Conheça a trajetória e o que inspira o artista prodígio Pedro Gandra
O artista Pedro Gandra detalha o interesse pela arte, a trajetória profissional e o processo criativo, além de revelar os futuros projetos
atualizado
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O primeiro capítulo da história de Pedro Gandra com a pintura poderia trazer como título a palavra resistência. O carioca, radicado brasiliense, chegou a enfrentar uma relutância pessoal quanto a trabalhar com esse tipo de linguagem. A princípio, ele acreditava que encontraria maior liberdade de experimentação em outras mídias. Até que precisou cursar uma disciplina por obrigatoriedade. Para sua surpresa, fascinou-se com a atividade e, desde então, não se vê longe dos pincéis.
O artista prodígio abriu o ateliê, situado no Guará I, para conversar com a Coluna Claudia Meireles. No bate-papo, Gandra detalha o interesse pela arte, a trajetória profissional e o processo criativo, além de compartilhar os projetos em andamento e o que está por vir. Com 28 anos, formou-se pela Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde estudou por nove anos – ele ingressou na instituição carioca aos 12.
Início
“Desde cedo”, Gandra sabia em qual área desejava se profissionalizar: “Queria criar ficções, mesmo que, à época, não conseguisse organizar esse raciocínio”. Ao refletir sobre o passado, o artista lembra trazer dentro de si “uma curiosidade em pensar situações capazes de se expandir a partir das vivências cotidianas para algo além”. Na mesma época, também surgiu no jovem carioca o interesse em entender os procedimentos técnicos de alguns afazeres artísticos.
“Esses dois fatores me levaram um pouco precocemente a procurar uma escola de artes. A partir daí, comecei a criar uma espécie de senso do mundo por essas lentes: a da curiosidade e da descoberta”, recorda. Com disposição de sobra e entusiasmo para aprender, Gandra integrou a Escola de Artes Visuais do Parque Lage como aluno ouvinte e “com a mente aberta”.
“Fui exposto a várias possibilidades de produção e pensamento”, rememora.
Em entrevista, Gandra lembrou da sensação de conhecer a escola que o formou: “Fui lá um dia no Parque Lage e, no momento em que eu pisei, alguma coisa aconteceu. Pensei: ‘Pertenço a esse lugar’. Eu era muito jovem e precoce. Sabia o que queria fazer, não do ponto de vista prático, imediato, mas queria estar lá e existir nesse lugar”, explana.
À época, Gandra não podia ser aluno “oficialmente” por ter menos de 18 anos, entretanto, diante da dedicação dele, a coordenadora falou: “Matriculem esse menino logo”. No Parque Lage, o garoto começou com a aula de desenho, mas não perdeu tempo e, rapidamente, passeou pelas salas dedicadas às aulas de fotografia, vídeo, gravura e teoria e crítica da história da arte.
Nesse período, o adolescente não escondia a objeção com relação à pintura até passar por uma mudança de paradigmas. “Tive que cumprir uma matéria. Desse momento em diante, fiquei completamente encantado com as infinitas possibilidades que a pintura como mídia poderia me oferecer”, conta.
Ficcionista da pintura
Ao considerar ter se encontrado na arte, o estudante tomou uma decisão. Ele resolveu que iria “concentrar e verticalizar os interesses e as influências de produção” na pintura. Ao descrever como é seu processo criativo, Pedro Gandra relata ser, em grande parte, guiado pela leitura e pela escrita. “Não faço esboço, desenhos ou projeto previamente à feitura dos trabalhos”, manifesta. O carioca complementa: “Meu principal ofício é ser ficcionista”.
“Todas as ideias, temas, referências e composições são acumuladas em notas de celular, junto de referências, a maioria delas literárias. Inclui passagens de livros, autores que imagino que possam ser interessantes para ler ou reler naquele momento, escritos meus e reflexões sobre o processo [criativo]. Essas notas servem como estímulo fundamental para começar, continuar e estruturar os trabalhos. São a sua sedimentação”, certifica.
Atualmente, o carioca tem se dedicado à pintura figurativa, mas com um olhar visionário: “Cada vez mais também pensando o trabalho de uma maneira instalativa, o que tem me levado a outras soluções expográficas e outros suportes que não somente a tela”. Gandra acrescenta: “Ainda tenho a escrita e a leitura como nortes, embora a palavra não figure na imagem”.
Parte do meu trabalho é carregar as ambições e sentimentos que a palavra contém e tentar traduzir ou expandir em imagens
Pedro Gandra
Ser artista
O que atrai Gandra no ofício de artista é a possibilidade de “nutrir um imaginário”, composto por vivências e referências de diferentes campos. Na avaliação dele, exercer tal trabalho propõe estabelecer um “diálogo com tudo que impacta” nas criações de outros profissionais, independentemente de serem textos em prosa, poemas, fotografias, filmes e pinturas.
Para Pedro Gandra, o ofício de artista “opera” como se estivesse respondendo, por meio de seu trabalho, a todos os estímulos surgidos ao se deparar com diferentes tipos de obras. Ficar frente a frente, ler ou escutar as criações de outras pessoas o inspira. Ao ser questionado a respeito do que busca transmitir ao público, o prodígio sustenta não querer se fechar em uma única narrativa: “Deixo-a aberta a todo tipo de interpretação”.
“Acho que os diferentes tipos de percepção são absolutamente válidos e os significados que podem se criar também. A narrativa é uma questão importante do trabalho, mas é fragmentada e vagada, deixo-a aberta a todo tipo de interpretação. Não pretendo torná-la intransigente. Ela funciona muito mais como uma sugestão ou uma provocação para abrir-se ao diálogo”, explica Gandra à coluna.
Brasília
Antes de estabelecer morada na capital federal, Brasília já havia abraçado o carioca. Em 2011, por coincidência ou não, Pedro Gandra se inscreveu em um edital do Iate Clube de Brasília para expor um trabalho em um ambiente no Museu Nacional da Brasília.
“Calhou de eu ser selecionado, ganhar um dos prêmios e de ser uma banca com quem estreitei muitos laços. Quando vi uma coisa foi ligando à outra. Como isso me trouxe a Brasília. A minha primeira exposição já foi em um espaço importante do Museu Nacional”, diz, com esmero. Ele também fez intercâmbio pelos Estados Unidos.
Cinco anos depois, por conta da mãe ser servidora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan), Pedro se instalou de vez na capital federal. Os dois passaram a morar no apartamento em que funciona o atual ateliê do artista. O adolescente carioca estava exausto de tantas trocas de lar, talvez, por isso, tenha se sentido tão acolhido pela cidade de Juscelino Kubitschek.
Vínculos
Atualmente, o artista participa de exposições em instituições e galerias, a exemplo do Museu Nacional de Brasília, do Centro Cultural São Paulo e do Espaço Cultural Casa das Onze Janelas, no Pará. Em um período da trajetória profissional, Gandra buscou estar em mostras coletivas. “Acreditei que conseguiria estabelecer melhores conexões, vendo como o trabalho respondia a diferentes propostas e ambientes”, comenta.
No ponto de vista do carioca, outro privilégio de atuar em exposições coletivas é a oportunidade de conhecer outros artistas, pesquisadores, curadores e produtores. “Desenvolvendo vínculos e fortalecendo as trocas”, define Gandra a respeito da experiência. Em 2019, ele também passou a fazer mostras individuais em instituições e galerias nacionais e internacionais.
Experimentação e novos ares
Gandra está envolvido em um projeto de um espaço brasiliense dedicado à pesquisa em curadoria, o deCurators. Recentemente, encerrou-se o primeiro de quatro ciclos da iniciativa. “A etapa pretendia investigar narrativas em pintura a partir daqueles artistas que estavam exibindo as criações”, elucida. O carioca de 28 anos atua na empreitada como artista e curador.
Até 2024, Gandra se encontra envolvido com o projeto de pesquisa em curadoria em parceria com Gisel Carriconde Azevedo para o ciclo de pintura do deCurators. Conforme revela o artista, o projeto contará com mais três exposições. Uma delas ocorrerá no final de 2023 e as outras duas em 2024. “Neste momento, dedico-me a pensar e elaborar conjuntos de trabalhos e projetos para mostras que devo apresentar em um futuro próximo”, confidencia.
Perguntado sobre onde sonha em expor as criações, ele diz com ênfase: “Não penso em um lugar específico”. Pedro Gandra confessa gostar de imaginar como o trabalho “encontra ressonância e trocas genuínas”. Assim, ele consegue ampliar e fortalecer futuros diálogos do trabalho com o espaço. Vale lembrar que o carioca também atua como curador, ofício conquistado recentemente.
Pedro Gandra considera como “primeira ocupação” a de artista. Entretanto, como ele dispõe de um “temperamento um tanto inquieto”, aparecem propostas para ele pesquisar e cuidar da curadoria de mostras. Na avaliação dele, esse segundo papel não deverá ser exercido com frequência. “Será bem mais pontual”, analisa. Além disso, alguns tópicos do trabalho precisam se sobressair.
O artista seguirá um fundamento para atuar ou não como curador de uma mostra. “O critério é a paixão pelo tema ou projeto, e se eu posso com a minha pesquisa individual contribuir, ou também em outra instância, um projeto que me suscite a vontade de descobrir mais sobre universos poéticos que ainda não tive a oportunidade de examinar. É neste lugar do desconhecido que reside qualquer potência de criação. É o que me move”, conclui.
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