“Estou sempre um pouco subversiva”, diz a designer Jacqueline Terpins
A artista plástica esteve em Brasília para um bate-papo sobre os 20 anos de carreira, na Quadra Interior
atualizado
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A artista plástica e designer Jacqueline Terpins é uma das maiores referências brasileiras quando o assunto é vidro soprado. Ela esteve em Brasília, na última semana, a convite da designer e empresária Denise Zuba para um bate-papo sobre os seus 20 anos de carreira. A conversa movimentou a loja Quadra Interior, no Lago Sul.
Arquitetos e artistas locais marcaram presença no evento. Eles conheceram um pouco mais da artista e dos processos de criação de suas peças atemporais em vidro e mobiliários de madeira, verdadeiras obras de arte.
Jacqueline é apaixonada por olhar ao redor, buscar novas matérias e explorá-las. “Quando eu digo explorar, é olhar para fora, não para o trabalho do outro”, ressalta. Ela desafia os materiais usados com técnicas que flertam com o movimento orgânico da natureza, uma de suas maiores fontes de inspiração.
Quando viaja, a artista procura por lugares onde a natureza está presente em toda a sua plenitude, como acontece no Deserto do Atacama (no Chile), no México, na Turquia, nas grandes geleiras ou nas Torres Del Paine, na Patagônia. “Eu vou atrás de coisas que me tocam”, completa.
Formada em comunicação visual pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jacqueline buscou novas técnicas de vidro soprado com especialistas da Penland School of Art and Craft e na Pilchuck Glass School – ambas nos Estados Unidos – e estudou desenho na Byan Shaw of Art, na Inglaterra.
Antes do talk, Jacqueline conversou com o Metrópoles sobre carreira, técnica, inspiração, Oscar Niemeyer e o mercado do design. Confira!
Como surgiu o seu gosto pelo design?
Cursar a Escola de Belas Artes foi uma opção profissionalizante, olhando para o futuro, mas eu sempre fui muito focada em arte. Então, além da escola, fiz curso no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM), que tinha Lygia Pape, Ivan Serpa e Frederico Morais. Era uma época maravilhosa, de grandes artistas.
Por meio do Ivan Serpa, por incrível que pareça, já no centro de pesquisa e arte dele, entrei em contato com o vidro. Era o cristal soprado. Dali em diante, fui em busca do cristal. O pensamento sobre esse convívio, a criação com estética e a funcionalidade me atraiu para o design, mas foi um caminho, e eu sempre retorno para a arte.
Você se identifica mais como artista plástica ou designer?
Artista plástica, sem dúvida nenhuma. Eu não posso esquecer da função, mas estou sempre em busca da forma. É um desafio a mais no meu trabalho. Eu procuro a interação da peça com o ser humano, tanto objeto, que seja tátil, quanto a forma, que seja ergométrica, agradável aos olhos e ao corpo. Eu não consigo olhar isso como design.
Quais artistas plásticos são a sua fonte de inspiração?
Antes de mais nada, eu não posso deixar de falar do Ivan Serpa, pintor e meu grande mestre, quem me ensinou a olhar. E o escultor Richard Serra, autor de grandes obras como a Torqued Ellipses, elipses imensas, de uma grandiosidade palaciana, e torcidas levemente. Você entra nelas por um corredor e lá dentro sente que o seu espaço muda a cada dois metros. É maravilhoso.
Oscar Niemeyer te influenciou em algum momento da sua carreira?
Sim, mas não como uma “veia direta”. De jeito nenhum olhando para o trabalho dele para me inspirar e fazer o meu. Bem mais como uma pessoa que trabalha com cimento armado de uma forma dinâmica, como ele trabalhou, e aproximando o sujeito da matéria. É o que ele fez divinamente e o que eu procuro fazer.
A mesa Fio (de Jacqueline) tem três pés, com uma estabilidade absolutamente perfeita, mas que pousa com leveza, como um gafanhoto. O Niemeyer fazia isso, ele pousava um prédio inteiro com elegância, em pontos sem nenhum excesso. Quando menos, melhor.
O Lúcio Costa também me influenciou. Não só os trabalhos da construção de Brasília, mas os textos dele. São lindos.
Nesses 20 anos de carreira, tem alguma peça que seja a sua preferida?
É super difícil apontar apenas uma, mas têm peças que sobrevivem, que eu fiz há muitos anos e permanecem. Essas me tocam profundamente porque elas continuam “falando” hoje.
A mesa Besame Mucho é de 1992 e é super contemporânea. Ver que ela percorre e continua contemporânea me toca.
Como é o seu processo criativo?
Eu começo uma peça de forma livre. É um processo mão na massa: ou eu desenho o mobiliário e parto para protótipos pequenininhos, ou com argila. É um material que eu sempre trabalhei, não com o intuito de fazer delas cerâmicas, e sim como um veículo de expressão mais livre, no qual eu consiga até errar. É pelo erro que se dá novos passos.
Em algum momento você precisou se adequar às tendências do mercado do design?
Nem morta! Para isso eu sou independente, sempre fui e serei. Não tem acordo.
Onde as suas peças são produzidas?
Cada linha de pensamento e matéria-prima que eu uso tem uma origem. O cristal soprado eu faço com os vidreiros de uma fábrica de Poços de Caldas (Minas Gerais). A madeira, com duas fábricas, no Sul e em São Paulo.
Vidro ou madeira?
O que me interessa é a matéria, para mim, é um conceito de trabalho. Eu acho o cristal escandescente absolutamente fascinante, é como uma lava que flui e é viva. Ele só para quando enrijece. Eu tento prender exatamente o momento dele enquanto livre pelo calor da altíssima temperatura (fundido a 1.400ºC). Esse ano, trabalhei com uma tonelada de gelo, esses excessos e extremos me interessam. A matéria me interessa.
A madeira também é orgânica. Ela nasce de uma árvore e hoje conseguimos trabalhá-la com lâminas fininhas. Eu procuro fazer com que esses objetos que a gente convive se adaptem a nós, sendo mais confortáveis e mais abraçadores.
Veja quem passou pelo bate-papo:
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