Entrevista: jornalista inglês conta a história da vacina da Pfizer
Autor de “A vacina”, Joe Miller conta a história científica, social e política do imunizante; livro chega ao Brasil na terça-feira (15/3)
atualizado
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Em fevereiro de 2020, quando o coronavírus passava a preocupar o mundo, o jornalista inglês Joe Miller, do jornal Financial Times, se mostrou cético ao ouvir uma previsão ambiciosa do casal de cientistas Özlem Türeci e Ugur Sahin, donos do laboratório BioNTech. Os pesquisadores turcos, que vinham estudando por três décadas a técnica do RNA mensageiro (mRNA) no combate a doenças, esperavam desenvolver uma vacina em menos de um ano.
“No início eu não levei muita fé”, afirmou Miller em entrevista à coluna. Três meses depois, em maio daquele ano, o repórter recebeu uma ligação do casal de cientistas. Eles lhe contaram que a BioNTech havia fechado uma parceria com a farmacêutica Pfizer. Miller ficou espantado. “A vacina está nascendo em um pequeno laboratório no interior da Alemanha e vai mudar a humanidade”, disse a si mesmo.
Desde aquele telefonema, o jornalista, que já vinha cobrindo a corrida pelos imunizantes ao redor do planeta e os efeitos da pandemia na Europa, se concentrou em acompanhar o desenvolvimento da vacina Pfizer/BioNTech. Miller contou que no início de 2020 pensava que iria escrever um livro sobre o fracasso do imunizante. Foi o contrário. Na próxima terça-feira (15/3), será lançado no Brasil “A vacina”, editado pela Intrínseca. A obra relata a história científica, social e política da vacina Pfizer.
Leia os principais trechos da entrevista:
O que você sentiu quando se deu conta de que a humanidade teria acesso à vacina em menos de um ano de pandemia?
No início eu não levei muita fé de que isso pudesse acontecer. Naquele momento, milhares de farmacêuticas e laboratórios ao redor de todo o mundo estavam correndo para produzir imunizantes, então eu não acreditava que o pequeno laboratório do interior da Alemanha desenvolveria a vacina que seria comprada por uma das principais farmacêuticas do mundo. Quando eu entendi a dimensão da história e que realmente aquele seria um dos imunizantes, eu fiquei tão surpreso e feliz quanto todo mundo.
A vacina da Pfizer com a BioNTech é o único imunizante do mundo desenvolvido com a técnica do mRNA. Mesmo assim, parte da população e dos líderes políticos mostrou confiar mais nessa vacina. Por que isso aconteceu?
Eu acho que uma das coisas que ajudou na criação dessa percepção foi a divulgação da eficácia das vacinas. Isso criou uma espécie de pódio entre os imunizantes, ditando qual era melhor e pior, o que não é necessariamente real. As pessoas nunca souberam a eficácia das vacinas já criadas pela humanidade, mas elas se apegaram às porcentagens divulgadas e criaram essa percepção, que foi inclusive alimentada pela mídia e pelos governantes.
Você relata no livro que funcionários da BioNTech e da agência reguladora de saúde da Alemanha foram ameaçados, algo que também aconteceu no Brasil. Em que contextos essas ameaças aconteceram na Alemanha? Havia motivação política?
As ameaças partiam tanto de grupos políticos antivacina quanto de ativistas dos direitos animais devido aos testes feitos no processo de desenvolvimento da vacina. Além disso, por ser uma vacina produzida com uma tecnologia inédita, o mRNA, havia uma certa preocupação com possíveis tentativas de sequestro ou invasões para descobrirem os estudos que levaram ao sucesso do imunizante.
Além da luta contra o tempo, houve uma batalha contra a desinformação. Quais cuidados você tomou ao escrever o livro para deixar claro a todos a segurança da Pfizer e não reforçar o “pódio de vacinas”?
Eu estava com muito medo de que as pessoas não se vacinassem. No meu trabalho diário, além do livro, eu já vinha reforçando a segurança de todos os imunizantes. Então no livro, por já ter a experiência de ter coberto a corrida das vacinas, eu busquei explicar o desenvolvimento da Pfizer de uma maneira mais próxima da realidade das pessoas. Quis mostrar que o trabalho de pesquisa e cuidado não foi exclusivo daquela única vacina.
O que diria a quem ainda não acredita nos imunizantes?
Não se deixem levar por discursos prontos, sejam de políticos ou de amigos. Façam perguntas e não tenham medo de fazê-las. É normal que todos tenham desconfiança com vacinas que foram desenvolvidas em menos de um ano, mas eu posso garantir que os estudos por trás desses imunizantes não foram desenvolvidos nesse curto tempo. No exemplo da Pfizer, os doutores Sahin e Türeci já vinham estudando o mRNA há mais de 30 anos.