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Análise: ridículo políticos usarem seus cargos para obter vantagem pessoal. Só eles não veem

Metrópoles noticiou casos como o da distrital que usa Hilux pink locada por R$ 5 mil para ir à academia e do senador que empregou a namorada

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Se abordarmos aleatoriamente 10 pessoas na rua com a seguinte questão: o que você acha de deputado ir à academia em uma Hilux rosa pink (foto em destaque) paga com o dinheiro público? Qual é a chance de alguém considerar a atitude razoável? Praticamente zero. Muitos vão reparar e até rir da excentricidade da parlamentar — aspirante à consultora Mary Kay — de gosto duvidoso.

Mas o caso é de chorar. Repare: se é óbvio que a conduta da deputada é flagrantemente inapropriada, por que somente ela parece não enxergar? Refiro-me ao episódio recente narrado em primeira mão pelo Metrópoles sobre a distrital Jaqueline Silva (PTB), que alugou por R$ 5 mil ao mês uma Hilux paga com verba indenizatória. Por ser caminhonete de luxo, já chama atenção. Plotada de rosa, virou uma gritaria ambulante.

De volta à questão, como pode a parlamentar não calcular que esta atitude imatura lhe custará desgaste e antipatia de boa parte das pessoas, além, é claro, de a expor ao escrutínio de órgãos de controle?

A cegueira dela é também a de muitos outros homens e mulheres que ocupam cargos públicos, mas não sabem se comportar como agentes a serviço da comunidade. Enxergam, antes, a chance de aproveitar “a boquinha” e satisfazer desejos pessoais, melhorar as próprias condições de vida.

É o caso também revelado esta semana pelo Metrópoles do senador Marcos do Val (Cidadania-ES). Inconformado por ter sido pilhado em atitude embaraçosa ao empregar a namorada no próprio gabinete, levar a moça para dar um rolê nos EUA às custas do Senado e depois descolar para ela um aumento de salário indicando-a para novo cargo na estrutura do Senado, ele pediu apoio dos colegas contra a “mídia carniceira”. O Metrópoles, no caso.

Em que planeta deste mundão isso não soaria como piada? Como alguém que está sendo pego com a boca na botija tem tamanha cara de pau de subir à tribuna para pedir ajuda de seus pares para que se solidarizem com o malfeito? Marcos do Val teve. E o pior é que não houve uma só voz dentro do parlamento para chamar a atenção dele, como se fosse a coisa mais natural nas dependências públicas usar da prerrogativa do mandato para alcançar vantagem para si ou para os seus.

Sim, no nosso parlamento é absolutamente corriqueiro. Não fosse assim, talvez alguém tivesse se arvorado em cobrar explicações. Onde estava Reguffe (sem partido), que defende com vigor a moral e os bons costumes no exercício do mandato? Será que Leila Barros (PSB) concorda com esta conduta? E Izalci Lucas (PSDB) seria condescendente? Somente para citar o silêncio dos três senadores que compõem a bancada do DF, os quais conheço mais de perto a atuação.

Também nestes dias pretéritos, um movimento aparentemente inofensivo, mas simbólico, nos ajuda a compreender o que é difícil de lidar. Diretor da Terracap, um dos advogados que Ibaneis abrigou no organograma do GDF resolveu decorar seu gabinete com um quadro de Athos Bulcão. Mas, antes que usasse o dinheiro público para um capricho pessoal, ele foi desencorajado por questionamento do Ministério Público.

Ao responder aos promotores, o diretor Wesley Ricardo Bento explicou que seu posto na Terracap é novo, foi criado recentemente e, por isso, a estrutura é precária. Mas, é justamente aí que reside o problema. A diretoria dele não existia. Foi criada sob medida para acomodá-lo no governo.

Até a gestão passada, o mesmo serviço de consultoria jurídica era prestado sem estar vinculado à função de um diretor que recebe “50 paus” por mês, o mais alto salário na estrutura do GDF. Diante da possibilidade de ter problemas com o MP, o diretor desistiu de apresentar a fatura do quadro para os cofres públicos e resolveu ele mesmo bancar o objeto de decoração, no valor de R$ 2 mil.

E o distrital Reginaldo Sardinha (Avante), que teve a pachorra de promover um concurso cultural por ocasião do aniversário do Cruzeiro e ofereceu como prêmio um encontro com… ele mesmo? Não vou me alongar aqui. É despropositado e pronto. Lógico que denunciamos e claro que o MP abriu investigação.

Não vai ser um emprego para a namorada do senador, a Hilux rosa da distrital; ou o Athos Bulcão do diretor da Terracap que vão aumentar o rombo de um país quebrado na casa do trilhão. Mas estes comportamentos e a naturalidade com que a classe política lida com eles nos lembra todos os dias que ainda estamos muito longe de atingirmos maturidade republicana.

Integrante da Academia Brasileira de Letras, o historiador e cientista político José Murilo de Carvalho é um profundo conhecedor das circunstâncias em que o regime republicano foi implementado no Brasil. Em fala recente, ele diz que em nosso país “República, no sentido de valor, de preocupação com o bem público, de prestação de serviço, não existe. A gente conta na ponta dos dedos pessoas que têm este espírito republicano. A tradição do Brasil é patrimonial, clientelista”.

Dos doutos aos menos estudados, todos são capazes de perceber o exagero dos atos praticados por muitos daqueles que estão no poder. Menos eles próprios. É que o poder inebria, corrompe propósitos, desvia condutas. O cidadão segue vendo que a mamata, ao contrário do que se apregoou na campanha, está longe de acabar e a res publica (em latim, coisa pública) a léguas de distância de ser um conceito compreendido e respeitado por quem ocupa os espaços de poder.

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