Vídeo. Cronômetro fantasma “rouba” segundos em prova de concurso da Polícia Penal do DF
Um grupo de pelo menos 21 candidatos reprovados no teste de aptidão física indica que foi prejudicado pelo cronômetro e erros da banca
atualizado
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Cronômetro “fantasma” que rouba segundos durante prova de corrida e pistas com tamanho superior ao exigido são algumas das irregularidades apontadas por candidatos do concurso para policial penal do Distrito Federal.
Um grupo de pelo menos 21 candidatos reprovados no teste de aptidão física indica que foi prejudicado por erros da banca examinadora, o Instituto AOCP. As provas foram realizadas entre os dias 25 de fevereiro e 5 de março de 2023.
O teste de aptidão física é realizado apenas pelos candidatos do concurso que passam pela prova teórica. Eles devem fazer exercícios de flexão, barra, abdominal e uma prova de corrida de 12 minutos.
Por causa da quantidade de candidatos, foram feitas várias provas de corrida para que todos pudessem participar. A banca examinadora escolheu a pista de atletismo de uma faculdade particular para essa fase do certame.
Vários vídeos da prova de corrida mostram que o cronômetro pulou alguns segundos, em diferentes momentos. Ou seja, o tempo total de 12 minutos foi alcançado pelo cronômetro em descompasso com a passagem do tempo real. Veja:
Nas imagens, é possível ver quando o cronômetro “esquece” os seguintes tempos, durante diferentes provas: 00:57, 1:40, 3:27, 7:11 e 8:12.
Apesar de o contrato do Governo do DF com o Instituto AOCP estabelecer expressamente que a banca deve disponibilizar os vídeos da prova de avaliação de capacidade física, para subsidiar eventuais recursos dos candidatos, um grupo de 18 inscritos disse que teve pedido de acesso às imagens negado pelo instituto. Por isso, os concurseiros entraram na Justiça para que pudessem ver as gravações e apresentar as contestações.
Representados pelo advogado José da Silva Moura Neto, os 18 candidatos impetraram liminar junto à Justiça da Paraná, onde a banca tem sede. Já no DF, a Justiça atendeu a um pedido do advogado e determinou que o Instituto AOCP reabrisse o prazo de interposição de recursos administrativos aos candidatos e concedeu a todos acesso integral aos registros audiovisuais da prova de aptidão física.
“O Poder Público não pode criar dificuldades para a interposição de recursos administrativos pelos candidatos; e, em último e maior grau, em desacordo com o princípio constitucional da publicidade”, disse o juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública, Lizandro Garcia Gome Filho, na decisão de 31 de março.
Com as imagens em mãos, os candidatos reprovados se dizem prejudicados pela banca, temem não ter os recursos admitidos e ficarem de fora do curso de formação, que começa na próxima segunda-feira (15/5).
“Está todo mundo desesperado. Se começar o curso de formação, as nossas chances diminuem. Depois, o que poderá ocorrer é o Judiciário determinar que façamos o curso de formação no próximo concurso, que provavelmente irá acontecer somente daqui cinco ou seis anos”, disse um dos candidatos sob condição de anonimato por receio de sofrer represália.
Além do cronômetro “fantasma”, os candidatos apontam irregularidade na pista de atletismo escolhida para a prova de corrida. Os homens deveriam cumprir 2,4 mil metros e as mulheres, 2 mil metros.
Os inscritos disseram que foram informados, na hora da prova, de que as mulheres deveriam completar cinco voltas, enquanto os homens precisavam fazer seis voltas na pista para alcançar a distância mínima exigida.
Porém, laudos elaborados por especialistas contratados pelos candidatos e apresentados à Justiça apontam que a menor raia tinha 410 metros, enquanto a maior tinha 466 metros. “A banca examinadora exigiu que corrêssemos em uma pista maior do que o normal, acarretando diversas eliminações por alguns segundos de candidatos”, disse outro inscrito no concurso.
“Já foi constatado que a pista tem muita mais metros do que é solicitado pela própria banca, ou seja o candidato tem que fazer muito mais do que é pedido”, afirmou a mulher de um outro candidato.
O advogado dos 18 candidatos que já procuraram a Justiça contra a banca examinadora disse que “o concurso da Polícia Penal vem tendo problemas desde o início”.
“Já foi suspenso porque a organizadora não sabia que na lei do DF tinha obrigação de colocar ajuste proporcional da pontuação. A banca não deu para os candidatos acesso aos vídeos, embora obrigada pelo contrato resultado da licitação do concurso”, afirmou José Moura.
“Prejuízo”
Uma candidata já conseguiu reingressar no concurso por meio de decisão judicial. Ela apontou que, além de pular segundos, o cronômetro já começou com 1 segundo. “Houve quebra de isonomia já que as candidatas partiram de pontos diferentes, pois estavam enfileiradas”, declarou.
No dia 28 de abril, a desembargadora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), Rita de Cássia de Cerqueira Lima Rocha, condeceu liminar para que a vaga da inscrita fosse mantida.
“A falha do cronômetro causando o prejuízo de 2 segundos e o alegado maior comprimento da pista trazem, nesse momento processual, a fumaça do bom direito para a concessão da tutela antecipada recursal, sob pena de perecimento do próprio direito pleiteado de participação no curso de formação”, afirmou a magistrada na decisão.
O outro lado
Após a publicação desta matéria, o Instituto AOCP disse que “analisa as questões apresentadas pela reportagem”.
“Lembramos que a banca organizadora tem larga experiência em todo o território nacional, incluindo concursos da área de segurança pública, e realizou vários TAFs (Teste de Aptidão Física) ao longo de sua trajetória, sempre com transparência e isonomia em seus processos”, declarou.
Segundo o instituto, “as filmagens foram todas analisadas pela banca em fase de recurso, garantido-se a lisura dos resultados divulgados, à luz das regras do edital”.
“Apesar dos episódios relatados de falha do relógio digital, no recurso os tempos foram revalidados para evitar que os candidatos tenham sido prejudicados por tal ocorrência. O Instituto AOCP é uma organização séria, sólida e preza pela responsabilidade e compromisso”, pontuou.
Operação
No mês passado, o concurso da Polícia Penal do DF foi alvo de uma megaoperação da Polícia Civil do DF (PCDF). Segundo as investigações, 33 pessoas teriam fraudado o certame.
A operação, que teve participação de 240 policiais civis, é resultado de diligências iniciadas a partir de informações repassadas à Polícia Civil pela Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape).
Levantamentos revelaram que alguns candidatos teriam burlado a isonomia do concurso e se beneficiado indevidamente para aprovação no certame.
O concurso da Polícia Penal do DF oferece 400 vagas imediatas e 779 para cadastro reserva. O salário inicial é R$ 5.445.