La Boulangerie Bistrot: boa sacada foge ao típico serviço de shopping
Ainda prefiro o comércio de rua, de quadra, sem precisar passar por cancelas e grades, mas se for ao CasaPark não deixe de fazer uma visita
atualizado
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Comer em shopping center me incomoda. E não me refiro apenas à experiência indigesta da praça de alimentação, esse mafuá pós-moderno afeito à comida requentada, franqueada e mal-cheirosa. A pior das propriedades está na clausura, que me remete à profecia apocalíptica de George A. Romero, em “O Despertar dos Mortos” (1978), na qual uma horda zumbi tenta a todo custo adentrar o centro comercial atrás de… alimento.
Ainda prefiro o comércio de rua, de quadra, sem precisar passar por cancelas, grades, portões e escadas rolantes. Cinéfilo que sou, acabo por frequentar shoppings pela programação de cinema e, consequentemente, como alguma coisa. Foi assim que conheci o La Boulangerie Bistrot, a caminho dos quatro meses de funcionamento.
O pequeno restaurante nasceu da parceria dos vizinhos La Boulangerie e Loca Como Tu Madre, na 306 Sul, respectivamente liderados pelo boulanger Guillaume Petitgas e a chef Renata Carvalho. Soma-se a isso o fato de o CasaPark estar querendo ampliar a oferta gastronômica, que sempre fora muito limitada, mas com grifes locais de certo peso como a rede Marietta/Marvin e a Saborella.
Um primeiro diferencial dessa versão da padaria e confeitaria francesa da Asa Sul surge com a estratégica localização dentro do próprio shopping: acesso pela rua e o espaço aberto, quase ao ar livre, que conferem um mínimo de sentido ao uso do termo bistrô. O horário também quebra a lógica: funciona a partir das 8h.
Cardápio enxuto, mas com a reconhecida qualidade de panificação e confeitaria estabelecida por Guillaume. A padaria, vale dizer, desempenhou um papel importante para a consolidação de uma cena tão profissional em Brasília, atenta a uma produção de pães de fermentação natural e farinha de boa procedência.
O bistrô, contudo, não se limita a mais um ponto de venda dos produtos da La Boulangerie. Com menu desenvolvido por Renata Carvalho, apresenta há um mês opções desde o café da manhã até o jantar. Dos três períodos, me pareceu mais aprazível o momento do almoço, de fato, embora as desconfortáveis cadeiras de madeira não contribuam para uma estada mais delongada. Na lousa, a brigada atualiza diariamente as quatro opções de pratos principais, precedidas com uma sempre refrescante salada de folhas e cestinha de pães, além de sobremesa inclusa (R$ 41 a sequência).
Agrada-me esse sistema de refeições imprevisíveis. Contribui para despertar um elemento importante na chamada experiência gastronômica: o fator “uau!”. O tiro também pode sair pela culatra, obviamente. Num dia você pode encontrar um filé-mignon ao molho de chocolate, noutro um clássico goulash ou uma massa italiana.
Dos três pratos que provei, o peito de frango ao molho de limão apresentava cozimento correto, mas um aligot sem graça o acompanhava. O salmão poderia estar com um ponto mais rosado, no entanto, o molho de laranja bem equilibrado e o espaguete feito de legumes resultaram num bom prato. O preparo mais interessante veio com o pernil suíno ao molho do assado acompanhado de farofa de cuscuz e bacon, tudo muito bem temperado a fazer jus à mineirice da chef.
No fim da tarde, o menu ganha sugestões de sopas do dia (R$ 29). Na minha visita, experimentei a de abóbora com gorgonzola. O dulçor da verdura com a potência do queijo embolorado criam uma bela harmonia, intensificada pela crocância da couve frita. Essa pode ser uma boa ocasião para pinçar algum item da lista de sanduíches, a exemplo do croque monsieur, um clássico francês. Finalizado por um molho branco de boa cremosidade, leva um dos ótimos pães da casa (R$ 29).
Minha birra ao final é com a omelete, de queijo ou de bacon, a R$ 25,00. Falta cremosidade, textura e técnica. Um problema crônico em Brasília. Ainda não encontrei uma que prestasse por aqui. Emborrachada, seca demais, molhada demais… não há quem acerte esse preparo. Não à toa, costumava ser prova de fogo dos chefs nos restaurantes franceses classicões, reza a lenda. Pois por aqui, nem Daniel Briand e, pelo jeito, nem Renata conseguem emplacar uma omelete correta. Não sei se isso se deve a uma exigência do paladar médio do consumidor brasiliense, mas ainda acredito que não devemos nivelar por baixo.
Prefira os ovos mexidos, servidos por R$ 12 ou dentro dos combos de café da manhã. Para o desjejum matinal, há três modalidades, sendo uma vegana (R$ 34). No tradicional (R$ 27 ou R$ 46, o mais bem servido), vão à mesa uma variedade de pães, geleia de fruta da estação, presunto, queijo, suco de laranja e uma bebida quente. Ah, peçam as panquecas americanas fofinhas com um delicioso caramelo de manteiga salgada (R$ 18 a porção). Um detalhe: o serviço de barista precisa melhorar. Expresso mal tirado e um macchiato amador, com espuma sem cremosidade, não combinam com a excelência da panificação.
Na seção de doces, a Boulangerie apresenta um mimo atrás de outro, como os frequentadores da casa nesses últimos dez anos sabem: macarons, canelés, éclairs, tartalettes. Confeitaria francesa tradicional, com padrão. O negócio é ficar de olho no que Renata Carvalho está inventado no comando das caçarolas. E depois (ou antes) do cineminha, dentre as parcas opções do CasaPark, vale conhecer o rango do bistrô.
A dobradinha comer e assistir a um filme me força, assim, a agir como os zumbis de Romero. Ocasionalmente, encontro abrigos seguros. Seja um serviço de alto nível como o do Gero no Iguatemi ou os Outbacks da vida. Vez por outra aparecem boas sacadas, como o La Boulangerie Bistrot.
La Boulangerie Bistrot
No shopping CasaPark (via Epia), primeiro piso. Diariamente, das 8h às 21h (domingo até as 20h). Wi-fi. Ambiente interno e externo. Aberto em 2017