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A Avenida Central é uma distração em dias tão tristes

Situada no Núcleo Bandeirante, a via é o traço mais nítido da história da Cidade Livre, o primeiro aglomerado urbano de Brasília

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1 de 1 avenida central nucleo bandeirante - Foto: Conceição Freitas/Metrópoles

O alto-falante anuncia novidades e promoções nas caixas de som penduradas nos postes de luz. Não, não estamos em 1958. O ano é 2019; o dia, terça-feira passada. A Avenida Central, no Núcleo Bandeirante, é o traço mais nítido da história da Cidade Livre, o primeiro aglomerado urbano de Brasília. Três vias paralelas e uma via de contorno, na entrada sudoeste da nova capital.

O Bandeirante foi riscado no papel, às pressas, para dar um lugar ao comércio, hotéis, agências bancárias, bilheterias de vendas de passagem, restaurantes, bares, boates e bordéis.

Mais de 60 anos se passaram. A utopia para poucos continua para poucos. Mas a Avenida Central guarda um quê dos anos 1950, de crença de que hoje é bom e amanhã pode ser melhor. No alto-falante, nas casas antigas de comércio, nos esqueletos em néon de hotéis que não existem mais, no Mercadão, nas calçadas em pedra portuguesa (em muito melhor condição do que as da W3), nas portas art déco, na cálida agitação de um comércio de vizinhança.

É uma avenida que começa e termina num parque. Começa numa surpreendente área verde, bucólica, gregária, silenciosa. É o Parque Bandeirante. Tem piscina para adultos e piscina infantil, quadra de esportes, ponte romântica, churrasqueiras e muitas proibições, entre as quais “proibido uso de drogas ilícitas e narguilé. Proibido consumo de bebidas em garrafas de vidro. Homens somente com sunga; mulheres, maiô ou biquíni”.

Fica na Avenida Central uma das maiores, senão a maior, lojas de bugigangas do quadradinho. Nem no Taguacenter vi tão grande. Ocupa o espaço de dois salões de tamanho parecido com as lojas da W3 Sul. São milhares de itens, de chaveiro com espelho a bastidor para bordado. O moço do caixa me disse que a regra para compra de produtos é a seguinte: “Se o freguês procurou e não tem, vamos atrás. Nem que seja só pra ele”. Vinte e cinco anos, seguindo essa pauta, deu no que deu.

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A Avenida Central é uma W3 rediviva. Vai num aclive desde o Parque Bandeirante até um jardim de palmeiras imperiais já chegando na Divinéia, bairro que existe desde os tempos da Cidade Livre. Tem um canteiro central que entremeia árvores adultas, estacionamento e quiosques que fervem à noite e nos fins de semana.

Subir e descer a Avenida Central é uma viagem no tempo. Dos anos 1950, o alto-falante me leva para a minha adolescência. Terry Winter entoa Summer Holiday (“On a summer day, on a summer day, I met you, summer holliday, summer holliday, one of few. Al my life, I wondered aal lonely. You were so dumb just like me, for when we met it was only. Meant to be just for me, just for me, uh, uh, uh,uh”).

O homenzinho vende dindim de bacuri; o outro, quebra-queixo. O orelhão tem fila; o antiquário virou brechó, a Casa Capital expõe quatro modelos diferentes de máquina de moer carne; a moça do caixa do supermercado chama a colega de “baitola”. Há mais de meia dúzia de lojas para caubóis, boiadeiros e caipiras em geral, botinas, chapéus, arreios, selas.

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Mais adiante, no sentido sudoeste, a Avenida Central vai se transformando numa plácida quadra mista, meio residencial, meio institucional. A delegacia de polícia do Bandeirante fica numa esquina, do outro lado o Colégio La Salle (que está em Brasília desde os anos 1950) e um coreto de construção mais recente.

O Mercadão surge com sua fachada amarelo-mostarda. É o Nordeste-candango resistindo à assepsia dos shoppings e dos mercadinhos gourmet. Não vi em nenhuma outra feira tanta variedade de farinha. O Mercadão merece uma crônica só pra ele.

A Avenida Central é uma distração em dias tão tristes.

* Este texto representa as opiniões e ideias do autor.

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