Senadores pró-Marinho receberam verba nos últimos dias de Bolsonaro
Ex-ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho intermediou negociação para beneficiar potenciais eleitores no Senado
atualizado
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Senadores que votaram em Rogério Marinho, ex-ministro do Desenvolvimento Regional de Jair Bolsonaro, conseguiram milhões de reais em verbas “extras” sob gestão dos ministérios do Executivo na última semana de 2022, segundo levantamento da coluna.
Nessa época, Marinho já era o candidato de Bolsonaro à presidência do Senado e buscava votos de seus colegas. Parlamentares ouvidos pela coluna relatam que Marinho ajudou a abrir portas no Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e em outras pastas para empenhar as verbas. (Confira os valores indicados por cada um no final desta reportagem.)
O senador afastado Jarbas Vasconcelos, do MDB de Pernambuco, por exemplo, emplacou R$ 15,6 milhões em indicações na última semana de 2022, dos quais R$ 15 milhões no Ministério do Desenvolvimento Regional.
O suplente de Jarbas Vasconcelos, Fernando Dueire, declarou voto em Marinho, contrariando a orientação de seu partido.
Procurado, o senador Eduardo Braga, líder do MDB, disse que o partido não teve acesso a quanto os senadores indicaram no final do ano e demonstrou surpresa com a indicação feita por Vasconcelos.
“Agora está explicado por que um voto que a gente tinha acertado desapareceu da minha mão. Não é fácil”, comentou.
Jarbas Vasconcelos e Dueire responderam, em nota, que os recursos foram voltados para projetos e ações de infraestrutura. “Vincular qualquer voto dado pelo senador Fernando – suplente de Jarbas que assumiu o cargo em 07 de dezembro de 2022 – a essa ou qualquer outra liberação de recursos, além de irresponsável, é desconhecer o histórico político e ético tanto dele quanto do senador licenciado Jarbas Vasconcelos”.
Caso parecido é o de Jorginho Mello, ex-senador agora eleito governador com o apoio de Bolsonaro e que conseguiu R$ 9,9 milhões. Sua suplente, Ivete da Silveira, também contrariou a indicação do MDB e declarou voto em Marinho. Foram R$ 9,1 milhões liberados pelo MDR e o resto na Saúde.
Como mostrou a coluna em janeiro, o governo Bolsonaro burlou o fim do orçamento secreto imposto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e direcionou as indicações das “emendas de relator” para investimento sob controle dos ministérios, no qual houve uma liberação de R$ 6 bilhões no fim do ano.
Dos R$ 6 bilhões empenhados, com pagamento autorizado pelo governo, foi possível identificar R$ 2 bilhões em locais e ações em que o atendimento foi demandado através do Sistema de Indicação Orçamentária (Sindorc). É o sistema montado para “formalizar” o orçamento secreto.
Dos R$ 414 milhões liberados a senadores, pelo menos R$ 123 milhões vieram do MDR, que, no ano passado, ainda estava sob influência de Marinho. O titular era Daniel de Oliveira Duarte Ferreira, braço direito do ex-ministro.
Os valores repassados a senadores podem ser maiores do que os apresentados acima, já que só foi possível identificar, neste levantamento, os pedidos que passaram pelo Sindorc.
Após a proibição do orçamento secreto pelo STF, em 19 de dezembro, o MDR enviou aos parlamentares um modelo de ofício para que os pedidos fossem apresentados como se fossem de prefeitos, contornando a decisão do Supremo, como mostrou a coluna em dezembro.
Lucas Barreto, do PSD do Amapá, que contrariou seu partido e declarou voto em Marinho, conseguiu indicar R$ 69,9 milhões. Quase todo esse dinheiro foi empenhado pelo Ministério da Defesa para atender municípios do Amapá dentro de uma ação de assistência social para infraestrutura, com vistas a remediar estragos feitos por enchentes, segundo ele.
Barreto diz que esses pedidos não têm relação com o MDR, foram feitos em conjunto com a bancada do Amapá e que, individualmente, só conseguiu por volta de R$ 8 milhões em liberações no ano passado. O senador diz que pediu voto em Rogério Marinho por “convicção”.
“Eu, como apoiei o Bolsonaro no segundo turno, decidi apoiar o Marinho por convicção. Declarei apoio ao Marinho por causa do posicionamento dos partidos que vão me apoiar também, tudo isso é uma composição”.
Esperidião Amin, do PP, eleitor de Marinho, conseguiu uma liberação de R$ 18,4 milhões para as localidades que havia indicado no Sindorc. Procurado, Amin não respondeu.
Zequinha Marinho, senador do Pará do PL, partido de Marinho, ganhou R$ 30 milhões em empenhos. Ele não declarou voto nas redes sociais. Marinho também não respondeu aos questionamentos da coluna.
Luis Carlos Heinze, senador do PP do Rio Grande do Sul, ganhou empenhos de R$ 3,9 milhões. Metade do MDR e a outra do Ministério da Saúde. “Todo e qualquer recurso empenhado, provenientes do Ministério do Desenvolvimento Regional, destinados ao Rio Grande do Sul, são fruto do trabalho de articulação, inerentes a atividade parlamentar e não possuem qualquer relação com a votação da presidência do Senado Federal”, declarou, em nota.
“Meu voto, declarado em Rogério Marinho, é coerente com minha trajetória política. Sou um parlamentar alinhado à direita, que não está satisfeito com a forma com que o senador Pacheco tem conduzido a Casa. São inúmeros os pedidos de impeachment e CPIs que foram engavetados. Por diversas vezes subi à tribuna para registrar a minha indignação. Desta forma, repúdio qualquer associação entre meu voto e a destinação de recursos para o meu estado.”
Uma exceção na lista de beneficiados é o próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que conseguiu R$ 56,8 milhões nas indicações que tinha feito, fatia a que teve direito pelo fato de ocupar o cargo, segundo fontes do Congresso.
Procurado, Rogério Marinho não comentou.
A verba a que se refere a reportagem consta no Orçamento como “RP 2”, o que significa que os ministros têm liberdade em decidir onde gastá-la.
Geralmente, são ações de investimento em saúde e infraestrutura. Após o fim das emendas de relator, a verba que era “RP 9” foi empenhada como “RP 2” pelo governo Jair Bolsonaro.