, arte e gastronomia, ela trouxe a coleção apresentada no SPFWN46. No evento, conversou com a coluna sobre as inspirações da marca, a experiência no mercado e a semana de moda paulistana.
Vem comigo!
Quando a Aluf surgiu, Ana Luisa buscava justificar o “fazer de moda” para o trabalho de conclusão do curso de design de moda. A orientação criativa surgiu por meio da arteterapia, metodologia terapêutica que une psicologia e arte. Mas, além da abordagem artística, como seria possível produzir sem gerar lixo? A resposta para essa questão, que também a preocupava, veio da sustentabilidade.
Assim nasceu a marca, em 2017, batizada com uma mistura do próprio nome da estilista: Ana Luisa Fernandes. Para ela, o projeto é construído a cada dia. “O mais importante foi ter colocado na minha cabeça que eu ia fazer aquilo, independentemente de estar pronto ou não. Você fica pronto com o tempo. O que diz se você é uma marca ou não é muito relativo”, comenta.
Para a venda na Q.U.A.D.R.A., que acontecerá até o dia 21 de maio de 2019, a marca traz a coleção Cartas para Nise, inspirada na psiquiatra brasileira Nise da Silveira (1905-1999). A médica alagoana foi a pioneira da arteterapia no país e teve reconhecimento internacional. A coluna também conferiu o trabalho mais recente da label, apresentado no SPFWN47.
Hoje, a etiqueta tem um ponto de vendas com um pequeno estoque em São Paulo, onde a marca foi criada. Nesse espaço, a label atende às clientes diretamente. “Todos esses pequenos degraus vão ditando a evolução da marca”, acrescenta. Para a estilista, o futuro da moda está nos materiais inovadores.
Confira esse e outros detalhes na entrevista:
Você vai vender na Q.U.A.D.R.A. a partir de agora? É sua primeira experiência com a clientela de Brasília?
É uma venda que estamos fazendo até o dia 21 de maio. Vamos ver como vai decorrer. Uma parte da coleção foi apresentada no São Paulo Fashion Week e outra, mais comercial, foi apresentada no Veste Rio, em showroom. Já havia consumidoras em Brasília, on-line, mas [eu] nunca tinha participado de um evento [aqui]. Todo mundo está sendo muito receptivo, acham muito diferente todo o design. Espero que consigam absorver todo esse diferencial.
Sua estreia no São Paulo Fashion Week foi na edição N46. O que achou da experiência?
Até hoje estou tentando entender a dimensão disso tudo. Com certeza foi algo muito benéfico, que ajudou no crescimento da marca, nos motivando a fazer nosso melhor, pelo tamanho da plataforma do SPFW.
Como é o retorno do público?
Excelente, tanto em redes sociais como de clientes procurando. Até mesmo em mercado, em showroom, quando você fala que fez SPFW, já dá uma credibilidade.
O que Aluf traz para a moda? Como ela se encaixa no Projeto Estufa?
Dentro da curadoria do Projeto Estufa, somos a marca que fala sobre sustentabilidade mais firmemente. A Aluf tem isso como embasamento, nasce da sustentabilidade e da arteterapia. Mas tem outras marcas incríveis que abordam o questionamento de uma estética, barreiras, outros detalhes.
Planeja fazer algum desfile fora do Projeto Estufa? Como funciona?
Fechamos três edições. Fizemos a retrasada, a passada e tem mais uma para efetivarmos a trajetória dentro do projeto. Depois, veremos qual caminho iremos traçar. Se vamos fazer [um desfile] dentro, mas em outro lugar, ou no próprio espaço do SPFW.
Qual é a coleção que você trouxe para a Q.U.A.D.R.A.?
Foi a coleção que desfilamos no fim do ano passado, Cartas para Nise. Fala sobre essa busca de momentos simples e leves de felicidade. Por isso, traz um pouco do dourado, brincos de porcelana, uma camisa que tem um círculo dourado, remetendo a um raio de sol que toca e aquece a nossa pele. A questão desse momento simples e leve de felicidade vem de um dos pilares da arteterapia. Um dos porquês da arte é trazer essa esperança. Essa coleção ocorreu em um momento no qual esperança era o que o cenário político do Brasil mais precisava.
Como são os shapes?
Trabalhamos sempre com tecidos reciclados ou biodegradáveis. Por mais que mude o tema da coleção, isso é algo da marca. Temos tecidos mais leves, como a poliamida, que é biodegradável e certificada. No shape, trouxemos uma inspiração dentro dos pacientes da Nise da Silveira, que estavam no hospital psiquiátrico, nessa calça mais workwear, com a barra dobrada. Trazemos essa silhueta de cintura bem marcada, mas com volume na parte de baixo, como se fosse uma calça baggy. A barra é dobrada para secar um pouco esse volume.
O SPFW vem sofrendo algumas críticas em torno da relevância dele nos dias atuais. Qual é a sua opinião sobre isso?
Independentemente do que já ocorreu no SPFW, todo mundo está dando o melhor de si, mudando e aprendendo a cada temporada. Por mais que as pessoas errem, não existe um erro cego. É um erro que você entende e está trabalhando em cima daquilo. É a plataforma mais relevante da América Latina. Negá-la seria quase como uma imprudência. O evento vem tentando fazer isso. Só pela seleção de novas marcas, você entende esse reposicionamento. Você não vê mais grifes tratando modelos como se fossem só cabides. Esse último SPFW foi recorde de modelos não-brancas desfilando. Essa mudança está sendo efetiva.
O que você traz de inspiração para a nova coleção, apresentada no N47?
Nos inspiramos em como todos nós somos reflexos um do outro. Entender que, sim, pensamos de formas diferentes, mas todos nós somos parte de um único organismo vivo. Quando falamos de autocuidado, autorrespeito, automaticamente estamos falando sobre tentar entender o lado do outro. Essa coleção fala sobre o quanto eu me vejo em você, você se vê em mim, e o quanto podemos nos conhecer por meio do outro. Fala sobre esse diálogo, esse fluido que deve ser a nossa existência.
Tivemos um estudo muito grande dentro da cerâmica e agora estamos iniciando um estudo no vidro. Trouxemos essa transparência para as roupas, de você estar aberto para o outro. E não como uma vulnerabilidade, porque para se abrir para o outro, você precisa estar muito forte, mas como uma disponibilidade de ouvir o outro.
Quais materiais você escolheu, além do vidro?
Trouxemos nossa primeira estampa, água e vidro refletidos com luz. É como se fosse a nossa coleção passada, na qual falamos sobre luz, refletindo na atual, sobre vidro e água. Juntamos essas duas histórias e trouxemos esse movimento, que fala do líquido, do espelho, desse reflexo.
Além do vestuário, o que a Aluf oferece?
Fazemos bolsas, sapatos, brincos e vestuário no geral. Acredito muito no objeto vestível, em uma imagem de corpo como um todo. Não faz muito sentido me limitar só com blusas e calças e afins. Toda a linguagem do corpo, tudo que dá para aglutinar nessa imagem, é algo que eu sempre penso criativamente.
Algumas peças da nova coleção são bem conceituais. Você irá comercializá-las?
Sim. Essa do vidro é somente sob encomenda, mas se alguém quiser, estaremos disponíveis para fazê-la. Além disso, tem peças que não foram expostas no desfile. Todas as do desfile estarão à venda, mas tem uma grade muito maior do que o mostrado lá.
Enquanto designer, quais são suas referências e inspirações?
Aqui no Brasil, acredito muito no trabalho do João Pimenta. Ele, há muitos anos, traz essa inovação de material. Internacionalmente, gosto muito da Iris Van Herpen, que trabalha na impressão 3D. Acredito que o futuro da moda seja esse. Tentamos trazer materiais de acordo com a sustentabilidade.
Veja as peças na galeria:
Colaborou Hebert Madeira