Pele falsa protege os animais, mas prejudica o meio ambiente
As alternativas sintéticas se tornam poluentes se não forem descartadas corretamente
atualizado
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Usar casaco de pele é uma das grandes gafes na moda e, desde as últimas temporadas, grandes marcas de luxo se juntaram ao movimento faux fur, ou fake fur (pele falsa, em tradução livre). A ideia consiste em abandonar o uso de pele animal nas coleções. O anúncio mais recente do fim da prática foi feito por Jean-Paul Gaultier, durante entrevista a uma emissora francesa. Em 2006, a grife chegou a sofrer intervenções de ativistas da organização PETA (People for Ethical Treatment of Animals).
Recentemente, Diante von Furstenberg e Coach também entraram para o time. Burberry, Ralph Lauren, Gucci e Versace já contribuem com o movimento há algum tempo.
Por um lado, a notícia é boa, pois poupa a vida animal. Mas, a pele falsa pode não ser a resposta mais sustentável. O material sintético é feito de derivados do plástico, que leva centenas de anos para se decompor. Associações internacionais pró-pele entraram em embates com a PETA com esse argumento, alegando que a matéria-prima animal é biodegradável.
Vem comigo!
Os fios sintéticos da pele falsa são fibras que levam compostos plásticos. Para fazer o teste, basta usar fogo: os pelos de origem animal queimam, enquanto os falsos derretem. Segundo a professora do curso de moda no Centro Universitário IESB, Rafaella Lacerda, especialista em têxtil, o fake fur não minimiza o impacto na natureza, dependendo do tipo de material.
“As imitações de origem química [de pele e couro] são obtidas por meio de polímeros químicos providos do petróleo e do carvão. São os famosos poliéster, poliuretano, polipropileno e a lã acrílica. Esses tecidos, em seu ciclo de vida, e conforme são lavados, vão liberando microplásticos nas nossas águas e solos”, explica a educadora.
O couro também é prejudicial tanto à natureza quanto às pessoas. “A indústria do couro é uma das mais poluentes do mundo. Muitos gastos com água, desperdício de couro na extração e produtos nocivos ao planeta para amaciá-lo. Além de toda a mão de obra explorada em países subdesenvolvidos na Ásia. Pessoas ficam doentes por conta do contato diário com bromo e químicos similares”, alerta a professora.
Alternativas
Vale destacar: o chamado “couro ecológico” é de origem animal, assim como o convencional, mas gasta menos água e leva produtos mais leves no processo de curtimento. A Lei nº 4.888/65 proíbe o uso da palavra “couro” em artigos que não venham de origem animal.
No entanto, já existem imitações de origem vegetal para se manter aquecido de forma eco-friendly. Uma opção comercial e mais viável é o Piñatex, produzido com fibras de folhas de abacaxi por meio dos processos de tecelagem e fusão. É um dos chamados TNT, ou “tecido-não-tecido”.
Além desse, até testes de bioplásticos com cogumelos (Muskin), vinho (Vegea), água de coco e bactérias estão sendo estudados. Fibras biodegradáveis, como as de algodão, podem ser compostadas.
Plásticos
De acordo com o professor Marcelo Moreira Santos, do Instituto de Química da Universidade de Brasília (UnB), o plástico é considerado nocivo para o meio ambiente porque demora muito para se decompor. Especialista em degradação e estabilização de compostos, ele alerta: “Qualquer material plástico que perde a vida útil deve ser reciclado e nunca descartado diretamente”.
Segundo ele, o plástico ganha forma por meio de compostos químicos organizados em cadeias longas, os chamados polímeros. Compostos como polietileno (PE), ou propileno e polipropileno (PP), podem “sobreviver” 450 anos na natureza. O problema em torno disso é o tempo que o material leva para se desintegrar em pedaços menores, gerando acúmulo. Dessa forma, o solo não respira e os rios e mares se enchem desses resíduos.
O mar é um dos maiores afetados pelo plástico na natureza. Partículas minúsculas como o glitter, chamadas microplásticos, absorvem substâncias tóxicas e são confundidas com alimentos por alguns organismos marinhos. O grupo Ocean Conservacy estima que 8 milhões de toneladas métricas de plástico vão para os oceanos anualmente, além das 150 milhões já circulando. Em 2016, especialistas do Fórum Econômico Mundial de Davos alertaram para o perigo: em 2050, os oceanos terão mais plástico do que peixes.
Solução
O ideal é reaproveitar peças antigas, comprar em brechós e não ter medo de repetir e usar as roupas por muito tempo. Mesmo tomando cuidado com os produtos escolhidos, o consumismo pode ser um grande vilão. “O descarte de qualquer material têxtil é prejudicial ao solo. Os itens feitos com fibras de poliéster são como plástico e demoram muitos anos para se decompor. As peças de fibras naturais, e artificiais, estas, biodegradáveis, se forem descartadas em aterros sanitários a céu aberto também emitem CO2”, frisa Rafaella.
A dificuldade da indústria em desenvolver materiais biodegradáveis é garantir que eles “tenham propriedades semelhantes aos plásticos tradicionais e preços de produção compatíveis”, completa Marcelo. A composição, no entanto, é semelhante. O que os diferencia dos tradicionais é a adição de algum átomo ou molécula, permitindo uma reação mais rápida com o oxigênio, assim, a degradação na natureza acontece, também, de forma veloz.
A professora de moda conclui que a solução para minimizar o impacto é investir em tecnologia e experimentação. “Organizar a produção da matéria-prima para gastar menos água, energia e produtos químicos, os quais podem ser agressivos ao meio ambiente. E remunerar bem a mão de obra da extração dessas fibras”, complementa. Além disso, valorizar a matéria local: “Investir em estudos para extração e conhecimento do comportamento de fibras que podem ser encontradas próximas das centrais de produção”.
Confira algumas marcas que defendem a bandeira ecológica:
Vale lembrar que já mostrei joias feitas com borra de café, um projeto brasileiro bem bacana. Outra novidade vista por aqui foram os chinelos Allbirds, feitos com cana-de-açúcar.
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Colaborou Hebert Madeira