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Brasília é uma marca reconhecida em todo o mundo por manter características que a elevam a um status de cidade-parque, com grandes áreas verdes, prédios baixos e qualidade de vida que ainda se diferencia das grandes metrópoles. Esse padrão rendeu à capital federal do Brasil o título de patrimônio da humanidade em 1987.
Mas um projeto de lei complementar que tramita na Câmara Legislativa do Distrito Federal tem o poder de roubar o ar bucólico do Plano Piloto e transformar a capital em mais uma cidade apinhada de prédios e sem os atributos que transformaram Brasília em endereço único no mundo.
Em uma série de reportagens publicadas a partir desta quinta-feira (13/6), o Metrópoles mostrará como o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCub) trai o próprio nome e abre portas para mudanças radicais na atual ocupação territorial do Plano Piloto, a ponto de permitir que Brasília vire uma espécie de Águas Claras, região administrativa a 21 quilômetros da Esplanada dos Ministérios que tem grandes prédios muito próximos uns dos outros e com bem menos espaços verdes na paisagem.
O Distrito Federal é diferente das demais unidades federativas do país. É formado pelo Plano Piloto e por mais 34 regiões administrativas, que são como cidades independentes. O Conjunto Urbanístico de Brasília (CUB) contempla o Plano Piloto – área que, vista do alto, forma o famoso desenho que muita gente remete a um avião – onde estão a Asa Sul, a Asa Norte, o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto. Também inclui Cruzeiro, Candangolândia, Sudoeste, Octogonal e Setor de Indústrias Gráficas (SIG).
A região de 112,25 Km² no centro da capital do país é patrimônio da humanidade, título concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 1987, além de ser tombada em nível distrital e federal.
O PPCub, apresentado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) à Câmara Legislativa, em março de 2024, traz uma série de mudanças em vez de apenas consolidar um conjunto de regras para a conservação do Plano Piloto.
Camping na porta de entrada
Entre essas mudanças, está a destinação de uma gigantesca área verde no fim da Asa Sul para acampamento, comércio e restaurantes. Com essa alteração, a primeira imagem de quem desembarca no Aeroporto Internacional de Brasília seria a de um camping, com permissão para instalação de quiosques, trailers e tendas.
A criação de um camping no fim do Eixo Sul, logo após as quadras 216 e 416, não está prevista na concepção original de Lucio Costa nem no Plano Brasília Revisitada. Veja as imagens do local que pode abrigar, em breve, o acampamento:
Uma das principais características de Brasília é, justamente, a escala bucólica, com predomínio da vegetação e dos espaços livres para compor a paisagem da cidade-patrimônio, o que será comprometido com a permissão de tendas, trailers e quiosques bem na porta de entrada da capital do país.
Brasília teve um camping irregular até 2014, na região onde hoje é o Noroeste. O alojamento provisório ficava no Albergue da Juventude, que, de acordo com a Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap), era ocupado ilegalmente para essa finalidade.
Sobre a ocupação da região no início da entrada de Brasília, a Seduh informou que se trata da área do Parque Urbano dos Pássaros e do Parque de Modelismo de Brasília e frisou que, por se tratar de parques, “é necessária a indicação de parâmetros de uso e ocupação para que instalações de apoio sejam viabilizadas”. “A atividade ‘serviço de alojamento’ é, na verdade, a possibilidade de instalação de camping no Parque Urbano dos Pássaros, permitido para essa UP [unidade de preservação]”, pontuou.
Com a resposta da Seduh, conclui-se que, sob a simpática denominação de parques, a área em questão passará a ser ocupada por camping e todo o aparato comum a esse tipo de instalação, como trailers, quiosques e tendas.
O Metrópoles passará a publicar diariamente os demais pontos do PPCub que modificarão completamente a paisagem atual do Plano Piloto. As alterações previstas nesse projeto de lei estão longe de ser consideradas um plano de preservação da capital.