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Áudio: médico acusado de desviar respiradores orientou alta de pacientes para liberar leitos

Sem falar em critérios sobre estado de saúde de doentes, Fabiano Dutra Duarte diz: “Hospital vazio é melhor para todo mundo”. CRM apura

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1 de 1 Fabiano-Duarte-Dutra-médico-Iges-DF - Foto: Reprodução

Um dos principais alvos da Operação In Rem Suam da Polícia Civil do Distrito Federal, deflagrada nessa quarta-feira (03/06) para apurar suposto desvio de equipamentos de hospitais públicos do DF, especialmente respiradores, o médico Fabiano Duarte Dutra (foto em destaque), se envolveu em outra polêmica.

Agora afastado do cargo do diretor de Atenção à Saúde do Instituto de Gestão Estratégica do Distrito Federal (Iges-DF), o profissional orientou a equipe do Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), onde acumulava a função de superintendente, a evitar novas autorizações para internação de pacientes que procurassem a unidade.

A coluna Grande Angular teve acesso à gravação. No áudio de 57 segundos,  o profissional também estimula os subordinados a concederem alta aos pacientes sem avaliar aparentemente os critérios necessários sobre o real quadro clínico daqueles que procuraram a unidade pública de saúde.

“Pessoal, eu estou tendo uma sensação de que… A gente tinha um movimento de não dar alta para os pacientes, porque como era muita gente, o cara fala: ‘Meu irmão, se eu der alta aqui, eu estou fodido, né? Então, o que acontece? Agora, se a gente for diminuindo clínica médica, diminuindo paciente, diminuindo, diminuindo, vai chegar uma hora e o que vai acontecer? Vai acontecer o movimento contrário. O cara [médico] vai falar: ‘Meu irmão, se eu internar, estou ferrado’. Porque vai ter muito paciente para prescrever [sic]”, gravou.

“Então, se a gente conseguir diminuir o número de pacientes internados – e os colegas entenderem isso –, porque eles sabem que se internar, vai ficar ruim para todo mundo. Então, o que vai acontecer é exatamente o contrário: a galera vai ver que hospital vazio é melhor para todo mundo, entendeu? Então, com esse pensamento, eu acho que nós vamos arrebentar, né? Batemos 78 pacientes agora internados… Olha que beleza, gente! [sic]”, continuou Fabiano Duarte na gravação.

A fala é alarmante, pelo fato de tratar-se de um médico abordando a realidade do paciente não sob o ponto de vista da saúde, mas, sim, pela conveniência administrativa. Pelo tom, o superintendente do HRSM aparenta comemorar o fato de a unidade não atender mais o mesmo número de pacientes que correspondam à grandeza daquela unidade hospitalar.

Ouça:

Reações indignadas

Quem teve acesso ao áudio não comentou abertamente no grupo, mesmo porque o interlocutor exerce a função de chefia na unidade. Contudo, o teor da gravação gerou reações indignadas em canais paralelos ao da origem da declaração do diretor do Iges-DF.

Isso porque, de acordo com os profissionais da unidade ouvidos pelo Metrópoles, diferentemente de outras épocas, a procura por atendimento no pronto-socorro do HRSM despencou após a pandemia do novo coronavírus no Distrito Federal.

A queda reflete também a recomendação de autoridades sanitárias para que os possíveis pacientes, independentemente da enfermidade, só procurem unidades de saúde em casos de sintomas graves, já que os hospitais são potenciais vetores de contaminação da Covid-19.

Estado de saúde

Em apenas 57 segundos, o gestor fala da internação e de alta dos pacientes sem, em nenhum momento, ponderar sobre a variável mais importante de todas em se tratando de vidas: o estado de saúde dos doentes.

Antes da pandemia do novo coronavírus, a unidade já disponibilizava à população 384 leitos, divididos em internação, cuidados intensivos e intermediários, emergência e observação. Apenas na unidade de Santa Maria o serviço de UTI reúne 70 leitos de tratamento intensivo adulto, infantil e neonatal.

Atualmente, devido às demandas por mais leitos, há um total disponível de 454 vagas. E uma promessa de mais 60 lugares por parte d0 Ministério da Saúde.

Operações

Fabiano Duarte Dutra foi alvo, na manhã dessa quarta-feira (03/06), da Operação In Rem Suam, que investiga suspeitas de desvio de materiais hospitalares, incluindo respiradores da Secretaria de Saúde do DF. O caso é investigado pela Coordenação Especial de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Cecor), da Polícia Civil do Distrito Federal.

O inquérito, conduzido pela Divisão de Repressão ao Crime Organizado (Draco), com apoio do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), aponta para a possível atuação do servidor no esquema.

Ao todo, foram cumpridos sete mandados de busca e apreensão no DF, com a participação de 50 policiais civis. Os alvos foram as casas do servidor, o próprio Iges-DF e a empresa investigada, uma importadora de produtos hospitalares situada no Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA), bem como seus sócios.

Antes do episódio, Fabiano Duarte Dutra chegou a ser preso, em 2016, suspeito de envolvimento em outro esquema: da Máfia das Próteses. Ele foi acusado de queimar documentos para tentar atrapalhar as investigações.

Acabou inocentado pelos magistrados, mas o Ministério Público recorreu da decisão e o processo ainda corre no Judiciário.

O que dizem os envolvidos

Ao Metrópoles, o Conselho Regional de Medicina (CRM-DF) afirmou que abrirá uma sindicância para apurar os fatos.

Quando procurado pela Grande Angular, antes da operação policial, o médico Fabiano Dutra Duarte afirmou que o áudio teria sido enviado em outubro de 2019, bem antes da pandemia do novo coronavírus. “É um áudio antigo, que foi tirado do contexto para me prejudicar”, disse à época.

“No Hospital de Santa Maria, a taxa de permanência, quando eu assumi, era de 28 dias. Tinha pacientes que passavam cinco, sete dias sem ser visto pelo médico. Então, nós contratamos e conseguimos reduzir o período médio de internação para seis dias. O áudio foi enviado nesse contexto de esforço para melhorar o atendimento”, explicou antes de se tornar alvo da PCDF.

Nessa quarta-feira (03/06), contudo, o gestor não foi localizado.

Também acionado pela reportagem, o Iges-DF afirmou não compactuar com a declaração do diretor de Atenção à Saúde da instituição e que “tomará todas as providências para apurar o fato”. Contudo, após o gestor ter se retratado sobre a descontextualização do áudio, o instituto informou que “não teve conhecimento de conduta semelhante e ampliou o monitoramento do fluxo de pacientes, dos plantões médicos e da rotina de trabalho da unidade, que mantiveram-se normais”, pontuou.

A entidade frisou, ainda, que “o diretor-presidente Sergio Costa reafirma que o Hospital Regional de Santa Maria (HRSM) está e sempre estará de portas abertas para atender a todos os que necessitem de atendimento médico-hospitalar”.

O Iges-DF finalizou ressaltando que “tem se esforçado diuturnamente para oferecer saúde de qualidade para a população do Distrito Federal” e que “investiu em infraestrutura, tecnologia, contratação de pessoal, aquisição de insumos e equipamentos, além de treinamento humanizado a fim de que colaboradores e pacientes contem com espaços adequados para trabalhar e receber atendimento”.

 

 

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