Diet Prada: dupla do perfil mais temido da moda veio ao Brasil
Lindsey Schuyler e Tony Liu participaram de um evento de palestras em São Paulo e conversaram com a coluna
atualizado
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São Paulo (SP) – Quem gosta de moda sabe que, atualmente, as redes sociais impactam diretamente a indústria. Prova disso é que um perfil do Instagram se tornou um dos meios da mídia mais temidos pelas marcas. Criado em 2014, o Diet Prada faz denúncias de plágios e inspirações controversas que permeiam as criações. Com humor e polêmicas, os idealizadores Lindsey Schuyler e Tony Liu se tornaram referência para o mundo fashion. Em passagem pelo Brasil, eles conversaram com a coluna.
Vem comigo!
Os fundadores da página são norte-americanos. Liu se formou no Instituto de Artes de Chicago e Schuyler frequentou a Universidade Estadual da Flórida, ambas nos Estados Unidos.
Os dois se conheceram quando trabalhavam na chapelaria Eugenia Kim. De forma despretensiosa, abriram a conta em dezembro de 2014.
A ideia era expor, de forma anônima, as opiniões que tinham internamente sobre plágios e outras polêmicas que reparavam na indústria fashion. O primeiro post foi uma comparação entre um casaco da coleção Pre-Fall Dior 2015 e uma peça de outono/inverno 2014 da Prada.
Cerca de dois anos depois da estreia, o Diet Prada atingiu 1 mil seguidores. No entanto, um aumento no interesse pelo profile ocorreu depois que Liu e Schuyler adotaram um tom mais sério com a exposição de Harvey Weinstein, do The New York Times.
No fim de 2017, as interações com a conta do Instagram saltaram para mais de 500 mil followers. Hoje, a dupla tem 1,6 milhão de fãs na rede social, que carinhosamente chama de dieters.
Em passagem pelo Brasil, Tony Liu e Lindsey Schuyler participaram do Iguatemi Talks, em São Paulo. No painel mediado pelo jornalista João Batista, contaram que iniciaram as postagens sem um grande propósito. “Começou como uma piada. Tirávamos um intervalo e era a hora de relaxar”, comentou Liu.
Os dois perceberam que a piada tinha virado um negócio quando a Gucci os convidou para uma colaboração, em 2017. Eles fizeram um take over no Instagram da grife italiana, durante o desfile da primavera/verão de 2018. Foi aí que começaram a pensar em se dedicar exclusivamente ao Diet Prada.
“Isso não era algo que eu poderia recusar. Eu tinha que dizer dizer para a minha chefe: ‘Olha, eu tirei algumas semanas de folga por causa do meu casamento e agora preciso de mais uma semana'”, ironizou Schuyler.
No talk, eles revelaram uma curiosidade. Quando chegaram em Milão a convite da Gucci, foram “capturados” no aeroporto pela Prada para encontrarem pessoas da equipe. “Foi tipo um sequestro”, brincaram.
Eles ficaram sem acreditar no que estava acontecendo. Afinal, o nome da conta é uma homenagem à Prada. O duo inclusive destacou que, posteriormente, teve a oportunidade de conhecer Miuccia, a diretora criativa da label, um dos momentos mais incríveis já vividos.
O sucesso é inegável. O Diet Prada também teve a oportunidade de ficar cara a cara com Maria Grazia Chiuri, da Dior, uma das integrantes da lista extensa de seguidores. Os followers incluem nomes célebres no segmento, como Naomi Campbell, Clare Waight Keller, Pierpaolo Piccioli, Alessandro Michele, Maria Grazia Chiuri, Karlie Kloss e Edward Enninful, além das irmãs Bella e Gigi Hadid.
No ano passado, Lindsey Schuyler e Tony Liu entraram na lista do Business of Fashion de pessoas mais relevantes da moda. Apesar da notoriedade do perfil, os criadores enfatizaram que a relevância está em torno do trabalho que fazem, não de cada um deles.
Os dois fizeram questão de falar que as pessoas não os reconhecem na rua. “O Diet Prada não é sobre nós”, afirmou Schuyler. “E nós nunca quisemos que fosse”, completou Liu. Também lembraram que gostavam do mistério de fazer as postagens sem revelar quem estava por trás, mas saíram do anonimato em prol da transparência que tanto defendem. Ao mesmo tempo, viram como uma oportunidade de contar a própria história.
“Nós mantemos uma espécie de equilíbrio. Mostramos nossos rostos para garantir credibilidade”, observou Lindsey. O parceiro fez graça: “É estranho. Quero continuar invisível, nem faço contato visual.”
Além de sócios, Lindsey Schuyler e Tony Liu são amigos. Quando não estão juntos fisicamente, estão sempre em contato.
Na vinda ao Brasil, eles relataram como funciona o trabalho. “Não é nada organizado”, revelou Liu. Os Robin Hoods da moda — como são comumente chamados — costumam salvar várias fotos no celular mesmo. Depois, fazem comentários e compartilham um com o outro por meio do bloco de notas.
O resultado é simples. Fotografias de novos designs são justapostas a imagens de trabalhos mais antigos e similares. As legendas são provocativas. O constrangimento segue. No material, também estão vídeos humorísticos e até de cunho político.
Os seguidores sempre entram na onda e, hoje, se tornaram uma fonte de conteúdo. “Falamos com os ‘dieters‘ todo dia, comunicação é muito importante quando as pessoas estão nos seguindo e investindo o tempo delas em nós”, expressou Liu.
A iniciativa vai muito além da exposição de cópias e brincadeiras. A página se transformou em uma fonte de mídia disruptiva que engloba uma ampla gama de questões, como assédio de modelos, discriminação racial e apropriação cultural.
Os momentos mais gratificantes, para eles, são aqueles em que ajudam vítimas de abuso a conseguirem justiça. “O #MeToo aconteceu em Hollywood, mas a indústria da moda realmente não tinha falado sobre isso”, apontou Lindsey Schuyler. “Quando começamos a denunciar os fotógrafos, ocorreu o mesmo. Queríamos acabar com um sistema que permitia que eles continuassem abusando de pessoas”, acrescentou.
Entre os acusados, está Marcus Hyde, conhecido pelos cliques de celebridades renomadas. Tudo começou quando uma modelo declarou publicamente que ele estava cobrando nudes para trabalhar com ela. Depois que o Diet Prada colocou à tona, várias mulheres apareceram contando que haviam passado por situações parecidas, incluindo casos de estupro. A repercussão foi tão grande que até Kim Kardashian e Ariana Grande prestam apoio às vítimas.
Outro nome denunciado foi Timur Emek, que já trabalhou com modelos da Victoria’s Secret, como Alessandra Ambrosio e Candice Swanepoel. O profile postou prints que mostram o fotógrafo assediando mulheres em conversas. Além de assédio físico a uma garota, Emek teria oferecido ajuda no mercado fashion a outra em troca de “alguma diversão”, justificando com “sou um homem. Pensa nisso”.
O Diet Prada também foi responsável por expor mensagens que levaram ao escândalo envolvendo a Dolce & Gabbana e a China. Compartilhou capturas de tela de supostos comentários racistas de Stefano, em mensagens trocadas com a jornalista de moda Michaela Phuong Tranova. Nelas, o estilista defenderia a campanha e se referia à China como “um país de merda”.
A apresentação da marca em Xangai foi cancelada. Contudo, não começou aí. Em 2017, Stefano Gabbana foi acusado de copiar o conceito de uma instalação da Gucci.
Em entrevista para a imprensa internacional, o estilista cobrou um pedido de desculpas do perfil. Como resposta, o Diet Prada criou uma camiseta com a frase #PleaseSaySorryToMe (“Por favor, me peçam desculpa”, em tradução livre).
Na entrevista à coluna, Lindsey Schuyler e Tony Liu lembraram que, graças aos ‘dieters‘, colocaram marcas brasileiras nas comparações. A Skazi, por exemplo, bloqueou a dupla norte-americana depois de ver peças associadas a referências de marcas internacionais.
Com a fama do Diet Prada, hoje, eles fecham collabs comerciais, mas os parceiros não deixam de ser alvo de críticas. Para o futuro da moda, em geral, os criadores do perfil mais temido da moda esperam designs atemporais, com mais diversidade, sustentabilidade e, claro, autenticidade.
A dupla também contou que é fã de uma marca brasileira em específico: a Osklen, de Oskar Metsavaht. “Gosto do uso de materiais naturais, como o couro de pirarucu”, revelou Liu. “Acho que a marca se parece com o Brasil. Quando você olha, você pega a vibe“, acrescentou Schuyler.
Eles também comentaram que amaram a estadia no país e o jeito dos brasileiros. “São todos amáveis, hospitaleiros e legais”, elogiaram no bate-papo. Sucesso!
O Iguatemi Talks aconteceu de 22 a 24 de outubro na capital paulista. A iniciativa de moda incluiu palestras, bate-papos, workshops e mentorships. Entre os temas discutidos, estavam caminhos para sustentabilidade, mercado internacional de luxo, valorização de técnicas manuais e futuro da profissão de estilista.
Colaborou Rebeca Ligabue