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Estudo indica por que 61% dos casos de golpe Don Juan foram arquivados

O promotor de Justiça do MPDFT Thiago Pierobom analisou os casos de estelionato sentimental registrados no DF em 2019 e 2020

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Um estudo realizado sobre 39 casos de estelionato sentimental – conhecido como golpe do “Don Juan” – registrados no Distrito Federal mostra que 61,5% das investigações foram arquivadas, a maioria (87,5%) por falta de provas.

Segundo o autor da pesquisa, o promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) Thiago Pierobom, o levantamento revela a necessidade de aprofundamento das investigações e do reconhecimento desse crime como violência baseada em gênero, de acordo com a Lei Maria da Penha.

Os dados foram extraídos de processos judiciais relativos a boletins de ocorrência registrados na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), em 2019 e 2020. O valor dos golpes informados pelas vítimas soma R$ 2,7 milhões. Em entrevista à coluna Grande Angular, Pierobom disse que os arquivamentos ocorreram apesar de ainda ser possível a realização de diligências que poderiam resultar na obtenção de provas do crime.

“Muitas investigações não exauriram toda a linha investigativa, ou seja, não houve inquirição à vítima para que ela indicasse se havia possíveis testemunhas ou provas que pudessem esclarecer os fatos. Em muitos casos em que a mulher indicou possíveis testemunhas do crime, não houve tentativa de oitiva dessas testemunhas. É uma decisão investigativa complexa, que envolve quebras de sigilo bancário, fiscal ou telefônico, nem sempre realizados. É preciso qualificar o trabalho investigativo”, afirmou Pierobom.

O tempo médio das investigações criminais arquivadas por falta de provas foi de quase dois anos (708 dias). Nos 10,3% dos casos efetivamente denunciados e sentenciados, a apuração durou, em média, 367 dias.

“O estudo indica que, muitas vezes, as investigações são lentas, arrastam-se por muitos meses, sem fazer todas as diligências –  fruto, sem dúvida, de uma sobrecarga de trabalho pela qual passa a Polícia Civil”, analisou o promotor de Justiça.

Em cinco casos, o arquivamento de investigação do golpe Don Juan ocorreu em razão da escusa absolutória conjugal, caracterizada pela impossibilidade de punir alguém por cometer crime patrimonial contra o cônjuge. O entendimento de que a situação não se enquadra na esfera criminal, mas apenas na cível, também foi usado como justificativa para arquivamento de cinco ocorrências policiais. Os outros motivos para não dar andamento ao processo são: retratação à representação, ausência de representação e princípio da insignificância.

O levantamento também traça um perfil das vítimas dos casos de estelionato sentimental. A maioria das mulheres é branca (53,8%), de meia-idade (entre 25 e 44 anos), mora em bairros de classe média ou alta (61,9%) e tem renda econômica acima de três salários mínimos (59%). Em relação aos autores, 38,5% eram apontados como suspeitos em outras ocorrências policiais.

Os golpes do Don Juan foram aplicados por meio de gerência abusiva do patrimônio (66,7%), indução à entrega de bens (48,7%) e falsificação de documentos (23,1%). Os suspeitos usaram como estratégia o abuso da relação afetiva (41%), a falsa identidade (35,9%), a imposição de medo/intimidação (35,9%), a simulação de emergência (30,7%), a exigência de cuidado (25,6%) e a falsa oportunidade (15,4%).

Lei Maria da Penha

Dos casos de estelionato sentimental registrados no DF entre 2019 e 2020, apenas 23% foram enquadrados na Lei Maria da Penha, o que permite a concessão de medidas protetivas de urgência para proteger o patrimônio da mulher. O promotor defende que o golpe Don Juan seja considerado como crime de violência baseada no gênero, porque há relação íntima de afeto.

“A pesquisa sinaliza, também, a importância de se melhorar a atuação em perspectiva de gênero por parte dos profissionais do sistema de Justiça, no sentido de reconhecer que esses crimes também têm racionalidade derivada das relações de gênero e dar a proteção para a mulher prevista na legislação”, explicou Pierobom.

O promotor de Justiça ressalta que, nos casos analisados, o homem quis confundir a vítima com urgências, janelas curtas de oportunidades imperdíveis ou invocando o poder de gestão masculina do patrimônio. “Claramente as relações de gênero favoreceram a prática do golpe”, enfatizou.

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