The Plant: um restô com boa intenção e execução vacilante
Embora observe com critério o conceito do campo à mesa, cardápio apresenta muitos problemas
atualizado
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Ao contrário de um pensamento recorrente nesta era da informação, restaurantes (e bares, lanchonetes, pubs, vendinhas etc.) não constituem a representação máxima da gastronomia. Diferentemente da culinária, a gastronomia se apresenta pelas vias do produto comercializável (em vários sentidos) – ou seja, aquela maravilhosa comida de vó servida no almoço de domingo habita o universo da culinária.
Dito isso, é importante frisar que, para além desta complexa disputa etimológica, o prato servido, consequência da receita produzida começa sempre na escolha dos ingredientes. No ciclo da gastronomia, portanto, o restaurante é a ponta final e não sua totalidade. Esse entendimento é evidente no menu, no conceito e no próprio discurso da equipe do restaurante The Plant, aberto há poucos meses na 103 Sul, mas na execução dos pratos falta atenção ao cozimento, equilíbrio de tempero e proporção de ingredientes.
Curiosamente, o The Plant assume o ponto que foi do Duoo, uma casa dedicada à gastronomia funcional. De termos em termos, a gastronomia vai ditando suas novas tendências. Isso teria um impacto muito mais semântico e narrativo, para se alinhar mais à necessidade novidadeira do mercado por novos valores gourmetizados e instagramáveis do que, de fato, ao mero ato de se comer bem. Depois da onda da gastronomia “saudável” veio a “funcional” e, agora, volta-se aos valores básicos da cozinha: o movimento farm-to-table (do campo à mesa).
The Plant se apropria de modo muito natural desta premissa – que deveria, aliás, ser fundamento básico de qualquer operação dada a alimentar pessoas – tendo como princípio o não uso de alimentos industrializdos, gordura trans, GMS e outros excessos. Mais do que os selos da gastronomia medicamentosa, o restaurante observa alguns dos princípios fundamentais que fora, antes, apropriado pelo movimento Slow Food, por exemplo. Não se trata mais de fazer com que as pessoas comam de forma mais equilibrada, ingerindo equilibradamente vegetais, grãos, proteína, carboidratos etc. O interesse central é de se fortalecer a própria cadeia produtiva do campo até a mesa. Como fazer isso? Da forma como o The Plant demonstra: recorrendo a fornecedores locais, de preferência orgânicos e pautando o cardápio pela disponibilidade da natureza, ou seja, respeitando a sazonalidade dos insumos.
Deste modo, há de se reverenciar este esforço da nova casa, para além das samambaias penduradas no pé-direito alto sobre as mesas. Abrir o cardápio do The Plant leva o cliente a encontrar alimentos de origem, das verduras orgânicas de Brazlândia, à queijaria Cabríssima de Sobradinho e os já famosos defumados suínos de Leo Hamu. Bem, no menu que se estenderá pelo próximo mês ou mais, há de se encontrar alguns clichês (dadinho de tapioca, hambúrgueres, purê de mandioquinha). Mas há pontos fora da curva, que trazem coisas interessantes, a exemplo do carpaccio de beterraba (R$ 20), ponto alto da refeição.
Discos de beterraba fatiados finamente levam um vinagrete de tangerina não muito ácido, em boa harmonia com um mix de grãos (chia, girassol e outros), minifolhas da própria verdura mais queijo de cabra e Minas (um tanto em excesso, mas com um resultado final satisfatório ao paladar).
Dos pratos principais, provei alguns deles podendo endossar o valor dos ingredientes, porém, com muitos erros de execução. Um dos mais alarmantes fora no bifum thay (R$ 40). O macarrão de arroz chegou quase que completamente dissolvido de tanto que ferveu, sendo servido com uma aparência de canja. Na composição, muito coentro (para fazer jus à tradição oriental da qual se inspira), porém, o mix de legumes e cogumelos colocados no prato apresentaram uma desproporcionalidade enorme com a quantidade excessiva de brócolis.
O picadinho da casa (R$ 48) chegou com o cozimento até acertado, à exceção do ovo fervido para além do ponto, mas insosso. Não havia tempero no molho de tomate nem no filé em cubos. O arroz com couve-flor e a farofa de coco com banana-da-terra não só trazem informação demais ao prato, como também faltaram tempero. No caso do camarão ao arroz negro (R$ 45), o crustáceo fora bem tratado, mas a combinação com queijo Minas e o arroz passado do ponto frustraram a experiência.
Para fechar o cardápio, na carta de sobremesas, há esforços muito nobres na área das restrições alimentares (como em todo o cardápio o faz, mas cujo desafio costuma ser maior para doces). O brownie tropical (R$ 21) pode ser uma belíssima sobremesa para quem quer fugir do açúcar, do glúten e da lactose, por exemplo, sem precisar recorrer a altas doses de xilitol ou coisa que o valha. Embora a textura lembre mais um bolo caseiro do que de fato o doce americano de chocolate, o sabor está ali, combinando ainda com maga e um sorbet da mesma fruta com adição de maracujá.
Desta vez me detive ao menu de refeições. Há ainda no The Plant lanches e os novos (e não tão novos) queridinhos do mercado “fit”: bowls de frutas e wraps. Estes não provei. Mas fora o suficiente para perceber que a casa precisa ir além das boas intenções e das boas ideias e conferir mais atenção às filigranas da cozinha.
The Plant
Na 103 Sul, bloco C, loja 36. Tel: (61) 3322-0404. Das 8h às 22h. Ambiente externo. Wi-fi. Desde 2019