Casa Albuquerque inaugura exposição de Di Cavalcanti em evento seleto
Batizada de Di Cavalcanti – Protagonismo e Permanência, a mostra reúne cerca de 40 obras realizadas entre 1921 e 1975
atualizado
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Em meio às comemorações do centenário da Semana de Arte Moderna, é difícil não se lembrar de Di Cavalcanti (1897-1976), pintor brasileiro — de influência cubista e surrealista — considerado um dos nomes mais populares ao retratar temas como Carnaval, samba, as favelas e os operários.
Em parceria com a galeria de arte Almeida & Dale, a Casa Albuquerque abriu as portas de sua unidade brasiliense, no comércio da QI 5 do Lago Sul, para receber a exposição de Di Cavalcanti em comemoração aos 100 anos da Semana de 22, com curadoria de Denise Mattar.
Batizada de Di Cavalcanti – Protagonismo e Permanência, a mostra reúne cerca de 40 obras realizadas entre 1921 e 1975 a partir das múltiplas facetas do artista, como ilustrador, desenhista, caricaturista, pintor e muralista. Sua produção está inserida na história da arte brasileira, tendo realizado mais de 9 mil obras ao longo de quase 60 anos.
Um artista apaixonado pela sua terra
A exposição tem início com os Fantoches da Meia-Noite, de 1921, série que marca o princípio do trabalho autoral de Di Cavalcanti. São 16 gravuras feitas em traço leve e elegante, ocupando o espaço das páginas de forma inteligente e original, com o uso de sombras descomunais. Essas, por sua vez, maximizam dramaticamente o desamparo dos personagens, manipulados pelos cordéis da noite vazia, entre eles a prostituta, a cafetina, o pianista, o bêbado, o vagabundo, o mendigo, a coruja e o gato. O mesmo tipo de síntese pode ser vista na aquarela Outomno, realizada em Paris, e datada de 1923.
No retorno ao Brasil, em 1925, após a estadia em Paris absorvendo e digerindo as influências europeias — e num particular ritual antropofágico —, Di Cavalcanti descobriu os morros cariocas, prenhes de vida e de música, e eles passaram a ser um dos seus temas favoritos. Ali ele definiu as linhas mestras de sua pintura — para sempre. O óleo Morro (1928) e a aquarela Samba (1935) ilustram bem esse momento.
O interesse do autor das obras pela poesia do cotidiano também o levou a retratar muitas vezes os pescadores da Gamboa, do Caju, do porto de Maria Angu. Peixes (1937), Pescadores no porto (1940), Vila de pescadores (1956), e o painel sem título (1964), apresentados na exposição, espelham essa vertente.
Já no início da década de 1930, Di Cavalcanti teve seu trabalho interrompido por perseguições políticas e, para se esconder, morou por algum tempo na Ilha de Paquetá (RJ), o que resultou em uma intimidade com o local, que ele pintaria muitas vezes ao longo de sua vida.
Em 1936, o pintor se “autoexilou” em Paris, onde permaneceu por quatro anos. Nesse período, o lirismo e a sensualidade langorosa tomaram conta de suas telas. É uma fase romântica, que se estende por toda a década de 1940, com retratos imaginados, nos quais as mulheres têm olhos doces e os ambientes são cuidadosamente ornamentados.
Conhecido na década de 1950 como o “pintor das mulatas”, definição muito redutora de seu talento, Di pintou mulheres negras, brancas, ricas e pobres; morenas, loiras e ruivas, num clima lírico e sensual, ao qual sempre acrescentava um perfume de melancolia. Esse tema, da vida inteira, pode ser visto na exposição em 12 telas, que, da década de 1940 à década de 1970, permitem ao visitante acompanhar o percurso pictórico do artista, suas pesquisas estéticas, opções construtivas e afinidades eletivas.
A partir de 1950, o artista é convidado a criar painéis e murais para a nova arquitetura de linhas simples e arrojadas que começava a se implantar no Brasil, encarnando o sonho da modernidade. Entre 1958 e 1971 ele realizou mais de 10 obras monumentais em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Nelas, Di fez experiências com formas ondulantes, padrões listrados e estampados, numa profusão de informações visuais e predomínio de estilizações.
Uma estética vibrante, colorida e múltipla torna-se a marca de sua obra nessa fase, na qual encontramos alguns acentos surrealistas. Entre os trabalhos mais conhecidos dessa faceta estão as tapeçarias do Palácio da Alvorada, o grande painel do Congresso e o mural do Teatro Cultura Artística.
Inicialmente desenvolvidas para ocupar os amplos espaços murais, essas características se refletem também em sua pintura de cavalete. Um grafismo pulsante permeia os trabalhos, a cor torna-se mais crua, e as obras são mais narrativas. Registrando esse momento a exposição apresenta as obras, Sem título, 1958 e Folia, 1956, e finaliza com o excepcional painel Trabalhadores de 1952.
Curadoria
Para Denise Mattar, curadora da mostra, Di Cavalcanti tem um protagonismo na Semana de Arte Moderna. “Ele é um artista muito talentoso. Desde criança, ele gostava de desenhar. O caminho dele, naturalmente, teria sido a Escola Nacional de Belas Artes. Só que o pai dele morreu muito cedo, tendo ele, então, que começar a trabalhar”, fala Denise.
“Como ele era muito talentoso para desenhar, ele começa a fazer ilustrações para jornais. E, a partir dessa história, ele vai para São Paulo, em 1917, e começa a trabalhar com o Oswald de Andrade. Ele conhece, ainda, Anita Malfatti, Tarsila do Amaral. O Di fazia parte desse grupo”, continua a curadora.
Sobre o contato de Denise com a galeria Casa Albuquerque, ela revela que, no ano passado, já havia conversado com Lúcio Albuquerque, um dos sócios, sobre trazer uma exposição comemorativa ao centenário da semana de 22. “A ideia era trazer um grande nome da arte brasileira, e eu achei que Di casava perfeitamente”, afirma ela.
“Essa é a primeira exposição dele em Brasília”
Denise Mattar
Lúcio Albuquerque, à frente da galeria, explica que, ao abrir a unidade brasiliense, tinha em mente realizar exposições que considerasse relevantes. “A nossa vertente é de arte contemporânea, o que foi apresentado nesses dois anos aqui em Brasília. Mas já tínhamos a intenção também de trabalhar com arte moderna”, diz o galerista.
Sobre a curadora
Nascida na capital paulista, Denise Mattar vive uma ponte aérea entre diferentes cidades brasileiras em prol de suas exposições. “Comecei a trabalhar muito cedo com galerias, com o Franco Terranova. Depois, fiquei um período mais voltado a joias de arte, até que fui convidada para trabalhar no Museu da Casa Brasileira de São Paulo”, compartilha a curadora.
“Depois, fui para o Museu de Arte Moderna de São Paulo, para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, enfim, passei a trabalhar com curadoria independente. A primeira grande exposição que eu fiz foi com o Di Cavalcanti, em 1997”, acrescenta Denise.
Confira os cliques do evento de inauguração da mostra:
Serviço
Di Cavalcanti – Protagonismo e Permanência
Curadoria: Denise Mattar
12 de maio a 11 de junho
Seg-sex: 10 às 19h
Sab: 10 às 13h
Visitas mediadas para grupos de até 10 pessoas serão ofertadas às quintas-feiras, às 17 horas, durante o período da exposição.
Visitas devem ser agendadas pelo telefone (61) 99885-1030.
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