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Angústia: mãe tenta há 40 anos descobrir se bebê enterrado é seu filho

Alvonete de Souza Valentim vive com a incerteza se o corpo que enterrou há 40 anos é do próprio filho. O TJDFT condenou o DF a indenizá-la

atualizado

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Dia de Finados: flores simbolizam homenagem a entes queridos no Dia de Finados, em Goiânia, Goiás
1 de 1 Dia de Finados: flores simbolizam homenagem a entes queridos no Dia de Finados, em Goiânia, Goiás - Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

Uma mãe vive há 40 anos com a dúvida se o bebê que enterrou, em 1982, é mesmo o próprio filho. Em uma história que envolve desorganização de túmulos e exame de DNA frustrado, tudo indica que a angústia de Alvonete de Souza Valentim nunca chegará ao fim.

Alvonete deu à luz um menino em 11 de março de 1982, quando tinha apenas 13 anos, no Hospital Regional de Ceilândia (HRC), no Distrito Federal. O bebê de 7 meses nasceu morto.

Segundo o relato da mulher à Justiça, a unidade de saúde do Distrito Federal entregou o corpo 11 dias após o parto. As dúvidas começaram a surgir ali, quando os familiares desconfiaram que o corpo não era do filho de Alvonete, já que ele não aparentava ser recém-nascido, “muito menos um prematuro de 7 meses de gestação”.

Mesmo com a desconfiança, a família enterrou o corpo. Desde 1982, Alvonete visitava o túmulo que acreditava ser de seu filho, no Cemitério de Taguatinga, que virou Campo da Esperança a partir de 2002.

Aquele a quem Alvonete deu à luz em 1982 era seu único filho biológico, já que a mulher ficou estéril após o parto.

Trinta e um anos após o triste episódio, em 2013, Alvonete entrou na Justiça para fazer um exame de DNA e descobrir se aquele bebê que enterrou era, de fato, seu filho. Ela contou com apoio médico e de familiares.

A exumação foi determinada pela Justiça e o resultado veio em 2018. Mas a angústia de Alvonete só acresceu, já que a exumação foi realizada em um túmulo diferente do local que ela visitava havia 30 anos.

Segundo o processo que tramita no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), o Instituto de Medicina Legal (IML) apontou que não havia material genético em quantidade e qualidade suficiente para a realização do exame de DNA no corpo exumado.

O cenário se complicou ainda mais, já que, segundo a família, os restos mortais exumados tinham vestes de menina (um vestido de poá), e o bebê entregue à Alvonete foi enterrado com uma roupa de menino branca. Ou seja, tudo indicava que aquele corpo submetido ao exame de DNA não era do bebê que Alvonete enterrou em 1982.

Depois da primeira tentativa frustrada de identificação do filho, Alvonete pediu à Justiça que autorizasse a exumação de todos os corpos de crianças sepultados na época do enterro do suposto filho.

O pedido foi negado sob fundamento de que seria impossível de executar tal ação, já que, segundo a concessionária Campo da Esperança, responsável pelo cemitério desde 2002, a identificação física de grande parte dos túmulos era praticamente impossível de ser feita.

Alvonete alegou que a administração pública tirou dela “a única chance que tinha para dirimir a dúvida acerca do vínculo biológico havido entre ela e o natimorto sepultado”.

Condenação

Em 2021, a mãe entrou com um processo judicial em que pede indenização do Estado. A solicitação foi negada em 1ª instância, mas Alvonete recorreu e obteve decisão favorável esta semana, no julgamento em 2ª instância da 7ª Turma Cível.

Na última quarta-feira (8/2), a 7ª Turma Cível do Distrito Federal condenou o Distrito Federal a indenizar Alvonete em R$ 20 mil, por danos morais.

No julgamento, os magistrados entenderam, por maioria, que o DF é culpado de Alvonete nunca saber se o bebê enterrado é seu filho, já que a desorganização, à época, do Cemitério de Taguatinga impede a identificação do túmulo onde o corpo foi sepultado.

“Ou seja, o local onde estaria o corpo é, efetivamente, incerto. E tal incerteza decorreu, ao que tudo indica, da negligência do Distrito Federal quando este era o responsável pelo Cemitério de Taguatinga”, disse a desembargadora Gislene Pinheiro, durante leitura do voto.

A desembargadora Gislene Pinheiro disse que “a impossibilidade de cumprimento da obrigação judicial não se deu exclusivamente pela dificuldade de se conseguir material genético em quantidade e qualidade suficiente, mas também, e especialmente, pela imprecisão na localização dos jazigos”.

O desembargador Romeu Gonzaga Neiva disse que o caso é peculiar em vários aspectos, mas é recorrente a dificuldade da administração pública de prestar serviços, como é o caso da proteção dos jazigos dos cemitérios.

Durante o julgamento, o desembargador Getúlio de Moraes Oliveira disse que o Estado assume para si tarefas importantes e uma delas é a guarda permanente dos restos mortais dos que foram sepultados.

O único que votou contra a indenização foi o relator do processo, o desembargador Fabrício Bezerra. O magistrado argumentou que a exumação ocorreu no local indicado pela própria mãe, e que o exame de DNA não foi conclusivo por uma questão biológica.

O que dizem as partes

Em nota, a Procuradoria-Geral do DF (PGDF), que represente o DF nos processos judiciais, informou que ainda não foi intimado do acórdão.

A concessionária Campo da Esperança Serviços Ltda. disse que todas as informações sobre endereços de jazigos e sepultamentos realizados antes de 2002, ano do início da concessão, são de responsabilidade do GDF.

A empresa informou que não participa da ação judicial mencionada, pois o sepultamento e o registro do endereço do jazigo ocorreram muitos anos antes do início da concessão.

“A exumação foi realizada pela concessionária cumprindo decisão judicial, visto que é a responsável pelos serviços cemiteriais no DF”, assinalou.

A coluna não conseguiu contato com Alvonete nem com a defesa. O espaço permanece aberto para eventuais manifestações.

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