Talento escondido, artista Jacobus van Wilpe ganha exposição no Paraná
As obras do pintor ficaram longe dos holofotes, mas coube à Adriana Rodrigues Suarez revelar o artista e mostrar o incrível trabalho dele
atualizado
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O Brasil tem muitos talentos escondidos e que merecem ser reconhecidos. O lema vale para Jacobus van Wilpe, holandês que viveu grande parte da vida em solo tupiniquim, mais precisamente na cidade paranaense de Ponta Grossa. Ele morreu em 1986. Até então, as obras do pintor ficaram longe dos holofotes, mas coube à Adriana Rodrigues Suarez, professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), revelar o artista e mostrar o incrível trabalho dele na exposição O pintor dos Campos Gerais.
O nome traz a região dos Campos Gerais, que envolve Ponta Grossa e locais próximos, devido Van Wilpe ter representado características dos lugares nas obras. Curadora da exposição, Adriana define a mostra como o “resgate da arte do artista”.
“Ele ficou escondido, esquecido. Teve uma participação forte no contexto do Movimento Paranista, aqui no Paraná, que buscou retratar as simbologias do estado”, comenta.
“A minha obrigação dentro desse contexto de processo de curadoria é apresentar esse artista que até então estava escondido, sendo que pertenceu ao movimento do Paraná enquanto arte”, defende a professora em entrevista à Coluna Claudia Meireles. Ao conhecer a história do pintor, Adriana se viu na missão de trazer as obras dele às claras e fazê-lo ter o merecido reconhecimento. A exposição fica aberta ao público até 13 de outubro na Galeria de Arte da Universidade de Ponta Grossa.
Parece coincidência, mas Adriana é professora na mesma instituição de ensino superior em que o neto de Van Wilpe leciona, a Universidade Estadual de Ponta Grossa. Enquanto ela integra o corpo docente da Divisão de Cultura, Renato van Wilpe Bach faz parte do Departamento de Medicina. À procura de mergulhar na trajetória artística do pintor, a curadora marcou um horário com o médico a fim de “conhecer o acervo e a história”.
O primeiro encontro durou mais de três horas. “Eu fiquei escutando e junto a essa conversa, o professor Renato me provou tudo com fotos, documentos, escritos e obras de Jacobus. Ele fez um panorama de grandes riquezas”, recorda a curadora.
Ela acrescenta: “Enquanto ele contava as histórias, tinha a impressão de que estava vivendo naquele contexto”. A família do artista migrou da Holanda para o Brasil na década de 1920.
Na época em que morou no município de Castro, Van Wilpe ficou conhecido por pintar cartazes para o cinema e aos circos de passagem. Ele trocava as artes por ingressos. Aluno de Frederico Lange de Morretes, em Curitiba, o artista mostrou alguns trabalhos na Primeira Exposição da Sociedade Amigos de Andersen, em 1942. A mostra contou com obras de Kurt Boiger, Curt Freyesleben, Estanislau Traple, Artur Nisio e Augusto Conte.
Em 1962, o quadro Acácia Mimosa recebeu menção honrosa no Salão Primavera do Club Concórdia. Professora de pintura e cofundador da Escola de Música e Belas Artes do Paraná, Curt Freyesleben descreveu a obra como a mais perfeita representação da pequena flor, considerada impossível de pintar. Ao longo da vida, o artista holandês nunca realizou uma exposição individual. Ele defendia a máxima: “Quem não quer vender, não deve expor”.
Adriana escutou todos os detalhes da trajetória de Jacobus van Wilpe ditos por Renato na reunião. Ao término, ela confessa ter saído da casa do médico angustiada e ansiosa. “Como eu iria pensar e organizar tudo? Foram muitas informações e, a partir da curadoria, precisava contar a história desse artista por meio das obras, escritos, desenhos e biografia. É muito mais do que simplesmente uma história da pintura de Jacobus”, enfatiza.
Diante da extensa quantidade de conteúdo, Adriana Rodrigues Suarez propôs fazer uma curadoria dupla com Renato. “Seria impossível! Até brinquei com o professor que daria de três a cinco exposições diante da quantidade de material que me apresentou”, esclarece. O médico reúne, guarda e cuida, com cautela, das obras do avô há 20 anos. “Ele tem uma fascinação por esse avô, enquanto pessoa, artista e profissional”, elogia a curadora.
“Quando estava prestes a sair da casa do professor Renato, ele disse assim: ‘Tem dois assuntos que preciso comentar. Primeiro, nunca ninguém me escutou falar do artista Jacobus como fez. Nós ficamos aqui três horas e você ficou me escutando, questionando, nunca ninguém fez isso. Segundo, quero agradecer pela atenção dada à história do meu avô ou para a história da arte do meu avô”, rememora a curadora.
Com a curadoria dupla, Renato van Wilpe Bach elencou obras do avô que deveriam ser expostas. Em seguida, Adriana entrou em cena e requisitou ao médico que apontasse quais trabalhos do artista não poderiam ficar de fora da mostra. “Feito esse primeiro momento da relação de escolhas, do sentimental do neto às obras de Jacobus, eu fiz uma segunda seleção com os meus bolsistas e acadêmicos de licenciatura de artes visuais”, lembra.
O processo de montagem se deu da seguinte forma, conforme conta a professora da UEPG: “Nós pegamos todas as obras eleitas pelo professor Renato e, juntos, começamos a estrutura espacial da galeria. Como apresentaríamos as pinturas, os desenhos e a história. A nossa obrigação, no caso, o objetivo principal da exposição era trazer o Jacobus como um artista ponta-grossense, que se torne conhecido por nós, e um artista paranaense que integrou os grandes nomes do circuito de arte da nossa região”.
Em entrevista à Coluna Claudia Meireles, Adriana contou que Jacobus van Wilpe trouxe nas obras símbolos que continuam a representar o Paraná, razão para ter pintado araucárias, pinhões, gralhas-azul e os Campos Gerais. “Nós temos muita natureza e campos, rios e cachoeiras. Ele buscou retratar isso na sua pintura”, explica. Na avaliação da curadora, os brasileiros, em especial os paranaenses, têm a obrigação de conhecer o artista.
Em uma breve apresentação a respeito de Van Wilpe divulgada na mostra, há a seguinte frase: “Sua obra permanece pouco conhecida pelas novas gerações”. Com o propósito de mudar a perspectiva da expressão, Adriana, Renato e colaboradores desenvolveram a exposição. “O nosso maior objetivo é transmitir ao público a representatividade que esse artista tem para a nossa cidade e ao nosso Paraná”, atesta a professora e curadora.
Prevista para ficar aberta até 13 de outubro, a exposição teve o lançamento oficial no último dia 26. Na ocasião, Renato van Wilpe se emocionou ao discursar sobre o avô. O médico não havia visto a mostra finalizada e se surpreendeu com a montagem. Ao presenciar a exposição, ele não conteve as lágrimas. Escolas visitam o ambiente e monitorias são feitas no local. “Vamos movimentar a fim de que a exposição receba bastante pessoas e a história de Jacobus passe a ser conhecida”, espera.
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