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A psicóloga Lumena tem virado assunto nas redes sociais por ser, digamos, “fenotipicamente academicista” (contém ironia). Os internautas têm se questionado o motivo de a sister usar tantas terminologias letradas para dizer o óbvio, prejudicando o entendimento de modo geral e, ainda, criando barreiras da comunicação.
Esta coluna não sabe se Lumena autorizou, mas convidamos a professora Adriana Figueiredo, autora dos livros Gramática Comentada com Interpretação de Textos e Redação para Concursos, Enem e Vestibulares, para falar sobre como o uso de algumas dessas expressões de forma repetitiva e fora do contexto é prejudicial e esvazia causas.
“O academicismo é a valorização da produção ideológica e teórica do meio acadêmico. O academicismo de determinadas vozes pode levar a uma desvalorização da voz do outro, aquele que não faz parte do meio, que tem acesso ao conhecimento por outros meios, como a experiência de vida. É como se a voz academicista dissesse ao outro: se você não estudou o que eu estudei, leu o que eu li, você não pode saber o que eu sei”, explica a especialista.
“Quando o conhecimento acadêmico ‘sai’ da bolha sem preocupação em adequá-lo ou colocá-lo de forma didática, isso gera confusão e desconfiança”, completa, resumindo bem certos discursos de Lumena. Para a especialista, além de preconceituosa, tal postura pode prejudicar quem fala, pois, por não se ater ao conhecimento dos grupos considerados marginais, corre o risco de ficar isolado, sem ser compreendido e sem poder evoluir com o conhecimento do outro.
Outro aspecto ligado a essa prática prejudicial à comunicação é o uso indiscriminado de conceitos abstratos e “palavras difíceis”, que nada têm a ver com o contexto. Tudo isso para tentar legitimar uma posição, “É como uma tentativa de aproximação do discurso acadêmico, que intimida e evita o debate”, analisa.
No campo dos estudos da linguagem, principalmente quando se fala em sentido, é no mínimo complicado dizer que as palavras têm um significado único e universal. Assim, analisamos os termos usados comumente por Lumena, tudo dentro de contexto. Confira:
Atravessamento: é o efeito que determinados aspectos sociais, como classe, raça e gênero, exercem ao afetar pessoas e situações na sociedade.
Afeto: apreço, acolhimento.
Potência: algo que pode ser produzido ou realizado, mas que ainda não o foi. Quando dizemos que alguém tem potencial para alguma coisa, para conseguir uma vaga de emprego, por exemplo, perceba que a vaga ainda não foi obtida, mas que essa é uma possibilidade quase iminente.
Vulnerabilidade: situação de fragilidade, que está associada à exclusão, à discriminação, e à violação de direitos humanos.
Agenciar: fazer esforço para construir algo capaz de produzir um efeito ou de conquistar um objetivo.
Demanda: reivindicação, seja por debates, seja por ações práticas.
Pauta coletiva: também tem a ver com demandas de determinados grupos, geralmente minoritários.
Grandão: “ela vai ouvir grandão” – de maneira forte e intensa; violenta.
Preterimento: desconsideração, menosprezo. Preterir é desprezar algo, enquanto favorece outra coisa; deixar de mencionar.
Silenciamento: fazer calar a voz de pessoas, geralmente pertencentes a grupos de minorias, seja por não deixar falar ou por não ouvir, ou até pela omissão.
Território: em um sentido figurado, pode significar uma área determinada do conhecimento.
Troca: permuta de experiências ou saberes que ocorre quando as pessoas envolvidas estão (ou se colocam) no mesmo “lugar”, ou seja, quando não há uma relação hierárquica, uma relação de poder desigual.
Narrativa: história contada por alguém, que vai contá-la à sua maneira, de seu ponto de vista.
Vivência: conhecimento que é adquirido a partir das experiências vividas.
Questões de gênero: o gênero, enquanto categoria social, diz respeito aos papéis, comportamentos, atributos que são considerados adequados tanto para homens, quanto para mulheres em uma sociedade. Ou seja, o gênero tem relação com o que é esperado, permitido e valorizado nas mulheres e nos homens, inclusive na própria divisão entre os gêneros.