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Chantagista cobrou R$ 400 mil de deputado para “barrar” matéria no Fantástico

Estrangeiro ainda exigiu outros R$ 360 mil de Luis Miranda (DEM-DF), mas acabou preso em flagrante durante operação da Polícia Civil

atualizado

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Luis Miranda
1 de 1 Luis Miranda - Foto: Reprodução

O homem suspeito de promover ataques virtuais e de extorquir o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) pediu R$ 760 mil alegando ter condições de barrar reportagem contra o parlamentar e evitar que ele continuasse a ser alvo de ataques nas redes sociais. Daniel Luís Mogendorff, 35 anos, foi preso em flagrante na noite de quinta-feira (05/09/2019) em um hotel no centro de Brasília pouco tempo depois de chantagear o político eleito pelo Distrito Federal.

Vídeos gravados com câmeras escondidas na roupa de Miranda, aos quais o Metrópoles teve acesso, mostram o teor da conversa mantida entre o homem e o congressista. O aparato que produziu o flagrante foi montado pela Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC), da Polícia Civil do DF (PCDF).

Um dos pontos que configurou a chantagem, segundo entendimento dos investigadores, foi o momento em que o suspeito disse que conseguiria evitar a publicação de matéria supostamente em desfavor do deputado no programa Fantástico, da Rede Globo. “Se você tem vontade de tirar isso do Fantástico, a gente faz. Já tá tudo no pente”, afirma.

Daniel chegou a propor que Miranda pagasse os R$ 760 mil em duas vezes: R$ 400 mil seriam em razão da suposta retirada de matéria da pauta do Fantástico e o restante para o homem remover do YouTube vídeos com ofensas ao parlamentar e evitar que outros fossem a público.

Mogendorff mora em Israel, tem passaporte alemão e chegou a Brasília para encontrar Luis Miranda na quarta-feira (04/09/2019). Menos de 24 horas depois, estava sendo detido por policiais civis do DF. Nessa sexta-feira (06/09/2019), durante audiência de custódia, a Justiça converteu em preventiva a prisão do acusado.

O conteúdo da suposta matéria apurada pelo Fantástico não é revelado no diálogo interceptado pela unidade especializada da PCDF. Na conversa, mantida no restaurante Coco Bambu do Lago Sul, bairro mais nobre da cidade, os dois negociam valores que seriam usados no sentido de proteger Miranda contra as acusações. Tudo monitorado por 20 agentes à paisana. Leia abaixo a transcrição do trecho gravado com equipamentos da polícia:

Daniel: Qual é a minha ideia? Só pra você entender meu raciocínio. Se você tem vontade de tirar isso aí do Fantástico, a gente faz. Já tá tudo no pente, o Danilo tá esperando dá o ok. Entra amanhã de manhã e à tarde passa pra outro, que, por sinal, é Lauri também.

Miranda: O nome do cara da Globo se chama Lauri?

Daniel: Você sabia?

Miranda: Não, pô. Eu tô trabalhando igual um cachorro como deputado. Não tenho tempo para essas coisas, não.

O deputado, sabendo que estava sendo monitorado pelos policiais, faz uma pergunta incisiva  ao seu interlocutor:

Miranda: No passo a passo. Fantástico, se eu quiser, a gente consegue melhorar aquele valor [de R$ 400 mil]?

Daniel: Eu não estou ganhando um centavo por isso.

Miranda: É R$ 400 mil se eu não quiser que a matéria vá ao ar?

Daniel: É. Por isso que eu te falo. Eu acho que esse valor… você não precisa gastar, é uma opinião. Agora, se você fala, ‘Daniel, é minha vontade…’

Miranda: Eu não quero. A matéria é uma mentira, você sabe que é uma mentira. Você construiu essa mentira sobre minha pessoa.

Daniel: Mas isso aí, é como a questão que te falei. É bom pra gente…

Miranda: Uma mentira? Por quê? Depois eu vou processar o Fantástico?

Daniel: Não. Primeiro, a liminar [incompreensível] e eles vão respeitar, porque a Globo respeita, você sabe disso.

Assista:

 

Por telefone, o Metrópoles entrou em contato com a Rede Globo. Uma funcionária da emissora orientou a reportagem a enviar a demanda para a ouvidoria da empresa. O Metrópoles também procurou um produtor do Fantástico, mas ele não quis dar nenhuma declaração e pediu para que as perguntas fossem encaminhadas aos advogados da Globo. Até a última atualização deste texto, a emissora de TV não havia respondido.

Já preso e em depoimento aos investigadores, Daniel negou o crime de extorsão e alegou que o dinheiro ao qual se referia no encontro com o deputado seria usado para a contratação de advogados. Os defensores, segundo Mogendorff , entrariam com liminar na Justiça para “tentar evitar” publicação de matéria contra o deputado.

Milícia virtual

Em outro momento da conversa no Coco Bambu, Daniel pediu mais R$ 360 mil em troca da promessa de cessar publicações produzidas por um grupo de youtubers.

Na gravação, o deputado alega que os ataques são falsos e teriam “acabado com a vida dele”. Ao perguntar se precisaria mesmo pagar os R$ 360 mil para se livrar das publicações, Mogendorff responde que sim. Leia a transcrição:

Miranda: Antes de tudo, preciso saber o seguinte: você tem poder pra fazer esses caras parar de me atacar.

Daniel: Mas isso aí, sim. Isso aí é pra ontem.

Miranda: Perfeito. E se eu quiser que os vídeos desapareçam, também. Isso vai me custar?

Daniel: A gente colocou R$ 360 [mil]. Eu vou te cobrar R$ 180 [mil] agora e, daí a seis, três meses, dependendo do resultado, você vai ver…

Miranda: Com isso aí, ‘nego’ para de me bater… e eu sozinho. Você fez [incompreensível] na minha imagem.

Daniel: Se você me der esses seis meses, você vai ver o que eu faço. Eu vou te dar um papel, você vai sentar meia hora, gravar um vídeo pra mim e aí você vai ver o que é ganhar dinheiro.

Veja:

 

Em outro momento da conversa entre Daniel e Miranda, para provar ter conhecimento e influência, o chantagista apaga um dos vídeos publicados com ofensas ao deputado na frente do parlamentar, que questiona se Daniel é quem edita os vídeos: “Na verdade, você é o cabeça, né? Você que manda nos caras”, diz. Daniel, então, responde: “Eu falo como fazer”.

Veja uma parte do encontro. Miranda aparece de preto nas imagens:

A detenção do estrangeiro só foi possível porque, instruído pela polícia, para caracterizar o flagrante, o deputado disse ao criminoso que daria somente R$ 4 mil de sinal e que depois repassaria o restante. De posse do dinheiro, ele seguiu para o hotel, onde recebeu voz de prisão.

 

Restante da quadrilha

Um dia após anunciar a prisão de Daniel Mogendorff e indiciar outras pessoas por organização criminosa, extorsão e coação, Giancarlos Zuliani, delegado-chefe da DRCC, convocou uma coletiva de imprensa para dar detalhes sobre o caso revelado pelo Metrópoles.

O delegado classificou o grupo como uma “milícia virtual” e disse que o estrangeiro contou ter deixado Israel e desembarcado no Brasil para fazer um trabalho de edição de vídeo para um cliente. “Ele disse que, pelo serviço, receberia R$ 360 mil. Sabemos que é um valor muito alto para esse trabalho. Por isso, não acreditamos”, narrou o investigador.

A DRCC ainda busca levantar mais informações para traçar o perfil de Daniel e, por isso, conta com apoio da Embaixada de Israel em Brasília. “Sabemos muito pouco ainda. Precisamos identificar o que ele faz, onde mora, por exemplo.” A polícia apura se outras pessoas foram extorquidas por ele.

Em janeiro, Luis Miranda já havia feito denúncias contra três youtubers que estavam produzindo vários vídeos contra ele. “Mas tratamos como crime de menor potencial ofensivo. Só finalizamos o inquérito e encaminhamos à Justiça”, destacou o delegado. Em julho, Miranda voltou à delegacia para tentar provar que as ações eram orquestradas.

A respeito dos outros quatro integrantes da quadrilha, Zuliani explicou que todos foram indiciados, mas vivem atualmente nos Estados Unidos. “Isso não irá impedir a continuação do processo penal. Caso sejam julgados e condenados à revelia, poderão ser presos caso pisem em solo brasileiro”, explicou o delegado. Três deles foram identificados: Giselle Souza Pereira, Lauri de Matos Filho e Mauro Cavanha Conceição. Assim como Mogendorff, segundo apuração da DRCC, eles também estariam em uma investida para perseguir o deputado no ambiente digital. O trio responde pelos mesmos crimes atribuídos a Daniel Mogendorff,

Procurado pelo Metrópoles, Luis Miranda afirmou ter acionado a polícia após sofrer investidas do bando. “Era um grupo que a PCDF investigava há um tempo, e decidiu promover ataque a mim na internet. A intenção dessa quadrilha era minar minha imagem e conseguir dinheiro”, disse.

 

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