Prisões de São Paulo têm trabalho escravo, apontam peritos federais
Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, ligado ao Ministério dos Direitos Humanos, enviou relatório sobre prisões ao MP
atualizado
Compartilhar notícia
O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos, afirmou que prisões do estado de São Paulo submetem presos a trabalho escravo, entre outras graves violações de direitos humanos. O relatório foi enviado na segunda-feira (1º/10) ao Ministério Público, ao Tribunal de Justiça, ao Tribunal de Contas e ao governo de São Paulo.
Os peritos federais inspecionaram prisões paulistas em outubro do ano passado. Em duas delas, constataram trabalho escravo por parte dos detentos, entre outras ilegalidades.
A apenas 20 quilômetros da capital paulista, na penitenciária penitenciária Adriano Marrey, em Guarulhos (SP), a maior parte do trabalho não é remunerado ou usado para a remição da pena. Na cozinha, a jornada de trabalho dura 14 horas diárias, das 4h30 às 18h30. A remuneração, quando houve, foi de R$ 9 ao mês.
Em outro trecho do relatório, o órgão federal registrou que um preso morreu depois de esperar por uma semana para receber atendimento médico após uma fratura nas costelas.
Na penitenciária de Dracena (SP), a 650 quilômetros da capital, o MNPCT colheu “relatos generalizados e consistentes” de que o trabalho na cozinha é exaustivo e geralmente não remunerado ou contabilizado para a progressão penal. Os presos trabalham das 6h às 16h, mesmo doentes, e são obrigados a acordar às 3h da manhã.
Os internos deveriam ganhar um salário mínimo, mas recebem de fato apenas três quartos do valor. A justificativa do governo: o dinheiro vai para presos em outros trabalhos sem salário, a exemplo da limpeza da carceragem. Há relatos de pagamentos de R$ 7 mensais.
Além da cozinha, os presos trabalham em um local de criação de porcos ou no cuidado de idosos dentro da cadeia. A repressão desproporcional, ainda segundo o relatório do MNPCT, inclui golpes com canos de ferro pelos agentes penitenciários.
“Cenário trágico no sistema prisional de São Paulo, no qual se evidenciaram práticas de tortura sistemáticas, através de espancamentos, violência psicológica e uso desproporcional e inadequado de armamentos menos letais, além de outras formas de tratamento cruel e desumano, com uma população presa em situação de fome, incomunicabilidade, superlotação e total desassistência à saúde”, afirmou o MNPCT.
Procurado, o governo de São Paulo afirmou que os dados citados pelo MNPCT “não contemplam as reformas estruturais” nos presídios do estado, entregues até abril deste ano. “Os presídios dispõem de equipe básica de saúde, composta por médico, enfermeiro, dentista e auxiliar de enfermagem, em parceria com os municípios onde estão situados”, disse a Secretaria da Administração Penitenciária, acrescentando: “A secretaria disponibiliza canais para recebimento de denúncias, caso identificado eventual desvio”.
(Atualização às 15h58 de 4 de outubro de 2024: Em nota, a Secretaria de Administração Penitenciária do governo de São Paulo negou haver trabalho escravo nas cadeias do estado e rechaçou o relatório do MNPCT. “Os reeducandos, mediante autorização do Poder Judiciário e em consonância com a Lei de Execução Penal (LEP), trabalham com jornada mínima de seis horas e máxima de oito horas diárias”, afirmou, acrescentando: “De acordo com a LEP, a remuneração mínima percebida pelo reeducando equivale a 75% de um salário mínimo e sua atividade laboral não é regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)”.)