Mulher é discriminada em seleção de emprego “só para homens” do Superior Tribunal Militar
Corte disse que empresa terceirizada cometeu “equívoco” e selecionou apenas candidatos para o emprego de designer gráfico
atualizado
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Interessada em anúncio de emprego para designer gráfico no Superior Tribunal Militar (STM), uma mulher foi surpreendida com a resposta que recebeu. “Desculpa, mas a vaga é só para homens”, diz a mensagem enviada a ela.
A conversa pelo WhatsApp ocorreu no dia 20 de janeiro. A moradora do Distrito Federal, que preferiu não se identificar, contou à coluna Grande Angular que soube da oportunidade por meio de um grupo do qual participa no aplicativo.
“Tinham falado que era uma vaga para o STM, o valor do salário e só. Então, mandei uma mensagem para a pessoa e falei que estava interessada. Ela me respondeu logo em seguida, dizendo que era só para homens. Achei estranho”, relatou.
A profissional, de 33 anos, disse que nunca teve uma experiência semelhante com discriminação de gênero. “Eu cheguei a pensar: ‘É sério isso?’ E até me senti meio mal. Talvez já tenha passado, sim, mas tão na cara assim, foi a primeira vez. Participei de processo seletivo para fotógrafa e não fui aceita por causa da idade”, lembrou.
O anúncio sobre a oportunidade de emprego dizia o seguinte: “Vaga para designer gráfico. Faculdade na área. O salário é de R$ 5.760,69 bruto + plano de saúde e odontológico + vale alimentação de R$ 33,62 dia e vale transporte. De segunda a sexta-feira. Vaga no STM”.
Havia, ainda, o nome do responsável pela seleção e o telefone para mais informações. Não tinha qualquer indicação sobre o sexo, que só foi revelada após o contato.
Profissional da área há 27 anos e professor, Gustavo Tomé de Oliveira disse que não existe qualquer atividade no campo do design que justifique a exigência de gênero.
“É a maior ignorância que já ouvi na minha vida. Design é empatia”, resumiu. “O trabalho do designer, com bacharelado, envolve pesquisa de etnografia para entender quem é o público que vai utilizar o trabalho feito por ele. Esse é o papel: pesquisar, entender, propor e desenvolver soluções para um problema específico”, pontuou.
O que diz a lei
A Constituição Federal, em seu art. 7º, proíbe diferença no critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, assim como de salários e exercício de funções.
Presidente da Comissão de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Distrito Federal (OAB-DF), Fernando Abdala frisou que não pode haver discriminação de gênero em quaisquer vagas de emprego.
“Até em atividade com característica periculosa, que exige força e atributos físicos, isso não é mais aceito. Em uma circunstância de atividade intelectual, como é design gráfico, aí é que não existe qualquer justificativa. Isso é completamente ilegal. A conduta da empresa é altamente questionável”, comentou.
Abdala esclareceu que há punição para discriminação de gênero no âmbito administrativo e também na esfera judicial.
Habilidades
O STM contratou a empresa Alfa e Ômega Serviços Terceirizados para prestação do trabalho de design gráfico, por meio de um pregão eletrônico. A terceirizada venceu o processo com um lance de R$ 135,4 mil.
Segundo o edital, são atribuições mínimas para a função de designer, por exemplo: habilidades para expressar ideias visualmente; domínio em aplicação de elementos tipográficos; e experiência na elaboração de projetos gráficos, identidade visual, logotipos, vetores e peças publicitárias comerciais.
O Superior Tribunal Militar integra o Poder Judiciário e julga os crimes militares cometidos por integrantes das Forças Armadas ou por civis que atentem contra a Administração Militar Federal.
O outro lado
Por meio da assessoria de imprensa, o STM informou ter contratado os serviços de design gráfico por empresa terceirizada “sem que fizesse qualquer discriminação de gênero, conforme se verifica das condições previstas no Projeto Básico, anexos II e III, replicado no Edital de Licitação, onde consta explicitamente: designer gráfico – masculino/feminino”, citou.
O tribunal confirmou que houve um erro: “Por equívoco, a empresa terceirizada descumpriu o edital e selecionou apenas candidatos do sexo masculino”.
O STM ainda disse que avaliou a seleção realizada e determinou que a empresa faça outra, “conforme previsto no edital, sem discriminação de gênero”.
A reportagem entrou em contato com o número do recrutador identificado no anúncio, na última sexta-feira (22/1), e questionou o motivo da exigência do sexo masculino. A pessoa limitou-se a dizer: “Desculpa, mas a vaga foi preenchida ontem”.
Na quarta-feira (27/1), a Alfa e Ômega afirmou, por meio de nota, que “as informações analisadas não procedem” e que fez o recrutamento utilizando “o site da empresa, divulgação pelo aplicativo WhatsApp e currículos já existentes do banco de dados”.
“Dessa forma, foram selecionados currículos de homens e mulheres. A empresa encaminhou ao STM os currículos selecionados, onde é claro e notório que não houve qualquer tipo de discriminação para a seleção”, pontuou.
“Ressalta-se, ainda, que a empresa primou em encaminhar currículos que atendessem ao exigido no edital, sendo uma delas a graduação completa na área. Ainda não houve o preenchimento da vaga”, concluiu.