Suspeito de atentado ao Porta dos Fundos declara voto em Bolsonaro
Em entrevista à coluna, Eduardo Fauzi, solto após dois anos, recuou de confissão feita sobre o ataque de 2019
atualizado
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O economista Eduardo Fauzi, suspeito de participar de um ataque terrorista contra a produtora Porta dos Fundos em 2019, declarou voto em Jair Bolsonaro dias depois de deixar o presídio de Bangu 8, no Rio de Janeiro. Em entrevista à coluna após dois anos preso na Rússia e no Brasil, Fauzi alegou ter admitido a autoria do atentado em 2019 apenas por estratégia de defesa, e insinuou que participaria de um novo ataque no futuro.
Fauzi tentou banalizar o atentado, alegando que ataques criminosos como o de 2019 fariam parte da democracia, o que não é verdade. Pelo crime, Fauzi já foi investigado por tentativa de homicídio, terrorismo e incêndio. O caso segue sem conclusão, três anos depois.
“Bolsonaro é o melhor que temos. Poderia ser muito melhor, mas nada é perfeito, né?”, disse Fauzi. Questionado se mudaria seu comportamento em relação a 2019, avisou: “Qualquer coisa que eu era capaz de fazer, agora faço melhor”.
A sede do Porta dos Fundos, no Rio de Janeiro, foi atacada na véspera de Natal de 2019. A produtora havia lançado um filme de humor que mostrava um Jesus homossexual. Cinco dias depois, Fauzi viajou a Moscou, poucas horas antes de sua prisão ser decretada pela Justiça.
Fauzi também disse que se sentiu em casa na prisão de Bangu 8, onde, segundo ele, ficou na cela que era ocupada pelo ex-governador Sergio Cabral. “Ele até escreveu na parede: ‘Cabral esteve aqui”, disse.
Leia os principais trechos da entrevista.
Em entrevistas em 2020, você assumiu a autoria do ataque. Depois, recuou. Hoje você assume?
Eu nunca estive lá. Tenho 2 metros de altura e a polícia conhece meus dados biométricos, tenho diversas passagens pela polícia. As pessoas que arremessaram os coquetéis Molotov têm cerca de 1,70m. A gente sabia disso desde o início. Se eu assumi posições dúbias, foi parte da nossa estratégia para despistar a polícia e o Ministério Público Federal, sabendo das covardias processuais que estavam cometendo. E a estratégia se provou vitoriosa.
Você também já disse que conhecia as pessoas que arremessaram os explosivos.
Desde o início, o objetivo do Ministério Público Federal e da Polícia Civil era me forçar a fazer uma delação premiada, enquanto eu estava preso na Rússia. Se eu entregasse as pessoas, receberia uma pena pequena, por uma participação colateral. Nem que eu soubesse quem são as pessoas eu faria isso. Fiquei preso mas mantive a minha honra. Não me corrompo nem pela minha liberdade, o que dirá para prejudicar outras pessoas.
Como foi a prisão na Rússia?
Quando minha investigação passou de tentativa de homicídio para terrorismo, fui mandado para um presídio na Sibéria, uma fortaleza do século XVII. As pessoas são mandadas para lá para morrer. As condições eram terríveis. Comparada com a Rússia, a prisão no Brasil é moleza. Posso dizer isso porque já estive preso mais de uma vez no Brasil. Na Sibéria é preso matando preso, preso matando polícia, polícia matando preso e até polícia matando polícia no ambiente carcerário. Não tem água líquida porque é muito frio. Metade dos presos são soropositivos.
E a prisão em Bangu 8, no Rio de Janeiro?
Sou conhecido no Rio de Janeiro, tenho uma rede de apoiadores, inclusive políticos e policiais. A influência dessas pessoas ultrapassa as paredes do Complexo de Bangu.
Que políticos?
Alguns, que preferem se manter no anonimato. Dentro da legalidade, minha chegada lá foi preparada. Eu tenho curso superior, é um presídio diferenciado. Lá tem políticos, engenheiros, médicos, policiais, contraventores. Quando eu saí, todo mundo lá comemorou, o presídio balançou.
Encontrou presos conhecidos?
Vários. Fui colocado na cela do Cabral [Sergio Cabral, ex-governador do Rio de Janeiro], ele tinha saído um pouco antes de eu chegar. Acho que era a melhor cela do complexo. Ele até escreveu na parede: “Cabral esteve aqui”. Fiz um protesto bem-humorado do lado do nome dele. Encontrei lá também o contraventor Rogério de Andrade; policiais que foram acusados de matar a juíza Patrícia Acioli; políticos da Baixada Fluminense; o anestesista acusado de estupro [Giovanni Quintella Bezerra]; um pessoal remanescente da Lava Jato; o cirugião plástico Bolívar [Bolívar Guerrero Silva]. As celas da galeria ficavam abertas, a gente transitava durante o dia. As celas só eram fechadas de noite.
Mantém o voto em Jair Bolsonaro, dado em 2018?
Sim. Bolsonaro não é o melhor que poderíamos ter, mas é o melhor que temos. Um candidato a presidente no Ocidente levantar a bandeira de Deus, pátria e família já é um marco civilizatório. Só por isso já mereceria meu voto. Dou todo o meu apoio a Bolsonaro e a Daniel Silveira [candidato ao Senado condenado pelo STF]. Bolsonaro poderia ser muito melhor, mas nada é perfeito, né? Eu também poderia ser melhor do que eu sou.
Qual é sua situação jurídica hoje?
Hoje eu respondo pelo crime de incêndio. Primeiro, a polícia entendeu que eu havia cometido o crime de tentativa de homicídio. Achou que as pessoas que arremessaram os coquetéis Molotov em direção à porta do estúdio na verdade queriam matar o vigia que estava descansando dentro do imóvel. Uma tese completamente absurda. Depois, o Ministério Público entendeu que o crime seria de terrorismo. Ficou muito pior, porque é um crime terrivelmente punido pela lei brasileira, tem pena de 15 a 30 anos de prisão. A tese também caiu. Hoje respondo pelo crime de incêndio, relativamente leve. Se for condenado, já terei cumprido a pena, na verdade. Fiquei preso por mais de dois anos em regime fechado, em prisão temporária e preventiva. Mesmo assim, a denúncia é equivocada, os bombeiros não atestaram que houve incêndio. O crime seria melhor descrito como dano qualificado por uso de substância explosiva, que não dá nem cadeia.
Teme ser preso de novo?
Claro. Bastante. Alguns integrantes do Ministério Público e da Polícia rasgam o processo penal, plantam, forjam, fraudam. Tenho receio de uma covardia jurídica. No Brasil a polícia ganha mal. Quem tem dinheiro pode comprar a prisão de um adversário.
O que planeja para o futuro?
Tenho três filhos e minha noiva. Vou acabar de pagar meus advogados e tirar um ano de férias. Depois, com o dinheiro que sobrar, eu compro um carro e viro motorista de aplicativo ou qualquer coisa desse tipo. No Rio de Janeiro ou em qualquer lugar do Brasil.
Sua defesa também foi paga por pessoas que não quiseram se identificar.
Dezenas de pessoas me ajudaram financeiramente e pediram para permanecer anônimas. E têm razão para ter medo. Uma pessoa me ofereceu muito dinheiro, mas quis dar algum tipo de sugestão sobre o que eu deveria falar, como deveria me comportar, e recusei. Muita gente ajudou, mas paguei advogado no Brasil e na Rússia, onde a conta era em euro. Me quebrou.
Se no próximo Natal houver outro filme com o mesmo tema, você defenderia aquela atitude de 2019?
O filme foi cruel, desrespeitoso. O ato de violência política cometido em 2019 foi claramente justificado, de perfeito conteúdo político. Quando a Justiça falha, é inevitável que as pessoas se revoltem. Isso faz parte do jogo democrático. Se houvesse um tipo de escárnio profundo novamente e alguém novamente, sei lá quem, cometesse um ato de protesto político, muito provavelmente eu bateria palma. Evidentemente, se fosse cometido com toda a responsabilidade social da última vez: num horário sem ninguém na rua, com baixo potencial ofensivo de pirotecnia.