Juiz de SC censura Metrópoles e manda apagar reportagem sobre empresários bolsonaristas tratando de golpe
Decisão da 1ª Vara Cível de Brusque censurou Metrópoles e reportagem da coluna no âmbito de ação movida pelo empresário Luciano Hang
atualizado
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Uma decisão da 1ª Vara Cível da Comarca de Brusque tomada na semana passada censurou o Metrópoles e determinou a exclusão da reportagem da coluna que revelou, em agosto de 2022, mensagens trocadas por empresários bolsonaristas em um grupo de WhatsApp. Nelas, empresários defendiam um golpe de estado em caso de derrota de Jair Bolsonaro na eleição daquele ano e faziam ataques a diferentes instituições. A ordem foi a pedido do empresário Luciano Hang. O Metrópoles vai recorrer.
A decisão que censurou a reportagem foi assinada no último dia 5 de junho pelo juiz Gilberto Gomes de Oliveira Junior, no âmbito de um procedimento comum cível movido na Justiça de Santa Catarina por Hang contra o Metrópoles e este colunista. Hang estava entre os integrantes do grupo, onde fez ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e espalhou desinformação.
Além da remoção da reportagem do Metrópoles, Oliveira Junior determinou o pagamento de uma indenização de R$ 5 mil a Hang, por danos morais.
A reportagem mostrou que empresários apoiadores de Jair Bolsonaro passaram a defender abertamente um golpe de Estado caso Lula vencesse a eleição de outubro de 2022. A possibilidade de ruptura democrática foi o ponto máximo de uma escalada de radicalismo que era a tônica do grupo de WhatsApp Empresários & Política, criado em 2021, cujas trocas de mensagens foram acompanhadas pela coluna por meses.
A defesa explícita de um golpe, feita por alguns integrantes do grupo, somou-se a uma postura comum a quase todos: ataques sistemáticos ao STF, ao TSE e a todos que eram identificados por eles como obstáculos a Bolsonaro.
Ao analisar a ação proposta por Luciano Hang, o juiz catarinense entendeu que a reportagem atribuiu ao empresário “notícias falsas e caluniosas” e atribuiu a ele “um golpe de estado”. Na visão do magistrado, a reportagem não apresentou “quaisquer provas” da conduta antidemocrática de Hang.
O juiz escreveu que a liberdade de expressão “não se confunde com a possibilidade de externar agressões e praticar abuso do referido direito”. “Entendo, em verdade, que os comentários foram abusivos e totalmente deliberados”, decidiu.
Oliveira Junior considerou ainda que o “direito à honra” de Luciano Hang foi “lesado” pela reportagem e que houve “abuso de direito”. “Cumpre frisar que, embora a liberdade de opinião e de expressão seja protegida, o mesmo não acontece quando a informação não é verdadeira ou quando há excesso no emprego das palavras”, afirmou.
Histórico de decisões
O juiz Gilberto Gomes de Oliveira Júnior, da 1ª Vara Cível de Brusque, cidade onde está sediada a Havan, empresa de Luciano Hang, tem um histórico de decisões favoráveis ao empresário em ações movidas por Hang contra jornalistas.
Em dezembro de 2020, Oliveira Júnior condenou o jornal Folha de S.Paulo e a jornalista Patrícia Campos Mello a pagarem R$ 100 mil a Hang em razão de uma reportagem que o citou como suspeito de participar do disparo ilegal de mensagens, no WhatsApp, na eleição de 2018. Luciano Hang pedia R$ 2 milhões de indenização.
A Folha recorreu ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, e a apelação tramita atualmente, ainda sem decisão, na 5ª Câmara de Direito Civil do TJSC, sob relatoria do desembargador Ricardo Fontes.
Em maio de 2021, em outra decisão favorável a Luciano Hang, o juiz de Brusque ordenou que o Google republicasse uma entrevista do empresário à Jovem Pan, na qual ele defendeu o tratamento precoce contra a Covid-19. O conteúdo havia sido retirado do YouTube.
Em 27 de janeiro de 2023, no entanto, a decisão de Oliveira Júnior foi revogada por outro juiz da mesma comarca, Yuri Lorentz Violante Frade. O magistrado anotou em sua sentença que “o incentivo ao ‘tratamento precoce’ — e consequentemente desincentivo à vacinação, que, inclusive, atacaria a célula na fala da parte autora — é responsável, no excepcionalíssimo contexto da pandemia acima explicado, por contribuir com centenas de milhares de mortos”.
Hang recorreu ao TJSC, onde o caso corre atualmente na 1ª Câmara de Direito Civil, no gabinete do desembargador Raulino Jacó Bruning.
Uma outra decisão de Gilberto Gomes de Oliveira Júnior contra a imprensa e favorável a Luciano Hang ocorreu em agosto de 2021. Na ocasião, ele determinou que o UOL publicasse uma resposta do empresário na qual ele negou a existência de um relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), sob pena de R$ 10 mil por dia em caso de descumprimento. Segundo informou o portal, o relatório questionava a lisura do patrimônio de Hang.
O processo foi extinto pela juíza Jadna Pacheco dos Santos Pinter em junho de 2023, após um acordo entre as partes.