Designer de comportamento ensina a obter grandes mudanças com micro-hábitos
O cientista ficou conhecido por desenvolver métodos inovadores para mudar o comportamento humano. As técnicas foram batizadas de Tiny Habits
atualizado
Compartilhar notícia
“Você acorda, coloca os pés no chão e diz: ‘Vai ser um grande dia’”, recomenda BJ Fogg, cientista comportamental norte-americano. Para o autointitulado designer comportamental, o processo descrito leva dois segundos, mas o efeito ao praticá-lo perdura ao longo da vida. Pode parecer brincadeira que uma pequena ação após as horas de sono tenha tamanha eficácia. O especialista comprova o poder dos pequenos hábitos com as pesquisas feitas no Behavior Design Lab, fixado na Universidade de Stanford, nos EUA.
Fogg não só fundou o laboratório, como também dirige o centro de estudos há mais de 20 anos. Eleito pela revista Fortune como “um dos 10 novos gurus que você deve conhecer”, o cientista ficou conhecido por desenvolver métodos inovadores para mudar o comportamento humano. As táticas foram batizadas pelo criador de Tiny Habits (hábitos minúsculos, em tradução do inglês). Para o especialista, pequenas mudanças comportamentais são mais fáceis de serem implementadas e mantidas, em comparação com grandes transformações.
Livro
Já ouviu a máxima de que “são necessários 21 dias para criar um hábito”? BJ Fogg desconstrói a teoria no livro Micro-Hábitos: Pequenas Mudanças que Mudam Tudo, lançado no Brasil em março de 2020. Na descrição do best-seller do New York Times, aparece o seguinte texto: “Deixe para trás a fadiga. Livre-se da culpa a todo momento. Melhorar sua vida é muito mais fácil do que você imagina. A chave para a mudança de comportamento é o oposto do que sempre foi dito. Não é sobre força de vontade, e sim colocar o foco no que é fácil de mudar”.
Refletindo
“Encontrar o minúsculo comportamento certo ajuda a derrotar a autossabotagem gigante”, disse BJ Fogg em uma palestra no TEDx Talks em 2014. No início do ano, é comum as pessoas definirem metas a serem cumpridas nos próximos 12 meses. De acordo com um estudo da Universidade de Scranton, nos EUA, somente 8% dos planejadores de plantão conseguem ter sucesso com as resoluções. O levantamento mostrou que a maioria dos objetivos não são novos, pois estamparam uma lista quase idêntica do ano anterior.
Alguns dos leitores podem se identificar e quem sabe pertencer ao grupo das pessoas que costuma abandonar um novo hábito já em fevereiro. A desistência chega aos 88%, conforme revelou o estudo. Lembrando que as promessas foram estipuladas entre dezembro e janeiro. Aos interessados em parar de boicotar os próprios propósitos, Fogg tem muito a ensinar com os Tiny Habits. Ele orienta examinar as metas e “dividi-las em alvos pequenos e alcançáveis”, a fim de cumpri-los a cada dia.
No automático
Com um banco de dados com milhões de pesquisas, BJ Fogg sabe o que funciona quando o assunto é comportamento humano. O PhD reconhece que mudar não consiste em um processo fácil para as pessoas, seja com o intuito de criar bons hábitos, seja para se livrar dos maus. A própria transformação não ocorre em um estalar de dedos e os adeptos dos Tiny Habits sabem bem. Conduzidos pelas lições do cientista, os aprendizes compreendem a receita de que se deve vencer uma etapa antes de iniciar a próxima.
Com o sentimento de realização despertado ao passar da primeira fase, a pessoa continua a repetir tal comportamento. Ao ser feita com frequência, a ação acaba acontecendo no automático e daí “nasce” um hábito, explicou o especialista no podcast Making Positive Psychologhy Work, de Michelle McQuaid. “O que faz um comportamento tornar-se automático, ou seja, um hábito? A resposta para a pergunta é que as emoções criam hábitos”, disse Fogg na palestra TEDx Talks.
Na prática
Segundo o guru, ao colocar em uma balança a simplicidade e a motivação para impulsionar uma mudança de comportamento, o primeiro coeficiente tem maior poder, por não remeter a obstáculos. Fogg revelou que seu hábito preferido é acordar, pisar no chão e dizer: “Vai ser um grande dia”. Ele compartilhou o exercício matinal (batizado de hábito de Maui) com um aprendiz, que lhe enviou um feedback via e-mail. No texto, o homem desempregado e pai solteiro de três filhos contou sobre os efeitos de colocar em prática o hábito logo pela manhã.
Dias depois, o seguidor de Fogg continuou a fazer o hábito de Maui e, ao ser contagiado pelo otimismo, começou a praticar sete minutos de atividade física antes dos filhos acordarem, às 6h30. “Quando as crianças levantavam, ele já estava pronto para ajudá-los. Este pequeno comportamento trouxe-lhe resultados positivos”, garantiu o autor. De acordo com o cientista, as pessoas precisam de resiliência, estratégias de como desacelerar e “olhar o horizonte” a fim de dar passos certeiros em direção aos objetivos.
Sem culpa
Em um ritmo de vida mais lento, a pessoa se permite ver os frutos do próprio esforço funcionando como um bônus, esclareceu. Na avaliação de Fogg, os indivíduos estão sobrecarregados com tantos afazeres que não se dão os devidos créditos ao conquistarem uma meta. Por meio dos Tiny Habits, ele mostra que criar um hábito fica mais difícil quando não há um reconhecimento de si próprio por fazer a “engrenagem rolar”. Outro minúsculo comportamento a ser trabalhado é celebrar cada lição aprendida e os pequenos sucessos.
Ao tornar as resoluções alcançáveis, o cientista também aconselha a não encucar com as falhas. “Pare de se repreender por errar ou não estar motivado o suficiente”, reforçou no podcast. Quem passa a praticar os “hábitos minúsculos”, Fogg instrui a ser generoso com si mesmo. Conforme explica o escritor, quando um indivíduo sente-se incapaz por não conseguir fazer determinado exercício diário, ele se julga como culpado.
O especialista sugere que a pessoa adapte a atividade. No caso, cada um deve encontrar a melhor forma de como fazer o hábito funcionar. Até descobrir o “seu jeito”, deve-se valer de duas habilidades: a iteração (ou seja, repetição) e a mentalidade. Fogg ensina que o indivíduo pode não prosperar nas primeiras tentativas e faz parte do processo. Como cada passo é importante, deve-se avaliar os desafios, ajustar o plano e tentar novamente até conseguir. Por vezes, algo analisado como revés tende a ser uma força edificante.
Treinando de gênios
“Eu ensino bem como o comportamento funciona, para que eles possam criar produtos e serviços que beneficiem pessoas comuns em todo o mundo”, escreveu Fogg em seu site homônimo. O lema é seguido à risca pelo cofundador do Instagram, o brasileiro Mike Krieger. Ele foi aluno do “designer do comportamento” na Universidade de Stanford, em 2006. A disciplina ministrada pelo cientista era tecnologia persuasiva. Na aula, o professor pediu aos aprendizes para criarem aplicativos em um trabalho de classe.
Krieger desenvolveu uma plataforma que incentivava os usuários a enviarem fotos felizes para amigos que moravam em lugares onde o tempo não era agradável. O compartilhamento de imagens seria via telefone. À época, o uso em massa dos smartphones sequer passava pela mente. O jovem nomeou o aplicativo de Send the Sunshine (Envie a luz do sol, em tradução do inglês). Mais tarde, ele aperfeiçoou a “invenção” com o Kevin Systrom. Juntos, lançaram a rede social Instagram.
Visionário digital
Por meio de pesquisas, o criador dos Tiny Habits verificou que um comportamento só acontece quando a motivação, habilidade e gatilho surgem ao mesmo tempo, metodologia utilizada no marketing digital. Em 2002, BJ Fogg publicou o livro Tecnologia Persuasiva, no qual lançou a ideia de que os computadores podiam ser projetados para influenciar atitudes e comportamentos. À época, o título e ideias foram ignorados. Anos se passaram e o reconhecimento veio. Atualmente, o cientista divide-se entre a indústria da inovação e o laboratório em Stanford.
Em 2018, a revista Wired publicou uma matéria em que trazia a seguinte frase: “O laboratório de Fogg criou a fórmula para tornar a tecnologia viciante”. Segundo a publicação, o Behavior Design Lab virou “um pedágio para empreendedores e designers de produto a caminho do Facebook e do Google”. Também pegaram o passaporte com o cientista comportamental, Nir Eyal, autor do best-seller Hooked (Engajado), e Ed Baker, ex-vice-presidente de produto e crescimento da Uber que, antes disso, era chefe de crescimento internacional do Facebook.
Para saber mais, siga o perfil da coluna no Instagram.