Governo Zema soube há dois meses de aliado flagrado cobrando propina
Ao anunciar a demissão de Bruno Ornelas, Romeu Zema se disse intolerante com corrupção, mas sabia do caso desde 3 de janeiro
atualizado
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Depois de a coluna revelar, nessa segunda-feira (11/3), mensagens em que o representante do governo de Minas Gerais em Brasília, Bruno Ornelas, aparece cobrando propina em troca de uma nomeação a um cargo no governo de Goiás, em 2022, o governador mineiro, Romeu Zema, afirmou em suas contas nas redes sociais que determinou a demissão de Ornelas, por supostamente ter “tolerância zero” com a corrupção.
“Determinei a imediata exoneração de um servidor investigado por suposto desvio de conduta, mesmo que o ocorrido não tenha sido no Governo de Minas. Na minha Gestão a tolerância é zero pra corrupção”, escreveu Zema.
A considerar a data em que o governo de Minas soube dos malfeitos de Ornelas, no entanto, a reação de Zema vem com um tanto de atraso.
A administração do governador sabe do caso desde o começo de janeiro, quando a coluna entrou em contato com o governo para ouvir seu posicionamento sobre o assunto. A solicitação foi enviada à assessoria de comunicação no começo da tarde do dia 3/1, uma quarta-feira.
Naquele dia, a coluna enviou quatro perguntas ao governo de Minas, respondidas por meio de uma nota, na qual afirmou que “todos os contratados pela pasta passam por processo seletivo. Assim ocorreu com o referido servidor [Bruno Ornelas] e somente ele pode responder por qualquer fato anterior à sua nomeação”.
Desde então, a coluna aprofundou a investigação e obteve mais detalhes do caso, revelado ontem.
Venda de nomeação
As mensagens entre um empresário de Brasília e Bruno Ornelas mostram um esquema de venda de cargos no Departamento Estadual de Trânsito de Goiás.
Nos diálogos por WhatsApp, de maio de 2022, Ornelas pede dinheiro para nomear um indicado do empresário para a gerência do Departamento de Tecnologia da Informação do órgão de trânsito. O preço do possível tráfico de influência: R$ 900 mil.
À época, o advogado era responsável pela coordenação política nacional do Podemos, partido ao qual, em março de 2022, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, entregou a administração do Detran em troca de apoio à reeleição. Na ocasião, Eduardo Machado, ex-presidente do PHS, partido incorporado pelo Podemos em 2019, assumiu a presidência da instituição.
Nos diálogos, Ornelas diz agir a pedido de Felipe Cortês, então colega de partido e candidato derrotado a deputado estadual em Goiás em 2022, ao pedir pagamentos ao empresário: “O Detran lá é nosso, mas o jogo é dele [Cortês]”, afirmou. Diversas mensagens mostram a pressão exercida pelo advogado: “Faz o Pix aí”; “Lindão, faz logo de 100”; “Manda mais 100k”; “Lindão, só trabalho com comprovante”; “Ou tem capim ou não tem”; “Irmão, 17 horas é o prazo final pra TED”; “Manda os 100 que garanto irmão”, entre outras (veja os prints).
Comprovantes aos quais a reportagem teve acesso mostram o depósito de R$ 150 mil à dupla do Podemos — sendo R$ 100 mil destinados à conta da esposa de Cortês, Fabiola Prado, que chegou a ser nomeada neste ano para um cargo de assessora especial no governo de Caiado, mas a nomeação foi anulada e ela não tomou posse. Outros R$ 50 mil foram destinados pelo empresário a uma conta indicada por Ornelas, em nome da empresa Hiperpay Serviço de Pagamentos Ltda.. Apesar dos pagamentos, a nomeação também não foi consumada.
Bruno Ornelas afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “desconhece qualquer negociação de cargo ou qualquer outra ação que tenha usado seu nome de forma indevida e criminosa” e que “não mantém nenhum vínculo com o Governo do Estado de Goiás, sendo, dessa forma, impossível qualquer ingerência sua sobre qualquer assunto ou processo de contratação”.
“A verdade é que não há nem nunca houve qualquer negociação referente ao assunto tratado”, informa outro trecho da nota. Confrontado com as mensagens, Ornelas não respondeu.
Felipe Cortês chegou a retornar o contato feito por telefone, mas depois ignorou as chamadas. Ele também não respondeu às perguntas enviadas pela reportagem.
O governo de Ronaldo Caiado segue calado. O espaço continua aberto para que todos se manifestem.