“Tô na diligência”: “Xerife” de Águas Claras toca terror em condomínio
Vizinhos denunciam morador de perseguição, ameaça e difamação dentro e fora do condomínio de Águas Claras. Ele nega e diz que é a vítima
atualizado
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Um condomínio de Águas Claras, região de classe média do Distrito Federal, tem sido palco de discussões e troca de acusações que resultaram em mais de 10 boletins de ocorrência na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e processos judiciais.
No centro da confusão que tem tirado o sono dos moradores do Residencial Atol das Rocas está o servidor público Cláudio Araújo Caetano, de 53 anos, proprietário de um dos apartamentos. Ele é acusado por vizinhos de perseguição, ameaça e difamação em pelo menos nove BOs. O homem, porém, nega as acusações e diz que é perseguido em razão da atuação como conselheiro fiscal do condomínio (leia mais abaixo). Ele é autor de dois boletins de ocorrência nas quais se diz vítima de injúria e homofobia.
A coluna Grande Angular teve acesso ao nove boletins de ocorrência registrados entre dezembro de 2023 e julho de 2024 contra Caetano. Nos documentos, moradores relatam que ele as persegue e faz vídeos sem autorização, envia mensagens com acusações e ameaça que fará “devassa” em apartamentos.
Em abril, dois moradores contaram que estavam passeando com os pets, quando o homem começou a filmá-los sob justificativa de que estava “realizando uma diligência sobre o comércio de cachorros”.
Da janela de casa, em julho, Caetano filmou uma festa realizada no condomínio, por mais de uma hora, e fez suposições sobre o evento. Nos vídeos divulgados por ele, o conselheiro diz que as pessoas estavam “se escondendo” dele e afirma que a comemoração poderia ser um “evento externo”. “Tô na diligência”, disse.
“Às 20h53, estou aqui filmando um evento que está acontecendo no residencial. Está parecendo evento meio estranho, as barracas aqui, tudo escondido. Podem ver que está tudo muito bem escondido. O pessoal ali se divertindo. Isso aqui está parecendo mais uma boate, uma festa, suposto centro de convenções. A gente está analisando isso aqui”, afirmou. Veja as imagens:
Em outro vídeo, gravado por uma das moradoras, Caetano confirma que vai fazer “devassa” na casa da mulher. “Eu sou conselheiro fiscal”, afirmou o conselheiro.
A síndica do condomínio, Flávia Cristina Cordeiro Kamers, disse que está sendo perseguida e, além dela, outros seis moradores registraram boletim de ocorrência contra o conselheiro fiscal.
“Já obtivemos uma medida cautelar contra ele, para que não se aproxime de nós, pois ele nos persegue dentro do condomínio, filma, tira fotos e invade nossa privacidade. Temos várias reclamações de moradores e diversas ocorrências registradas no livro do condomínio”, relatou Flávia.
À polícia, a síndica diz que o homem a persegue, sempre a aborda em qualquer lugar, com o celular apontado para o rosto dela. Ela afirmou que pediu ao homem para que fizesse contato por e-mail, como os demais moradores, mas ele desconsiderou. A mulher disse, no depoimento, que está ficando doente e tem crises de pânico quando vê o conselheiro, que chamou de “imprevisível e violento”.
Em março de 2024, a 2ª Vara Criminal de Águas Claras proibiu o “xerife” de manter contato, por qualquer meio, com a síndica e outros moradores que são testemunhas no processo movido por ela contra o servidor por calúnia, injúria e difamação.
“Fungando”
Um outro morador contou à polícia que estava fazendo compras em um supermercado de Águas Claras, em julho, quando o “xerife” se aproximou, ficou “observando a prateleira de ovos, mastigando de boca aberta e fungando próximo ao ouvido, tentando chamar a atenção”.
O homem, que é testemunha no processo de autoria da síndica, passou a desconfiar da situação no meio do supermercado. Em seguida, o “xerife” chegou tão próximo que o vizinho conseguia escutar a respiração dele e pediu para que se afastasse.
Segundo o depoimento do morador, Caetano se alterou e começou a falar de forma exaltada e declarou: “Afastar o quê? Vai rolar uma devassa, devassa”.
A advogada Solange de Campos César, representante de uma moradora do condomínio que tem Transtorno do Espectro Autista (TEA), disse que a cliente apoia a síndica e, por isso, ela e o marido “são frequentemente alvos de perseguições, inclusive em locais fora do condomínio, como supermercado, padaria e redes sociais”.
“O condômino já interpôs várias ações contra outros moradores que também apoiam a gestão atual, todas com o mesmo teor, caracterizando uma verdadeira ‘copia e cola’, sem apresentar provas idôneas de suas falsas alegações. Em todas as ações, ele solicita indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil, demonstrando uma clara tentativa de enriquecimento ilícito. O desgaste emocional causado à minha cliente é imensurável, assim como o sofrimento dos demais moradores que discordam das suas atitudes”, afirmou a advogada.
O que diz o conselheiro
Os desentendimentos no Atol das Rocas começaram quando o condomínio aprovou uma taxa extra para pagar a obra de reforma da fachada. O conselheiro discordou e, junto a outro morador, fez uma série de reclamações contra a síndica internamente e, também, à Polícia Civil e ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).
O conselheiro diz que ele é a verdadeira vítima e está sendo perseguido porque “desarticulou uma suposta quadrilha envolvendo empresas de engenharia, prestadores de serviços, assessor jurídico do residencial”. “A todo instante eu, conselheiro Edmilson Botelho e os proprietários somos intimidados por todos esses”, afirmou.
O homem mostrou um site em que teria obtido apoio de supostas 184 assinaturas “contra perseguição pessoal e expulsão do conselheiro”. Ele afirmou, ainda, que foi alvo de comentários homofóbicos. Veja:
Há oito processos judiciais contra Caetano no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Em uma ação já houve decisão, do Juizado Especial Criminal de Taguatinga, que homologou arquivamento da ação por calúnia, difamação e ameaça após o Ministério Público se manifestar no sentido de que “não há elementos de prova suficientes e caracterizadores de justa causa para a instauração de ação penal”. As demais seguem ainda não foram julgadas.