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A Esplanada exige demais das multidões. Não era pra ser assim

É uma das maiores avenidas do mundo. É monumental e não facilita a vida de ninguém. É um deserto sem árvores, sem sombras, sem descanso

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1 de 1 protesto educacao - Foto: Andre Borges/Especial para o Metrópoles

Sol das 11h de um começo de seca. Penduradas na plataforma superior da Rodoviária, observando a manifestação lá embaixo, a moça ao lado me pergunta: É difícil chegar lá, né?

— É. Você tem de descer duas escadas rolantes, atravessar toda a Rodoviária e o Eixo Monumental. Ou pode ir aqui reto, até o Touring, e descer a escada em caracol, mas não sei como andam as coisas por lá.

Em Brasília, até o protesto exige de nós um fôlego de habitante do deserto.

Na Esplanada dos Ministérios, somos todos náufragos no mar. Muito chão a vencer, nenhuma árvore para nos proteger. É um deserto urbano monumental.

Espaço cerimonial destinado às manifestações democráticas vindas de todo o país, a Esplanada não facilita o ir e vir urbano nem o exercício democrático das manifestações. A multidão aqui tem que ser muito mais multidão. O pedestre, muito mais pedestre.

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A via mais importante da capital do país tem 300 metros de largura (a Champs-Élysées tem 70 m e o Mall de Washington, 80 m). O Eixo Monumental já apareceu no Guinness Book como a avenida mais larga do mundo, considerando-se que ela seja uma avenida. Só o canteiro central tem 200 metros de largura.

São apenas 2 km entre a Rodoviária e a Praça dos Três Poderes. Parecem 10, dadas a extensão e a aridez. É bela, mas é cruel. Não seria assim se Lucio Costa tivesse aceito o projeto de paisagismo feito por Burle Marx. O paisagista moderno, das praças geométricas e da flora brasileira, pensou num canteiro central com espelhos-d’água e jardins com vegetação que representasse os biomas brasileiros – Cerrado, Mata Atlântica, Amazônia, Caatinga, Pampa, Pantanal. O arquiteto teve receio de que tanto mato tirasse o efeito de remanso monumental que se tem da Esplanada a partir da plataforma superior da Rodoviária.

A arquitetura comunista de Niemeyer, no Conjunto Cultural da República, dificulta ainda mais a vida urbana, que já não é fácil. Uma vastidão em concreto sem um pé de pau, com apenas duas fileiras de bancos também de concreto e um espelho-d’água desolado. É o que contorna a cúpula que o arquiteto repetiu em várias cidades brasileiras, Goiânia e São Paulo entre elas.

Estrutura pesadona (a crítica de arte Graça Ramos a compara a um mausoléu), foi inaugurada em 2006, mas inspirada nos anos 1950. Sorte de Niemeyer é que o brasiliense ama o Museu – o cuscuz, como dizem os nordestinos. Ama e inventa usos, como criança que gosta de brincar com caixa de papelão.

O professor Frederico de Holanda, da FAU/UnB, gosta de comparar a Esplanada à Avenida dos Mortos, em Teotihuacan, centro urbano pré-colombiano a 48 km da Cidade do México. Imensa, cerimoniosa, soberana. Um céu deitado na Terra, como a Esplanada dos Ministérios.

Nesse 15 de maio, a sede de viver e de saber de estudantes, professores, pesquisadores, cientistas ressuscitou a Esplanada (e muito mais que ela) mais uma vez. Como em tantas outras em seus 59 anos de existência. Surtos de vida que estremecem a via mais solene do Brasil. E nos fortalecem como brasileiros.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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