O erro de cálculo do candidato Dallagnol
Declaração de Deltan sobre o “erro de cálculo do PowerPoint” contra Lula continha um cálculo. Político, naturalmente
atualizado
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Deltan Dallagnol declarou que houve um “erro de cálculo” na famosa divulgação da investigação sobre Lula por meio de uma apresentação de PowerPoint. Essa foi a manifestação de maior repercussão do ex-procurador da Operação Lava Jato desde que anunciou finalmente a sua entrada na política.
Finalmente porque ele já estava fazendo política há muito tempo na pele de procurador. Não que haja algum mal intrínseco nisso. Existe política em quase tudo – e especialmente na vida profissional dos que tentam cumprir a lei num país com tantas licenças poéticas judiciárias e tantas gambiarras processuais. Alguns acham que nos últimos anos Deltan estava mais com sotaque de político do que de procurador. Mas isso é subjetivo. Objetivo é o que ele fez agora com sua declaração sobre o polêmico PowerPoint.
Não se deve descartar a hipótese de o jovem Dallagnol ser um distraído – ainda que a política não seja um lugar muito acolhedor para distraídos. Nesse caso, ele estaria se referindo apenas a um formato de comunicação – o gráfico do crime com Lula ao centro – e dizendo que hoje não daria aquelas informações daquele jeito. Tudo ok. Um bom rapaz aberto à revisão das suas formas de ação.
Se Deltan não for tão distraído assim, certamente tem consciência de que qualquer autocrítica sua no trabalho de investigação contra Lula (na forma, no conteúdo, na embalagem ou no que quer que fosse) seria alimento para os que defendem a inocência de Lula – com críticas justamente aos métodos da Lava Jato. Até explicar que focinho de porco não é tomada e que ele se arrepende do PowerPoint, mas não da forma como investigou, etc., etc., são duas voltas ao mundo num divã voador falando para ninguém.
Resumindo: se não é um distraído, Deltan sabia que daria um festival de manchetes sobre o “erro de cálculo do PowerPoint” – e que isso seria música para os ouvidos dos apoiadores de Lula. E se sabia dessa consequência inevitável, sua declaração sobre o erro de cálculo continha um cálculo. Político, naturalmente.
Quando o ex-procurador Rodrigo Janot usou a fama da Lava Jato para conduzir o Caso Joesley – a partir de uma delação que era imprestável e acabou suspensa – Dallagnol embarcou na canoa furada. O que se viu ali foi uma campanha histriônica de Janot fermentada por boa parte da imprensa surfando no Fora Temer a partir de uma investigação bastarda. Se Temer tinha culpa, esse cerco de fanfarra serviu para inocentá-lo – tanto que resistiu intacto a um ano e meio de bombardeio.
Mas era uma campanha com muita mídia e apoio de celebridades “progressistas” – as quais Dallagnol andou visitando nessa época, sempre cheio de elogios a Janot e ao ministro Luís Roberto Barroso, que prorrogava sucessivamente a investigação contra o então presidente (só até ele deixar o palácio, claro). Deltan ficou bastante à vontade circulando no Leblon como justiceiro do bem e nunca mais foi visto atacando de frente aquele PT que protagonizava o seu PowerPoint.
O STF descondenou Lula – aquele que o procurador da Lava Jato colocou no centro da organização criminosa – e não se vê um repúdio ostensivo a esse ato no centro da mensagem política de Deltan. Parece que o cálculo é outro.