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Descubra qual é a filosofia aplicada por líderes para superar o caos

Aprenda sobre estoicismo, filosofia que ensina a manter o equilíbrio emocional diante de tempos difíceis, como o da pandemia de coronavírus

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Stock Montage/Andrew Chin/ Getty Images
Marco Aurélio, Theodore Roosevelt e Bill Clinton
1 de 1 Marco Aurélio, Theodore Roosevelt e Bill Clinton - Foto: Stock Montage/Andrew Chin/ Getty Images

Imagine fechar os olhos e se deparar com uma receita para sobreviver ao caos com equilíbrio mental. A prescrição parece inexistente. Diante da pandemia do novo coronavírus e dos obstáculos decorrentes, encontrar uma fórmula viável para suportar a realidade e o futuro incerto surge como luz no fim do túnel. Há quem não acredite que exista tal método, mas algumas pessoas remediam o presente com uma boa dose de estoicismo.

Em um mundo regido por rentabilidade, vaidade, tecnologia e, recentemente, pelo medo da Covid-19, as preocupações com o que acontece só aumentam, principalmente devido à situação atual, que nos dá a sensação de não estar sob controle. Em meio a apreensão sobre o agora, a frase “o vírus invisível pode estar em qualquer lugar” tornou-se um mantra.

Aos estoicos, o cenário descrito remete ao período de prisão, por impedir viver a vida como deve ser vivida, com satisfação. Tendo como “pai” Zenão de Cítio, a filosofia milenar, fundada por volta de 300 a.C., é atemporal e dispõe de respostas aplicáveis ao atual momento. Centrada em quatro virtudes (coragem, justiça, sabedoria e autocontrole), a escola tem muito a ensinar. Os princípios a serem adotados ficam evidentes ao longo da trajetória do estoicismo.

Na história

Um dos maiores expoentes desse conjunto de valores foi o imperador Marco Aurélio, por volta do século 2 d.C. Aos 11 anos, o soberano conheceu a filosofia estoica e fez dela um hábito diário. Para historiadores, o monarca ter seguido os ensinamentos foi fundamental para que comandasse por mais de 20 anos o exército e administrasse Roma até a morte.

O governo do soberano ficou marcado por guerras prolongadas e dificuldades internas, como conspirações e uma peste, que dizimaram várias pessoas. Diante de tantos problemas, o general mantinha-se controlado emocionalmente, pois compreendia que não podia lutar contra algo fora do próprio domínio.

Marco Aurélio Imperador
Estátua equestre de Marco Aurélio, expoente do estoicismo

Em vez do desespero, Marco Aurélio procurava descansar das batalhas e aproveitava para escrever em seu diário que, mais tarde, virou o clássico livro Meditações: “Se você está sofrendo com alguma coisa externa, não é isso que a perturba, mas seu próprio julgamento. E está ao seu alcance acabar com esse julgamento agora”, registrou Marco Aurélio no livro.

O imperador inspirou-se em outro grande nome do estoicismo: Epiteto. Ex-escravo, o filósofo grego deixou publicações em que ensina a minimizar o que está fora do controle para conseguir viver uma boa vida. “Se devo morrer, morrerei quando chegar a hora. Como, ao que me parece, ainda não é a hora, vou comer porque estou com fome”, escreveu Epiteto.

“Não espere que o mundo seja como você deseja, mas sim como ele realmente é. Dessa forma, você terá uma vida tranquila”, ressaltou o pensador em outro registro. Por propagar manter a calma em meio à turbulência, o estoicismo é conhecido como a filosofia da serenidade.

Piloto da marinha norte-americana, James Stockdale passou sete anos em um cativeiro vietnamita como prisioneiro de guerra. Ele conta o que passou no livro Stockdale on Stoicism. Tendo Epiteto como referência, James revelou que a escola filosófica o ajudou a resistir aos sofrimentos vividos durante o período. Ele ficou com as pernas acorrentadas e os olhos vendados por meses.

“Ele [Epiteto] me ensinou que sou totalmente responsável por tudo o que faço e digo. Sou quem decide e controla minha própria destruição e minha própria libertação”, salientou James.

Filósofo
Epiteto era um ex-escravo e tornou-se um grande nome do estoicismo

Outro importante nome a contribuir com a escola de virtudes foi o filósofo, orador, poeta e político Sêneca. Ele foi uma figura essencial da política em Roma, senador com Calígula e conselheiro do imperador Nero. Em um exercício estoico, o pensador aconselhava os aprendizes a imaginar o pior desfecho para uma determinada situação.

Se algumas pessoas mentalizam a morte, Sêneca instruía a habilidade de blindar-se contra o infortúnio: “A maioria dos homens míngua e flui em miséria entre o medo da morte e as dificuldades da vida. Eles não estão dispostos a viver, e ainda não sabem como morrer. Por essa razão, torne a vida como um todo agradável para si mesmo, banindo todas as preocupações”.

Filósofo Sêneca
Sêneca aconselhava os aprendizes a imaginar o pior desfecho para uma determinada situação
Pandemia

No momento atual, qual seria o pior resultado possível para mim? O estoicismo estimula o questionamento e recomenda: “Abstenha-se e aceite [o que a natureza oferece]”, lema estoico do fundador Zenão de Cítio. Diante da pandemia, o conselho dos intelectuais seria cultivar o espírito, porque as adversidades não faltarão nem podem ser controladas no que está por vir no “novo normal”.

Professora da Escola Nova Acrópole, Lúcia Helena Galvão conversou com a coluna Claudia Meireles sobre estoicismo e como esses valores podem ajudar as pessoas neste período de pandemia. “Os estoicos ensinam a assumir a responsabilidade por aquilo que nos acontece, sabendo que vivemos aquilo que necessitamos para crescer como indivíduos e coletividade”, destaca.

Lúcia Helena Galvão
Filósofa Lúcia Helena Galvão conversou com a coluna Claudia Meireles. Ela ensina e vive os princípios estoicos

Sob os conhecimentos de Epiteto, a filósofa afirma que a “prisão” consiste na luta contra acontecimentos que independem “de nós” e, no que se pode atuar, não fazer absolutamente nada. “A felicidade é um verbo. E o desempenho é contínuo, dinâmico e permanente de atos de valor. Nossa vida é construída a cada momento, e tem utilidade para nós e para as pessoas que tocamos”, diz uma das máximas de Epiteto que regem a vida de Lúcia Helena.

Aplicação pessoal

A filosofia estoica não é colocada em prática do dia para a noite. É vivenciada. De acordo com Epiteto, a ideia é tentar lembrar por 30 dias seguidos e dar início à corrente quando puder, sem quebrá-la. Na avaliação dos filósofos, a repetição dos princípios é chave para internalizar os conhecimentos e transformá-los em hábito.

Os aprendizados de Marco Aurélio, Epiteto e Sêneca inspiraram as ações de personalidades, políticos e esportistas. O ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton lê as meditações do imperador romano mensalmente. Primeiro mandatário dos EUA, George Washington foi influenciado pelo estoicismo, seguindo a mesma tendência de Theodore Roosevelt.

Bill Clinton
Bill Clinton é um adepto da escola filosófica

Adepto da filosofia, Roosevelt atuou como 26º governante dos Estados Unidos. Para liderar a maior potência mundial, ele levou para dentro da Casa Branca os ensinamentos de Epiteto e Marco Aurélio, que inclusive contribuíram durante sua expedição pelo Brasil. Na ocasião, o presidente queria descobrir se o Rio da Dúvida era ou não afluente do Rio Amazonas.

No quesito esportes, o estoicismo foi a arma secreta para o time de futebol americano New England Patriots vencer tantos Super Bowls. Membro da equipe, Mike Lombardi disse em entrevista que o livro O obstáculo é o caminho: A arte de transformar provações em triunfo, de Ryan Holiday, foi um verdadeiro sucesso entre os jogadores. Novo nome do Tampa Bay Buccaneers, o quarterback Tom Brady segue a filosofia de vida.

Theodore Roosevelt
No mandato e nas ações rotineiras, Roosevelt aplicava os princípios estoicos

Conhecida pela personagem Beca Mitchell no filme A escolha perfeita, a atriz e cantora Anna Kendrick revelou que as meditações de Marco Aurélio são reconfortantes e calmantes. A obra também é a queridinha de Brie Larson, intérprete de Capitã Marvel. CEO da Condé Nast, Jonathan Newhouse para onde vai leva publicações com conteúdos sobre estoicismo.

Exercícios

Segundo os estoicos, o efeito de incorporar a receita para lidar com o caos na rotina é encontrar alegria nos deveres diários e responder com mais resiliência aos problemas e desafios que surgirem, rumo ao estilo de vida incrivelmente satisfatório. De olho na “receita” dos pensadores? Confira abaixo alguns ensinamentos dos maiores intelectuais da escola filosófica.

Princípio 1: você não pode mudar as situações fora de seu controle, mas pode mudar sua atitude. Caso fique frustrado com as ocasiões externas, desperdiçará energia e promoverá emoções negativas. Ao interiorizar essa percepção, a mente pode tornar-se impenetrável.

“Você tem poder sobre sua mente – não eventos externos. Perceba isso, e você encontrará força”, escreveu Marco Aurélio no livro Meditações.

Princípio 2: não seja vítima da natureza materialista da sociedade moderna. Tente se esforçar para querer menos, o desejo diminuirá e você ficará mais satisfeito com o que tem.

“A riqueza não consiste em ter grandes bens, mas em ter poucos desejos”, garantiu Epiteto.

Brie Larson
A capitã Marvel tem o livro Meditações, de Marco Aurélio, como livro favorito

Princípio 3: imagine a vida sem as pessoas e posses que você precisa. Talvez, assim, começará a apreciá-las verdadeiramente e, consequentemente, encontrará a felicidade. Uma prática estoica é imaginar que perdeu bens valiosos. Ao imaginar o cenário, passará a dar valor ao que tem. Caso chegue a ficar sem, de fato, lembrará de que tudo é emprestado do universo.

“Não se entregue aos sonhos de ter o que não tem, mas reconheça o chefe das bênçãos que você possui e, depois, lembre-se com gratidão de como você as desejaria se elas não fossem suas”, reforçou Marco Aurélio em Meditações.

Princípio 4: seja genuinamente alegre em todas as suas intenções. Como a felicidade vem de dentro, proporcionar bondade ao mundo, ajudar as pessoas e promover a sociedade podem gerar a verdadeira realização interior.

“Um homem assim fundamentado deve, quer queira ou não, necessariamente ser acompanhado por alegria constante, uma alegria profunda e que brota do fundo, pois encontra deleite em seus próprios recursos e não deseja alegrias maiores que suas alegrias interiores”, enfatizou Sêneca.

Tom Brady
O estoicismo é segredo do time New England Patriots e do quarterback Tom Brady

Princípio 5: praticar seus valores é melhor do que pregá-los. Toda decisão tomada ao longo de um dia possui uma dimensão moral. Vale procurar fazer escolhas com base nos valores pessoais para aumentar o bem maior.

“Não explique sua filosofia. Incorpore isso”, considerou Epiteto.

Livros recomendados

De acordo com a professora Lúcia Helena Galvão, o livro A arte de viver: O manual clássico da virtude, felicidade e sabedoria, de Sharon Lebell, é bem fiel ao conteúdo original. Apenas a linguagem foi atualizada. “Uma obra que recomendo fortemente, pois propõe uma postura diante da vida que é atemporal”, argumenta. Confira mais publicações na galeria abaixo:

6 imagens
Meditações a mim mesmo, de Marco Aurélio
O estoicismo hoje: sabedoria antiga para a vida moderna, de Patrick Ussher
Marco Aurélio: o imperador filósofo, de Pierre Grimal
Sêneca e o estoicismo, de Paul Veyne
A brevidade da vida, de Sêneca
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A arte de viver: o manual clássico da virtude, felicidade e sabedoria, de Sharon Lebell

Reprodução
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Meditações a mim mesmo, de Marco Aurélio

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O estoicismo hoje: sabedoria antiga para a vida moderna, de Patrick Ussher

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Marco Aurélio: o imperador filósofo, de Pierre Grimal

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Sêneca e o estoicismo, de Paul Veyne

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A brevidade da vida, de Sêneca

Reprodução

 

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