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TT Catalão provocava o bom-mocismo. E inspirava, abria caminhos

O poeta/jornalista/pensador abria a ferida da civilização. Mas não parava aí: produzia, propunha, inventava e nos tirava do lugar

atualizado

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Agência Brasil
TT-Catalão
1 de 1 TT-Catalão - Foto: Agência Brasil

Uma tarde, me agachei a seu lado, e ele, sentado diante do computador, na ponta de uma bancada, disse com um sorriso triste (TT sorria fundo e triste):

— Não posso ficar sem escrever em jornal. Preciso conversar com a cidade.

Dias depois, ele teve de sair da redação. E aconteceu então uma coisa que nunca tinha visto antes e nem depois: houve uma manifestação na Rodoviária, organizada por um grupo de amigos, em protesto contra a demissão do TT. Com cartaz, palavras de ordem e tudo.

TT era afeto, antes de qualquer outra coisa. A saída do jornal parecia o fim do mundo. Era o começo de um novo mundo, de marcante e propositiva atuação no governo local e no Ministério da Cultura.

Tem gente que nasce velho e outras que nascem crianças. TT era dessa turma, dos que vêm ao mundo pela primeira vez todos os dias. Tinha a pele fina dos que acabaram de chegar à vida e se surpreendia, se indignava, se comovia, e escrevia, criava imagens, inventava mundos, agregava, enternecia e mostrava a ferida universal da humanidade — o tempo todo.

Numa véspera de Natal, há uns dez anos, tempos de bonança da economia. Havia no ar uma agitação de consumo tresloucado. Ouço, na fila do supermercado, um homem protestando:

— Que maluquice! Todo mundo parece que fica doido com o dinheiro, com o consumo.

Era o TT tentando mostrar a todos nós o ridículo de nossa condição de consumidores alucinados.

TT abria a ferida da civilização, mas não era um iconoclasta se divertindo, perversamente, com a própria percepção. TT produzia, propunha, inventava, saía do lugar e nos tirava do lugar.
Era jornalista, poeta, ator, artista gráfico, roqueiro, pensador, inventor. Foi gestor público, inspirou os pontos de cultura, participou de conselhos de cultura, dirigiu o Espaço Cultural Renato Russo num de seus períodos mais tremulantes. Trabalhou no governo local e no governo federal produzindo cultura para esse país inculto.

TT provocava o bom-mocismo, o bom pensamento, a hipocrisia travestida de bondade, nos deixava nus com nossa miséria humana. Num de seus últimos posts, ele publicou um Manual de Sobrevivência na República das Banalidades, espicaçando os que se fingem de mortos em tempos tão graves e que exigem de nós um mínimo de coragem: “não escreva nada q desagrade; não desafie o poder nem questione autoridade; AGRADE AGRADE até a grade q lhe desagrade;”

O covarde, dizia TT, “não atiça, não fede, nem cheira, opaco, não brilha ou incomoda, covarde é moda q se extingue enquanto arde… só fala, pensa, escreve, expressa e vê o q alimenta banalidades — ”

TT não deixava barato. Mas de tudo, de tudo, o que mais me encantava era o sorriso delicado, doce, de menino que se guardou do mal do mundo.

Quando TT completou 71 anos, dia 22 de novembro passado, a filha Nanan escreveu que o pai ensinou a todos com palavra, gesto, atitude: “A vida se dá a quem se doa”.

TT agora é um anjo, uma estrela, um cometa, uma inspiração, uma provocação para todos nós, os brasilienses e os candangos que tanto o amamos.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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