Conheça história do projeto “Petas do Frei”, do padre Rogério Soares
Fundado pelo sacerdote brasiliense, o projeto prestou 12 mil atendimentos em três anos de atuação. O frei firmou uma parceria com Lu Alckmin
atualizado
Compartilhar notícia
“Eu faço um empreendedor em uma manhã”, alega o frei Rogério Soares. Quem duvidar, não hesite em assistir a uma das aulas do Café Empreendedor, iniciativa que ocorre todas às sextas-feiras por volta das 9h, na Paróquia Sagrado Coração de Jesus e Nossa Senhora das Mercês, situada na 615 Sul. No projeto social, os participantes aprendem a vender as famosas Petas do Frei, e também cocadas, por Brasília.
A convite do padre Rogério, a Coluna Claudia Meireles esteve entre os aprendizes de uma edição do Café Empreendedor e, em seguida, entrevistou o religioso a fim de saber a história da ação social que já prestou 12 mil atendimentos em três anos de atuação e da recente parceria com a segunda-dama, Lu Alckmin.
O trabalho com a venda de petas e cocadas teve início na pandemia, em agosto de 2020. Na avaliação do pároco, ver os participantes “dando a volta por cima é o seu maior combustível”.
“Minha missão”
Antes de ser ordenado sacerdote em 2008, o brasiliense fez contabilidade e cursou direito, quando morou em São Paulo. Ele desistiu da formação acadêmica e decidiu entrar para o seminário religioso. “Desde então, eu estou nesta vida”, acentua. O frei completa: “O empreendedorismo sempre esteve dentro de mim. Quando me tornei padre, pároco, trouxe isso para minha missão.”
O religioso se descreve como “curioso” e sensível com os mais pobres. “Eu procurava meios de fazer com que as pessoas tivessem dignidade e conseguissem sobreviver. No meu ofício, os pobres eram uma meta minha em ter um olhar especial, mas eu queria algo inteligente”, expõe. Segundo o frei, o objetivo era criar uma iniciativa que “funcionasse” e, de fato, “transformasse vidas”.
“Eu via muitas ações com os pobres, mas que não mudava a vida deles. Eles continuavam na mesma situação de pobreza com assistencialismos”, relembra o padre. Ele traçou como objetivo “superar os assistencialismos”. “Como eu já tinha essa veia empreendedora, vi no empreendedorismo uma forma de superação. As pessoas que nós assistimos, prosperam”, acrescenta.
Café Empreendedor
Conforme salienta o pároco, os participantes da escola de empreendedorismo focada em ensinar a vender petas e cocadas “vão para a frente”. “Todo mundo que passa por aqui comigo é para ter autonomia. Eu não tenho pobres de estimação nem para dizer que são meus. Foi por isso que criei esse projeto do Café Empreendedor”, sustenta o frei Rogério Soares.
“Quando digo que faço um empreendedor em uma manhã, é verdade”, evidencia o idealizador da Pastoral Empreendedor Nacional e autor do livro Ser de Deus é rentável.
O sacerdote explica que os participantes da aula, localizada na L2 Sul, recebem uma acolhida, café da manhã e uma formação de vendas. “Para nós, vender é o que há de mais importante no empreendedorismo”, defende. Após a palestra envolvendo o tripé — conhecimento, técnicas e postura profissional —, os alunos já saem com a mercadoria em mãos, depois de passarem por um cadastro e uma escuta qualificada.
“Não façam clientes, façam amigos, pois clientes mudam de marca”, aponta o frei Rogério Soares nas formações do Café Empreendedor.
Os assistidos comercializam as Petas e as Cocadas do Frei. O biscoito de polvilho é feito na cidade de goiana de Anápolis. Nos cursos, eles são treinados a como apresentar o produto. No caso dos doces de coco, os alunos memorizam as principais características: “Vocês devem falar que é artesanal, feita no tacho, com 93% de coco e pouco açúcar, além de enfatizar que se trata de uma receita baiana”, comentou um dos instrutores.
“Ecossistema empreendedor”
De acordo com o padre, já passaram de forma concreta 1,5 mil pessoas pela venda de petas e cocadas. Outro projeto comandado por ele é a Feirinha do Frei. A iniciativa ocorre após as missas dominicais da Paróquia Sagrado Coração de Jesus e Nossa Senhora das Mercês. Pela ação, participaram mais de 200 indivíduos. “Temos um ecossistema empreendedor. Elas têm uma barraca, expõem, e também recebem formação”, compartilha.
No “ecossistema empreendedor” criado pelo frei Rogério, houve mais de 12 mil atendimentos em três anos. “Não quer dizer que são 12 mil pessoas, porque nós, em algumas situações, assistimos um indivíduo mais de uma vez”, esclarece. Entre os cases de sucesso da iniciativa com as petas e cocadas está a Marilene. Ela foi uma das primeiras a se envolver na ação.
“Foi logo no começo quando nosso projeto era muito simples e nós empacotávamos as petas aqui [na paróquia]”, evoca o religioso. À época, Marilene não conseguia atuar como diarista em razão da pandemia. Pediu, então, uma cesta básica ao padre, entretanto, levou um susto quando ganhou pacotes do biscoito de polvilho para vender. Constrangida e desconfiada com o episódio, ela lamentou não ter destreza em oferecer o produto.
Categórico, o pároco frisou: “Vou te ensinar”. Marilene levou as petas para casa, deu start nas vendas e não imaginava o que a esperava no futuro. “Quase três anos depois, ela tem MEI, fez curso de educação financeira, abriu uma empresa de fitoterapia e vende chás, mas também as petas e cocadas, por isso ter ajudado a levantá-la”, confidencia o padre. Atualmente, a empreendedora dispõe de uma loja no subsolo no Ministério de Minas e Energia.
Segundo o frei Rogério, Marilene “não quer mais olhar para trás”. Outro case de sucesso do “ecossistema empreendedor” das iniciativas desenvolvidas pelo sacerdote é Nazaré. “Ela estava sem condições de sobrevivência e começou a vender as petas. Com a família, dona Nazaré abriu recentemente uma padaria na Vila Telebrasília”. Com disciplina, os assistidos pelo projeto tendem a tirar mensalmente R$ 2,5 mil com o biscoito de polvilho e cocadas.
Expansão
Com expectativa de expandir as ações, o próximo passo a ser dado pelo sacerdote é criar um grupo do Café Empreendedor no Gama. “Vamos ter um novo núcleo lá do mesmo jeito que acontece aqui”, revela. O objetivo do pároco é que cada região administrativa do DF tenha um grupo do projeto. No rol de iniciativas fundadas pelo religioso brasiliense, há uma comunidade terapêutica, localizada em Alexânia, Goiás.
“Eu tiro as pessoas das drogas”, ressalta o pároco. Após os dependentes químicos passarem pelo tratamento, eles vêm para a república de empreendedores, fixada na Vila Telebrasília. Nos próximos meses, o padre abrirá uma unidade no Guará. “Será um apartamento. Eles moram nessas minhas estruturas, pagam o aluguel e a comida. Ficam com um lugar para morar e trabalhar”. O frei continua: “Eu não crio dependências deles em mim”.
Padarias artesanais
Sucesso em São Paulo, o projeto das padarias artesanais chegará ao Distrito Federal nos próximos meses. A iniciativa conta com a parceria de Lu Alckmin, segunda-dama do Brasil. “Nós vamos ter curso de panificação aqui [paróquia]. Já temos a cozinha pronta”, elucida o padre. No estado da região Sudeste, foram criados 9 mil estabelecimentos. No DF, a projeção é de inaugurar 30. “Está tudo pronto. Os lugares foram visitados”, acentua.
Maior lição
Não somente os participantes das iniciativas saem com uma bagagem de conhecimento advindos das formações. Ao longo desses três anos de trabalho com petas e cocadas, o frei Rogério avalia ter aprendido bastante. De tantas lições, a maior obtida pelo religioso se trata de ver “as pessoas dando a volta por cima depois de oferecer uma oportunidade e incentivo”, atesta o sacerdote.
“Ver as transformações das pessoas é o meu maior combustível. Isso me faz acordar cedo todos os dias para vê-las crescendo. Tiro-as das drogas e das ruas e se eu consigo fazer isso por meio dessa metodologia, em torná-las empreendedoras, quase todos são capazes de sair da situação de miséria com a chance oferecida”, considera o frei. Os seis colaboradores do religioso deixaram a dependência química, a exemplo de Jerônimo Brandão e Stêvão Randolfo.
Empreendedorismo no sangue
O frei nasceu na capital federal e, aos 4 anos, mudou-se com os pais e irmãos para a cidade de São Raimundo Nonato, no interior do Piauí. Filho de Antônio da Silveira e de Iolanda Soares de Almeida Silveira, o padre Rogério garante trazer nas veias o “gene” do empreendedorismo. “Sempre vendi alguma coisa, desde criança”, recorda. Na infância, ele chegava a amassar as panelas de alumínio de casa a fim de obter dinheiro.
Eventos de futebol e circo de bairro eram alguns dos planos executados pelo empreendedor mirim. Com 12 anos, ele começou a trabalhar com contabilidade e se formou em técnico aos 17. À época, a mãe do futuro frei passou a produzir petas e cocadas para vender nas ruas como forma de complementar a renda do lar. Antônio era funcionário público. Diante do sucesso das delícias, precisou deixar o trabalho e ajudar a esposa nos negócios.
Sabendo do potencial do filho como empreendedor, Antônio e Iolanda emanciparam Rogério com o propósito dele abrir um CNPJ para legalizar a empresa de petas e cocadas. “Eu formalizei o negócio dos meus pais”, rememora. Em seguida, a família deslanchou. “Nós expandimos. Passamos a colocar nos mercados e lanchonetes da cidade. Fiz a marca e uma publicidade. Empreendemos”, conclui.
Para saber mais, siga o perfil de Vida&Estilo no Instagram.