Simon Porte Jacquemus: conheça a trajetória do nome mais promissor da moda
Estilista francês conhecido pelas mini bolsas encabeça estudo que antecipa as futuras potências do universo fashion, mas de onde ele surgiu?
atualizado
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Diante das mudanças causadas pela pandemia, o site de buscas de moda Lyst e o portal Highsnobiety desenvolveram um relatório que antecipa o comportamento do consumidor pós-coronavírus. De acordo com os dados captados, os responsáveis pelo estudo constataram que a grife Jacquemus, do estilista Simon Porte Jacquemus, é a marca que mais tem potencial de decolar após o isolamento social. No entanto, nem todo mundo conhece o designer, conhecido por criar as polêmicas mini bolsas.
Vem comigo conhecer a trajetória deste talento!
O francês Simon Porte Jacquemus está há mais de 10 anos no mercado, mas foi só a partir de 2018 que o jovem de 30 anos conseguiu visibilidade global. Muitos creditam a difusão do nome às polêmicas mini bags, desenvolvidas pelo estilista a partir de 2017, porém, o verdadeiro trunfo do empresário é o entendimento dos anseios de sua geração.
Lançada em 2010, mesmo ano em que o Instagram chegou ao mercado, a Jacquemus se popularizou graças às redes sociais, oferecendo “férias eternas” aos seguidores da plataforma. Com um dos feeds mais organizados e temáticos da indústria têxtil, a label conquistou o mercado ao se apresentar como um devaneio provençal em meio ao verão europeu. Seus enormes chapéus de palha e bolsas minúsculas, em contraste com roupas minimalistas e elegantes, resultaram em uma imagem tropical surrealista que cativou a mídia especializada e as millennials.
Estilista x Influencer
Em julho de 2019, o Financial Times chegou a questionar se o francês seria estilista ou influenciador, uma dúvida bem pertinente, se analisarmos seus produtos e clientes. Com criações nada funcionais, mas que valem um belo clique, o empresário conquistou nomes como Kylie Jenner, Hailey Bieber, Rihanna, Beyoncé e Dua Lipa, ao passo que sua personalidade otimista e simples se encarregou de atrair o público low profile.
Em seu perfil, o estilista não parece sofrer com seu trabalho, compartilhando registros de suas tardes ensolaradas, regadas a mergulhos, belas paisagens e um bronzeado impecável. Mesmo na correria das semanas de moda, ele sempre surge despreocupado, com declarações que variam de “estou realizando um sonho” a “eu sou muito apaixonado pelo o que faço”.
Há quem desaprove e suspeite da postura. A crítica já apontou que ele usa a pretensiosa estética do verão perfeito e trejeitos caipiras para disfarçar uma suposta falta de habilidade, mas, ainda que isso aconteça, está tudo bem. Afinal, como bem analisou Kerby Jean-Raymond, a moda, atualmente, é muito mais sobre história, tribalismo, pertencimento e representatividade do que apenas roupas. E, neste caso, estamos diante de um perfil muito atrativo. “Eu amo azul e branco, listras, sol, frutas, vida, poesia, Marselha e os anos 1980”, diz ele em seu perfil do Instagram.
Menino do campo
Filho de agricultores, Jacquemus foi criado na vila de Mallemort, um vilarejo com pouco mais de seis mil habitantes no sudeste da França. Ele gosta de dizer que a educação humilde imprimiu uma certa ingenuidade em sua personalidade, mas o “senhor sol”, como era chamado na infância, não era tão inocente assim.
Aos 8 anos, Simon escreveu uma carta para Jean Paul Gaultier na qual pedia uma vaga de estilista. Ele argumentou que isso traria boa imprensa ao enfant terrible da moda, mas não foi dessa vez que Porte conseguiu seu lugar no universo fashion.
Ajudando os pais a vender os vegetais cultivados na fazenda da família, ele começou a reparar os turistas de Paris, sua grande inspiração. Aos 18 anos, o jovem se mudou para a capital francesa, onde começou a cursar design de moda na Escola Superior de Artes e Técnicas da Moda. Porém, um mês depois de seu primeiro semestre na instituição, a mãe do designer, Valerie, morreu em um acidente de carro.
A ruptura fez o jovem desistir das aulas para investir em sua própria linha. O nome da marca, inclusive, é uma homenagem à progenitora. Antes do casamento, ela carregava Jacquemus em sua assinatura. “Poucos dias depois do enterro, transformei minha dor em força e comecei a criar. É por isso que consegui tocar as pessoas. Mesmo que as minhas primeiras coleções não tivessem uma linha precisa, havia a emoção”, explicou em entrevista à Elle.
Sempre focado em chamar atenção da mídia, o jovem estilista pagou 100 euros a um fabricante de cortinas para costurar suas primeiras peças, exibindo-as em um falso protesto na porta da Dior, durante o Paris Fashion Week. A jogada deu certo e, no ano seguinte, ele passou a integrar a programação da semana de moda francesa, como um dos estilistas mais jovens a conseguir tal façanha.
O show, feito à beira de uma piscina, introduziu o mood simples e descomplicado do designer, sobrevivendo bem ao crivo dos críticos. “Lembro-me dele dizendo: ‘Sou um profissional diurno. Existem estilistas noturnos, eu sou diurno'”, lembrou Clara Cornet, diretora criativa da Galeries Lafayette, ao The Cut.
Para financiar as coleções seguintes, Simon conseguiu um emprego como assistente de vendas na Comme des Garçons da Saint-Honoré. Adrian Joffe, parceiro de Rei Kawakubo, criadora da maison japonesa, apadrinhou o o jovem. “Ele me encantou. Fiquei tão impressionado com sua visão e convicção”, relatou ele ao site.
Foi na grife da veterana que Jacquemus aprendeu as táticas para ser bem-sucedido no mercado de luxo. Sempre seguir a estética proposta e investir em produtos acessíveis para bancar projetos mais conceituais estão entre os ensinamentos transmitidos a ele. Seu primeiro sucesso de vendas, aliás, foi uma camiseta simples com as cores da França, lançada no outono de 2014.
No radar
Em 2015, Jacquemus venceu o almejado Prêmio Especial do Júri, do grupo LVMH. A condecoração deu ao estilista um cheque de 150 mil euros e uma orientação com a consultora Sophie Brocart. Embora incomum, por conta da idade, a profissional sugeriu que francês se tornasse CEO de sua própria companhia, devido a “personalidade, visão e carisma” do designer.
Outra dica de Brocart foi seguida à risca pelo jovem: a contratação de uma equipe de alfaiates. À época, com um pequeno contingente de costureiros experientes, ele construiu uma das apresentações mais bem recebidas na temporada de primavera/verão 2016. O Business of Fashion disse que ele “não era apenas fofo e francês, mas um dos jovens mais quentes de Paris”.
Daí em diante, Jacquemus evoluiu seu estilo de veraneio, com roupas de malha, chapéus de palha, ombros marcados e cinturas bem delineadas, inspirados nos anos 1980, sua década favorita. Em referência às jovens francesas, o estilista construiu uma persona apelidada de cigana do sul.
Cada uma de suas coleções narra uma história com começo, meio e fim, como em um filme. A sétima arte, grande paixão de Simon, deu a ele a ideia de nomear todos os seus trabalhos como as grandes obras do cinema francês: Les Santons de Provence (Os Bibelôs da Provence) e L’Amour d’un Gitan (O Amor de um Cigano) são alguns exemplos. “Minhas coleções são sempre pensadas como um filme francês”, confessou o empresário à revista Elle.
As bolsinhas no campo de lavanda
Uma fotografia da mãe do estilista com um lenço na cabeça foi o grande divisor de águas em sua carreira. A coleção La Bomba, inspirada na imagem, introduziu a mulher Jacquemus que é vista nas passarelas de hoje. Além de blazers mais amplos, camisas caídas e mini vestidos de malha, o compilado revelou acessórios divertidos, como os chapéus gigantescos e bolsas em miniatura.
“Minha equipe disse: ‘Simon, isso nunca vai vender, vamos fazer só alguns’. Vendemos centenas. Se ficar legal no Instagram, vai vender. Este é o mundo em que vivemos”, declarou o designer à revista W.
Dito e feito. Alguns meses depois, o modelo Le Chiquito (a primeira mini bolsa da etiqueta) foi parar nos feeds de Rihanna, Beyoncé e Kim Kardashian. Atualmente, o produto representa cerca de 30% da receita da grife.
Com aparições frequentes na mídia, o estilista decidiu dar seu xeque-mate na indústria: um desfile nos campos de lavanda de Provence. Simon queria que a coleção fosse como um pintura pop provençal, mas ainda fiel às raízes da label.
No show, que comemorou os 10 anos da casa, Jacquemus enfileirou a imprensa de moda e seus clientes embaixo de um sol escaldante, mas algumas gotas de suor e a escassez de sinal não seriam capazes de atrapalhar o potencial visual da locação, que viralizou nas redes sociais e deu 1,8 milhão de novos seguidores ao jovem.
“Por 10 minutos, todo mundo achou que seria como o Fyre Festival. Em algum ponto, todos estavam desesperados, mas daí as modelos entraram e pude vê-los suspirando. Sol na cara de vocês. É o que eu sou desde o começo”, destrinchou ao The Cut.
Adentrando o Monte Olimpo
Desde 2017, a Jacquemus dobrou sua equipe e as vendas da empresa acabam de ultrapassar os US $ 20 milhões. De vez em quando, surgem na mídia boatos que de que a grife está em negociações com grandes conglomerados de moda, como Puig ou LVMH. Contudo, nenhuma negociação foi oficializada.
Essa resistência, segundo alguns players da moda, pode prejudicar a marca. Sem ajuda externa, a etiqueta só consegue atender aos pedidos de seus 300 varejistas globais “bem tarde dentro da janela de entrega, o que, comercialmente, não é o ideal”, afirmou um executivo do Moda Operandi.
O produtor de desfiles Alexandre de Betak contou ao The Cut que o orçamento do desfile de aniversário era consideravelmente pequeno e que não havia qualquer plano B para caso o tempo não colaborasse. Porém, a esta altura, a percepção de que Simon sabia bem o que estava fazendo é quase certa.
O estilista opta por caminhar com as próprias pernas porque foram elas que o trouxeram até aqui. E também devem levá-lo ainda mais longe. Na temporada de outono/inverno 2020, o designer apostou em um compilado minimalista marcado por fibras naturais, em uma espécie de previsão daquilo que é apontado como a principal tendência da moda pós-coronavírus.
Agora, em meio à pandemia, Porte foi um dos primeiros empresários a investirem em campanhas feitas em casa. Primeiramente, a atriz Barbie Ferreira, a cantora Rosalía e a modelo Bella Hadid, três estrelas com popularidade em alta, surgiram no Instagram cobertas com as peças da grife. No fim de maio, foi a vez da avó do estilista protagonizar um ensaio para a label.
Atento às evoluções do mercado, como a ascensão do TikTok, Simon prova, ao lado de Olivier Rousteing, da Balmain, que futuro da moda pertence aos diretores criativos que acompanharem as novas gerações. O estilista tem apostado em ações certeiras, como o café Citron, inaugurado na nova Galerie Lafayette, e o restaurante Oursin, lançado durante o Paris Fashion Week. Ambos os estabelecimentos são repletos de locais instagramáveis. Enquanto isso, nós ficamos à espreita, aguardando a próxima ideia revolucionária do nome mais promissor da indústria têxtil.
Colaborou Danillo Costa