“Bolsonaro pegou polícias para projeto político”, diz delegado do RJ
Orlando Zaccone afirma ter visto de perto a cooptação das polícias, tanto civil, quanto militar, por Jair Bolsonaro
atualizado
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Delegado da Polícia Civil do Rio de Janeiro há mais de 20 anos, Orlando Zaccone afirma ter visto de perto a cooptação das polícias, tanto civil, quanto militar, por Jair Bolsonaro para o que considera “a construção de um projeto político”. Candidato à Câmara pelo PDT, o delegado aponta, em entrevista à coluna, que a movimentação do presidente vai desde indicações em áreas de segurança pública no estado, para ter controle sobre as polícias e investigações, até a mera parabenização de operações violentas para legitimá-las e mostrar apoio à base da categoria.
No fim de 2017, em meio à ascensão do bolsonarismo, Zaccone buscou seus pares pelo Brasil e, com outros delegados, criou a Associação dos Policiais Antifascistas. Desde então, o delegado, que já era considerado “diferente” por alguns de seus colegas, por respeitar e defender os direitos humanos na segurança pública, já ouviu de colegas e superiores que é “a vergonha da Polícia Civil do Rio” e “comunista”.
Leia os principais trechos da entrevista.
Qual o objetivo do Policiais Antifascismo?
É mostrar que não são todos os policiais que estão com Bolsonaro, porque é isso que ele tenta passar para dar mais força ainda ao projeto político dele. Nós temos, associados, 1.500 policiais civis, federais, militares, guardas municipais, agentes penitenciários e bombeiros que estão comprometidos com a derrota de Bolsonaro nas eleições e na criação de um modelo democrático de segurança pública.
O que quer dizer quando fala do projeto político do Bolsonaro com os militares?
Eu digo que o Bolsonaro pegou as polícias para um projeto político porque a presença do bolsonarismo nessa área tem dois vieses. Uma é pela base, que é parecida com a forma como o movimento cresceu em grande parte da população, com discursos violentos, preconceituosos e a favor de uma parte dos trabalhadores. E há também as interferências na cúpula das polícias, é a federalização da segurança pública do estado. Existe uma adesão desses militares por cooptação, motivada por indicações que irão manter aquele projeto de poder. Eu, particularmente, acho essa segunda forma de apoio muito mais perigosa.
Qual a sua análise sobre a política de Segurança Pública do atual governo do Rio?
Eu vejo que ele tem o aumento da letalidade e da violência policial como uma política eleitoreira. O (governador) Cláudio Castro viu que parte da população aprovou a conduta, então acabou sendo bom para ele. Em dois anos de governo, ele coleciona três chacinas no estado. Esse projeto Cidade Integrada não existe, e a letalidade só vai aumentar porque ele e Bolsonaro legitimam isso.
Como é ser um ativista dos direitos humanos e da esquerda dentro da Polícia Civil?
Nunca foi fácil. Eu entrei na Polícia Civil para atuar com o que eu acredito e sempre fui muito observador sobre as práticas e as estruturas da corporação. Em alguns casos que eu investiguei, como a chacina do Borel e o desaparecimento do Amarildo, eu tive que adotar práticas incomuns para conseguir dar o direito de testemunhas e familiares que tinham medo de ir à delegacia serem ouvidos no caso, porque, senão, eu teria só a versão dos policiais para trabalhar. Outra coisa que eu percebi também e nunca aceitei é que a condição do morto é o que bota os policiais na mira ou não. Se um policial executa um bandido, a sociedade acha que está tudo bem e ele recebe mais um auto de resistência na ficha dele e não responde na Justiça por um homicídio doloso.