Pestana fará muita falta
Paulo Pestana era um boa-praça, de personalidade afável, sorriso gostoso, espírito leve. O jornalista morreu nesta segunda-feira aos 65 anos
atualizado
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Faz alguns dias, almocei com Pestana, como era de costume, pelo menos uma vez por mês. Os nossos encontros tinham uma formação original: ele, Weligton (secretário de Comunicação do DF), Priscilla (diretora-executiva do Metrópoles) e eu, que comando o portal.
Em geral, éramos quatro. Não existia chamar Weligton para um café, almoço ou jantar e imaginar que ele fosse sozinho. Estaria, invariavelmente, acompanhado de seu conselheiro, amigo e parceiro de profissão. Da mesma forma, um convite a Pestana também era extensivo a Weligton.
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Muito embora a motivação desses encontros fosse profissional, era impossível sentar-se à mesa com Pestana e não querer falar da vida. Ele tinha argúcia muito acima da média. E senso de observação que lhe garantia leituras assertivas de cenários políticos. Mas seus talentos profissionais nunca ofuscaram suas qualidades pessoais. Pestana era um boa-praça, de personalidade afável, sorriso gostoso, espírito leve.
Jornalista por formação, não acumulava vaidades. Colecionava histórias. E tinha um estilo saboroso de contá-las, porque o fazia com doses de perspicácia, temperadas com ironia suave e recheadas das referências próprias de quem lê por esporte. Sua memória alcançava os bastidores de todos os governos que o Distrito Federal já teve. E, mesmo cercado do poder, nunca flertou com a arrogância.
A Pestana são atribuídas importantes vitórias eleitorais. As duas eleições de Ibaneis estão entre suas conquistas não espalhafatosas. Ele foi o mentor das campanhas. Não exercia cargo no governo, mas era uma das pessoas mais importantes do Buriti. A quem o governador ouvia com atenção. Ibaneis não o considerava apenas conselheiro, mas o tinha como um amigo.
Conduzida, talvez, pelo pesar de perder um colega tão querido e de quem sentirei falta, me dei conta de que, em nosso último encontro – o tradicional almoço no Lakes –, falamos mais sobre a vida que sobre trabalho. Pestana nos fez rir ao partilhar sua experiência em evitar insônia tratada à base de indutor do sono. “Mantenho uns quatro clássicos, daqueles bem cascudos, na cabeceira da cama. Não consigo passar da quarta página, o olho pesca, durmo e nunca termino.”
Naquele dia, Pestana estava alegre. Mostrou fotos dos filhos, dos netos que moram na Alemanha. Casado há mais de quatro décadas, disse que nunca enxergou a vida sem a companhia de sua mulher, Zelinda. Em tempos de relações tão voláteis, uma declaração de amor.
Já perto de a gente se despedir, reparou que o vinho ainda estava pela metade. Foi o gancho para contar a anedota do amigo que jamais cometeria o sacrilégio de deixar garrafa pela metade, porque, toda vez que abria uma, jogava a rolha no telhado.
Pestana era o tipo de gente que ri de si mesmo. A propósito do hábito de beber socialmente, ele contou que cultivava há anos grupo de amigos que se reuniam para tomar uma cervejinha sempre às quintas. E que, pelo avançar da vida, os assuntos sobre perrengues de saúde estavam cada vez mais presentes. “Aí a gente estabeleceu uma regra de ouro: ‘Todo mundo pode contar só um perrengue por encontro. Depois, a gente muda a pauta, só vale falar de coisa boa’”.
Pestana fará falta naquela mesa de bar. Fará muita falta para sua família. Fará falta a seus amigos. A seus colegas. Aos seus leitores. A seus aconselhados. Pestana fará muita falta.