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A história de Carlos Alberto de Nóbrega se confunde com a televisão brasileira. Ele iniciou a carreira na TV na década de 1950 e não parou mais. De lá pra cá, passou por várias emissoras e se consolidou no SBT, onde está até hoje, aos 84 anos de idade.
O humorista falou sobre o gosto pelo trabalho e que nunca se sentiu velho para exercer a profissão. Durante a entrevista, Nóbrega falou sobre o humor politicamente correto e do que o faz rir na televisão de hoje em dia.
O apresentador do A Praça é Nossa abriu o coração e falou sobre como foi parar de trabalhar por conta da pandemia. Se mostrou preocupado com os funcionários que estavam passando por necessidade financeira. Além disso, o também humorista falou sobre política, a relação com o presidente Jair Bolsonaro e a felicidade de receber uma homenagem no Congresso.
Este colunista que vos fala tem um enorme prazer em convidar você, caro leitor, para essa entrevista que também é uma homenagem a este homem que tem grande representatividade na televisão brasileira.
Veja abaixo a entrevista completa de Carlos Alberto de Nóbrega à coluna:
Amigos do Metrópoles, a entrevista de hoje é com um cara muito especial pra mim e para o Brasil. A história dele se confunde com a história do humor na televisão brasileira. Ele tem 87 anos. E olha, ele é apresentador de televisão, humorista, roteirista, produtor, diretor e advogado. É isso mesmo, ele é advogado. Carlos Alberto de Nóbrega! Tudo bem? Muito obrigado por falar com a gente.
Magina! Eu tenho 84, não é 87 anos não… (risos)
Ah, olha a correção, hein!?
Eu espero chegar lá, hein!?
Você vai chegar!
Carlos, eu queria saber como está neste momento. Você apresentando A Praça É Nossa que está no ar desde 1987, de casa. No momento único, no momento em que o mundo parou e sua vida provavelmente parou como também a vida de todos nós. Como está a sua vida nessa pandemia, Carlos Alberto?
Olha, tá sendo assim uma montanha russa, Léo. Eu tive, no começo, uma fase muito boa, foi logo em março. Dia 15 de março eu fui lá pro sítio e fiquei até o final de abril. Foi maravilhoso porque era verão, o sítio é gostoso, tinha piscina, tinha sol. E a gente achava que em maio a gente ia voltar a gravar. Era uma “quarentena”, a gente tava achando. Aí ficou pra junho, já começou a ficar ruim. Eu ia pra São Paulo, chegava em casa, ficava deprimido, aí eu voltava para o sítio, já não achava mais graça porque lá também fazia frio, é serra. E começou a dar aquela saudade da família. Pela minha idade os meus filhos têm o maior cuidado. De vez em quando eu quero dar uma saidinha e eles seguram. Aí eu comecei a ficar realmente triste. E piorou quando teve a possibilidade de gravar a Praça de forma diferente. Aí eu peguei o carro, fui pra São Paulo e fui falar com o Pelé. Era uma segunda-feira. Aí falei: “Pelé, a gente pode fazer o seguinte, a ideia que a gente teve é fazer a Praça lá fora.” Então, nós achamos uma maneira de fazer a Praça. Ia ter uma placa de acrílico separando e tal… O meu problema era o seguinte: meia dúzia tem contrato, o resto da Praça é tudo cachê. E a Praça, como a televisão, é uma vitrine. Aquilo tava me incomodando, eu queria voltar de qualquer maneira. Se for preciso eu vou pedir ao Silvio. Na terça-feira eu voltei… Quando eu cheguei em casa recebo a notícia que a Eliana pegou o vírus. O que aconteceu nessa segunda-feira que eu recebo a notícia é que eu fui pela primeira vez à televisão. Eu tive uma crise de choro quando eu entrei.
O que você viu, ou que deixou de ver, que te emocionou tanto e que te levou às lágrimas?
O vazio. Nós somos uma fábrica de sonhos. A televisão é uma fábrica de sonhos. Nós somos uma Disney, vamos dizer assim para o telespectador. Então, você chega lá, tem aqueles carros, o pessoal movimentando, você faz três programas ao mesmo tempo no estúdio. De repente é aquele vazio, triste, ninguém. Você via um funcionário, amigo seu, você tinha medo de chegar perto. Eu empurrei a porta com cotovelo… Na minha casa.
Agora, eu acho importante a gente voltar a esse assunto da sua preocupação. A sua preocupação não é só em relação ao seu ego. Ao fato de estar com um programa novo no ar. É o fato de tantas pessoas dependerem da Praça inédita. Da Praça É Nossa que está no ar recente. Quantas pessoas dependem daquilo ali não só como vitrine, mas também pelo cachê. Porque a vitrine é se manter nos espetáculos que também não existe mais. Esses espetáculos nos quais os seus humoristas trabalham, né?
O que mais me deixou triste é o Tubinho. Tubinho é o palhaço que faz muito o Programa do Ratinho e ele faz uma participação na Praça. Ele tem um circo muito grande. Um dia ele ligou pra mim: “Seu Carlos, eu tenho 42 funcionários registrados. No primeiro mês eu pude pagar. No segundo já não dá mais. Os meus artistas estão vendendo biscoito na esquina.” Aquilo dói, Léo. O mundo parou. Porque a gente não sabe quando o mundo volta.
Eu nunca me senti velho. Eu faço academia, trabalho, penso, leio, escrevo, eu saio, tô atualizado. De repente eu tô me sentindo velho. Comecei a me sentir velho. E ouvir: “Você não pode ir por causa da sua idade”. Isso me trouxe um medo. Eu vou admitir. Isso é que tá me incomodando. O único medo que eu tenho. Não é de trabalho. Trabalho a gente volta a trabalhar. O meu medo é a minha cabeça. Eu não posso mais me sentir velho.
Como está o seu contato com a sua família?
A minha filha está no Rio de Janeiro desde o dia 13 de março. E eu só a vejo por FaceTime. Os outros eu vejo a três metros de distância. Nasceu meu bisneto e eu não pude colocar meu bisneto no colo. A minha neta teve aqui e me mostrou de longe. Isso que me incomoda, Léo.
O humor tá mudando muito.
Tá? Me explica.
Hoje em dia, na minha opinião, quem faz o melhor humor, quem faz a gente rir, quem mais faz a gente rir é o Fábio Porchat. Sem dúvida alguma. O Porchat achou a mina de ouro. Agora os outros programas de humor você não dá uma gargalhada, você dá um sorriso. Tem muito mais importância o que você vai ver, do que você vai ouvir. Você sabe que gastaram dinheiro pra fazer aquela piada, só que você não dá uma gargalhada. Sem crítica, porque eu adoro eles. A Globo tem um carinho enorme por mim.
E a questão do politicamente correto? Muitas piadas, a maneira de rir antigamente era uma, a maneira de rir hoje é outra. Como o humor da Praça se adequou a esse humor?
Olha, eu sou totalmente contra a esse negócio de politicamente correto. Eu não ligo. Na última Praça eles ligaram pra mim. Porque eu ia abrir o programa com a Vera Verão. Então tinha aquele negócio: “Oh, cabeça de feijão, oh carvão sei lá o que…”. Eu falei: “Sim, e daí? “Ah, é politicamente errado.” Não, não vai porque esse programa foi há 30 anos. Eu acho um preconceito absurdo esse negócio de politicamente correto. Você pode ofender uma pessoa e magoá-la com uma palavra bonita.
Eu acho que tudo depende da intenção. Da maneira como se diz.
O resto eu falo mesmo. Ou o pessoal não assiste. Eu só sei que eu falo. Eu não vou atrás disso, não.
Eu queria saber a sua relação com outros nomes fortes do humor, no cenário brasileiro da televisão. Renato Aragão. Qual a sua relação com o Renato Aragão?
Eu tô com muita saudade dele. Não vejo o Renato faz uns 10 anos. Mais de 10 anos, muito mais de 10 anos. Mas somos amigos. A gente às vezes se fala. O Renato, eu vou fazer uma homenagem a ele no dia que eu voltar. Eu quero voltar fazendo a homenagem a Renato Aragão. Porque Renato Aragão é uma história. Ele tem uma história.
Maravilho! E ele já sabe disso?
Eu acho que ele tá desconfiado.
Agora a gente vê um humor político muito forte no Brasil. Existe obviamente em todo o mundo. Você já procurou um humorista que faça uma caricatura do Bolsonaro ou não?
Não. Lá a gente fez, mas não foi uma caricatura. Quem fez foi o Porpetone. Ele é baixinho, gordinho… Então não dava. Era só a voz mesmo. Mas eu faço na Praça muita crítica. Eu tenho o João Plenário que é o deputado. Então, como eu nunca digo o nome da pessoa… Porque eu critico a política, o sistema, não o político. Porque meu pai me ensinou isso também. Meu pai foi um mestre pra mim.
Então é aquela coisa: você fala de uma maneira geral. Quem se sentiu ofendido é porque a carapuça serviu. Não é isso?
Então é aquele exemplo: a gente brincava muito com o Lula, brincava muito com a Dilma, brincava com o Temer. Embora eu tenha sido acolhido pelo Bolsonaro, foi uma das homenagens mais lindas que eu tive. Quando aconteceu o negócio lá dos filhos dele, eu me senti na obrigação do deputado João Plenário ter problemas com os três filhos dele. Pau que bate em Chico, bate em Francisco. Sem criticá-lo, sem falar mal dele. Eu falo mal das besteiras que ele fez, ou que ele faz na boca do João Plenário, que é um irresponsável, que é um larápio.
E qual a sua avaliação do governo Bolsonaro?
Olha, eu fiquei triste. Eu não ia votar. Vou te admitir. Ele sabe disso. Eu ia votar no Alckmin. Era o meu candidato. Como o Alckmin não tinha a mínima condição e eu tenho mais de 80 anos, eu pensei: “Ah, eu não vou votar em ninguém, eu não preciso votar”. Aí, no dia da eleição, eu estava almoçando, era três horas da tarde. Porque eu queria votar contra o PT. Qualquer um que ganhasse do PT eu votaria. Só que disseram que ele tinha uma chance de ganhar no primeiro turno. Eu saí do restaurante com a Renata e fui direto pra escola onde eu votava. E votei no Bolsonaro. No momento em que ele ganhou, eu passei a torcer para o Brasil dar certo. Então eu tava muito animado. Quando eu fui homenageado pelo Congresso… Você soube disso?
Sim.
Eu cheguei na véspera e o Fabinho, que é um dos assessores dele, foi me buscar no aeroporto com o carro dele e disse: “O presidente quer te conhecer”. Eu disse: “Ah, mas eu não tô arrumado”. Ele disse: “Não, vai assim mesmo”. Aí eu fui lá para o Palácio e foi uma festa. Rimos, abraçamos, falamos besteira. No dia seguinte, às nove horas da manhã iria ter a homenagem a mim no congresso e o Onix falou para ele lá no Palácio: “Presidente, eu vou até o congresso porque o Carlos Alberto vai ser homenageado”. Aí ele disse: “Tá, eu vou com você”. Ele pegou o paletó e foi a pé. Tanto é que saiu no Jornal Nacional. Não posso falar mal dele. Não tenho esse direito. Eu posso não estar gostando e não estou com as coisas que ele está fazendo. O pior cego é aquele que não quer ver. A minha esperança é que acabe isso que está acontecendo. O país tá ruim.
É difícil fazer qualquer tipo de plano com esse futuro incerto, mas dá pra fazer plano com a própria vida. O que você quer para a sua vida, Carlos Alberto?
Eu queria trabalhar até o último dia de vida. E eu ia fazer, já tinha acertado com uma firma de Brasília. Eu ia todo mês numa capital do Brasil fazer uma palestra.
Contar sobre a sua história? Sobre a sua vida?
Como eu comecei, como é que eu fui para a Globo. Como começou no Silvio. Como é que eu saí da Globo e fui para Bandeirantes. Como é que eu saí da Record, as coisas como aconteceram. E a minha história, a minha experiência, tava tudo prontinho. Eu tenho certeza que ia dar certo. Agora não dá mais.
Quem sabe o ano que vem quando tudo voltar ao normal.
Não, não… Talvez por eu estar negócio de estar me sentindo velho. Talvez eu voltando a trabalhar.
Sim, sim.
Talvez quando eu puder dar um beijo no meu filho, talvez eu volte a ser o Carlos Alberto de 84 anos com 40 de cabeça.
Olha, esse é meu desejo, porque eu admiro demais você, Carlos Alberto. Admiro demais a sua história, a sua vivacidade. Sempre que eu te encontrei você foi sempre pra cima, sempre muito feliz. E eu quero sinceramente que volte esse Carlos Alberto. Que vai voltar, eu tenho fé. Não desista porque a sua força é isso. O que mais me impressionou, não me surpreendeu porque eu sei que você é assim, é a sua preocupação com o outro. Você não tá preocupado só com você mesmo, você tá preocupado com o outro. Isso é raro nos dias de hoje. Parabéns por ser assim. Parabéns pelo seu legado, pela sua história. Essa entrevista é sua homenagem a você.
Eu que agradeço esse carinho, essa simpatia, esse sorriso maravilhoso que você tem. Muito obrigado, meu querido. Um beijão pra você.
Obrigado Carlos Alberto. Fica com Deus. Fique bem, cara! Volte a malhar que eu gosto muito de você.
Obrigado, querido!
Você é um grande homem!