Same Same propõe mergulho no rico mundo da gastronomia oriental
A casa recém-inaugurada explora esse universo vasto com um menu de generalidades convenientes
atualizado
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Gastronomia asiática pode ser considerada uma novidade em terras brasilienses ainda. Conhecemos por aqui muito pouco da diversidade da comida oriental, de tantos biomas, matizes e regiões. Os primeiros contatos foram com a culinária chinesa – na verdade, apenas um recorte mais comercial que caíra no gosto ocidental de forma maciça. Ocorreu o mesmo em seguida com a japonesa, quando inventamos de roubá-la a essência e decidir que não se coloca mais wassabi no niguiri ou que deve-se servir sashimi regado a teriyaki ou melecar tudo com cream cheese. É muito recente a chegada de casas indianas no Distrito Federal. Os coreanos também participam timidamente do mercado local. Tailândia e Vietnã, cujos pratos icônicos há muito habitam as ruas de São Paulo, por exemplo, surgem como praças notoriamente desconhecidas dos candangos.
O novo restaurante Same Same, inaugurado nas entranhas da W3 Norte, propõe uma aproximação a várias dessas linguagens reconfortantes da gastronomia oriental, das quais boa parte não existiam no comércio local até então. Uma casa bem montada, num lugar escondido, porém, adorável a meu ver, como ex-morador daquela região. Não é um destino comum para após as 18h. E por isso mesmo é importante que seja ali. Pois é habitando esses labirintos inóspitos que a cidade ganha uma vida noturna mais descentralizada e mesmo divertida.
No cardápio, muito embora a régua de medida do frequentador brasiliense favoreça os encantos de uma arejada gastronomia asiática, o tom é de um menu de generalidades convenientes. Se por um lado, o restaurante propõe, com certo didatismo, apresentar essa cozinha desconhecida, a necessidade mercadológica de adaptação ao senso comum urge. Assim, aparece um gỏi cuốn tecnicamente correto, mas com pouca complexidade, como é de se esperar do famoso rolinho vietnamita de verduras enroladas em papel de arroz; ou uma couve-flor agridoce ultracrocante (o que é positivo na maioria das vezes), que carrega no dulçor e impõe uma camada de empanado muito grossa – não deixa o vegetal aparecer com o glamour verdoengo do bulbo.
Não há, asseguro, um prato que mereça ser taxado de ruim ou incorreto em absoluto. Importante assegurar o leitor de que o mesmo esmero na escolha das louças, do design de interiores pode ser encontrado com frequência dentre os pratos. Muitas vezes, contudo, com as concessões “do mercado”. Aliás, sempre reitero que, apesar de haver as resistências naturais do consumidor, o restaurante deve exercer seu caráter pedagógico de ensinar as pessoas a comerem melhor e superarem preconceitos e neuras. Neste caso, quanto à picância e à acidez, elementos tão caros à experiência estética do palato.
Boa surpresa
Same Same tem algumas surpresas boas neste sentido. Ao provar o phở (sopa vietnamita de macarrão, verdura e carne) pude compará-lo imediatamente ao que me fora servido alguns meses atrás pela brigada feminina vietmanita da própria embaixada da república socialista. Trabalho bem feito, com um caldo de aparência clara, como deve ser (para isso escalda-se e limpa-se os ossos antes da fervura final), com as claras notas de canela e anis. Senti falta das fatias finas de carne crua extras colocadas para cozinharem ao contato do caldo pelando na hora de servir (não é uma regra).
Ao deter-me no pequeno menu coreano da casa, frustrei-me com a pouca aderência da pimenta-vermelha na composição do bibimbap (“mexidão” sul-coreano de arroz, carne, verduras e ovo). Mas o que se tem como traço mais forte do Same Same é justamente o oposto do seu lema: “Same same but different” (igual igual mas diferente). A gastronomia tailandesa é, sem dúvida, o principal eixo do menu. E aqui conhece-se a Tailândia a partir também de seus ícones, nada muito diferente (a não ser pelo fato de não haver restaurantes desta ordem em Brasília).
Naturalmente, o pedido mais imediato para testar a cozinha tailandesa é o tom yum, a clássica sopa tailandesa. Preparo muito correto, como todos os demais desta seção. O rolinho frito servido na entrada depende demais do bom molho que acompanha, capaz de reunir precisamente a combinação essencial da cozinha do sudeste asiático: doce, azedo e picante. Pulando para a segunda sopa tradicional do país, a tom kha, a experiência continua interessante, mas o caldo de leite de coco mostrava-se excessivo. Algo semelhante ocorre com a salada de mamão verde, conhecida por ter notas muito ácidas, aqui passa um pouco da medida.
Pad thai
Um grande acerto do menu surge com o pad thai, o prato dos mais queridos da gastronomia tailandesa, que decreta um dos grandes feitos do Same Same: ofertar um cozinha com ingredientes de qualidade a um tíquete-médio superjusto. O pad thai de camarão, com as fitas de massa puxadas na wok, ajusta o equilíbrio entre os elemendos agridoces e acastanhados de modo a valorizar a harmonia da receita. O mesmo ocorre com a sobremesa clássica: mango sticky rice. No ponto certo, mas, quando da minha primeira visita, servido equivocadamente apenas com uma colher (como comer uma fatia inteira de manga desta forma?).
Na região, conhecida pelos restaurantes de self-services do almoço apressado e das oficinas mecânicas, o Same Same surge como um sopro de sofisticação e sabor, o que contribui, como toda ocupação que é cultural, à revitalização das áreas menos nobres de uma cidade. Infelizmente, a casa se trai pela própria proposta diversa: à medida em que abraça o mundo oriental, perde personalidade.
Same Same
Na 711 Norte, bloco E, loja 59, W3 Norte. Tel: (61) 3546-9125. De terça a sábado, das 12h às 15h e das 19h às 22h30. Wi-fi. Ambiente interno. Desde 2019