Ao cassar Dallagnol, TSE driblou jurisprudência que adotou até com Moro
No caso de Sergio Moro, TSE entendeu que a instauração do processo disciplinar era “elementar”; no caso Dallagnol, foi diferente
atualizado
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O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) driblou sua jurisprudência para cassar o mandato de Deltan Dallagnol, considerando que, mesmo sem haver um processo disciplinar instaurado contra ele quando era procurador, Dallagnol ainda seria considerado inelegível.
A lei de inelegibilidades afirma que são inelegíveis membros do Ministério Público que “tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos”.
O senador Sergio Moro foi absolvido de um processo parecido no TSE em dezembro de 2022 porque, quando deixou a magistratura, também não tinha processos disciplinares instaurados contra ele.
No acórdão sobre Moro, os ministros explicitaram que precisaria haver a instauração do processo, e não apenas um pedido de providências ou reclamação disciplinar.
“A instauração de processo administrativo disciplinar é elementar para a configuração da inelegibilidade, o que não ocorre com o pedido de providências e com a reclamação disciplinar, já que não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado”, diz o acórdão sobre Moro.
No caso de Dallagnol agora, o TSE considerou que o procurador saiu do Ministério Público Federal para se tornar candidato — ao contrário de Moro, que virou ministro de Estado — e por isso haveria alguma espécie de fraude.
Para Marcelo Peregrino Ferreira, advogado eleitoral e integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), o TSE deu uma interpretação extensiva para uma vedação que deveria ser lida de forma restritiva, para proteger os direitos políticos dos deputados eleitos.
“De novo, ficamos inventando novas formas de cassação de direitos políticos, como se não fossem direitos fundamentais”, diz Peregrino. “Ele (Deltan) poderia ter pedido exoneração, porque não havia ainda um processo administrativo contra ele. Ainda que ele tenha sido um dos maiores entusiastas das interpretações extensivas da Lei da Ficha Limpa.”
Advogados eleitorais que atuam no TSE foram pegos de surpresa pela decisão, que ampliou o rol de inelegibilidades para incluir processos disciplinares em potencial, o que a Lei da Ficha Limpa não prevê explicitamente.
“Não está previsto em nenhum lugar que essa conduta é irregular. Pelo contrário, (sair da carreira antes da instauração de processo) é uma recomendação que eu daria a qualquer cliente que quisesse ser candidato”, diz outro advogado eleitoral ouvido pela coluna, que não quis se identificar.
Para os advogados, a solução encontrada pelo TSE traz insegurança jurídica por punir qualquer servidor com um potencial processo disciplinar, que poderia ou não ter sido aberto pela corregedoria do órgão público.