Ibaneis pede ao CNMP processo administrativo contra promotor Gazzinelli
O governador denunciou que estaria sendo alvo de retaliação por parte do promotor. MPDFT defendeu atuação de Eduardo Gazzinelli
atualizado
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O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), protocolou uma reclamação disciplinar junto ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra o promotor de Justiça Eduardo Gazzinelli Veloso. O documento foi cadastrado no CNMP na última sexta-feira (29/05).
Ibaneis pediu a instauração de processo no Conselho alegando que o promotor teria praticado ilícito administrativo análogo à prevaricação. O governador aponta supostas irregularidades envolvendo uma visita feita por Gazzinelli ao hospital de campanha erguido no Estádio Nacional Mané Garrincha.
O chefe do Executivo local também indica, na ação, hipótese de violação ao princípio constitucional de promotor natural e aos deveres de guardar decoro pessoal, desempenhar com zelo e probidade as suas funções e tratar com urbanidade as pessoas com as quais se relacione em razão do serviço.
Ibaneis solicitou ao CNMP liminar para que Gazzinelli se abstenha de visitar as instalações de saúde de referência aos pacientes em tratamento contra o novo coronavírus no Distrito Federal.
Caso essa solicitação não seja atendida, o governador requer que seja determinado, também de forma liminar, que o promotor avise, com pelo menos 24 horas de antecedência, a intenção de visitar as unidades e informar o número de pessoas que irão acompanhá-lo.
O alvo do documento de 14 páginas de Ibaneis é uma “blitz de fiscalização” feita por Gazzinelli, junto a uma comitiva com cerca de 12 pessoas, ao hospital de campanha no mês passado.
O problema é que, segundo alega o governador, Gazzinelli teria violado o princípio de promotor natural porque não integra a força-tarefa contra a Covid-19 criada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Gazzinelli é titular da 3ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep).
Ibaneis destacou que o promotor, “de maneira oficiosa, e, sem se identificar de maneira própria e ostensiva, passou a exigir, de forma anormal, a prestação imediata de contas do recebimento de equipamentos e produtos de saúde”.
“Não há qualquer dúvida de que, no contexto ora relatado, sem qualquer deferência ao princípio do promotor natural e em evidente desvio de finalidade, prevalecendo-se, ainda, de sua posição de membro do Ministério Público, o reclamado criou, impropriamente, um clima de intimidação para controlar, supostamente, a execução de contratos relacionados à implantação e funcionamento do Hospital de Campanha”, disse Ibaneis no processo.
Para reforçar as alegações contra Gazzinelli, foram colhidos depoimentos de pessoas que estavam no local no momento da visita. Os relatos estão registrados no 4º Ofício de Notas, Protesto de Títulos, Registro Civil, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas do Distrito Federal.
Conforme o documento apresentado ao CNMP, o hospital de campanha é um local de circulação restrita a fim de garantir proteção sanitária e nem todos os visitantes usavam máscaras apropriadas.
Inaugurada em 22 de maio de 2020, a unidade tem 197 leitos. O contrato de R$ 79 milhões para a administração do espaço é alvo de investigação pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e pelo próprio MPDFT. Os órgãos de controle apuram supostas irregularidades envolvendo direcionamento na dispensa de licitação.
O Governo do Distrito Federal (GDF), frisou Ibaneis, está aberto para contribuições ministeriais, mas exige “mínimo de ordem e bom senso”. “Não admitirá, portanto, em hipótese alguma, que instalações públicas sejam simplesmente invadidas por comitivas intrusivas”, afirmou o governador.
“Durante todo o período de emergência sanitária, é bom assinalar, o Governo do Distrito Federal jamais se furtou a prestar qualquer informação requisitada por qualquer integrante da força-tarefa no tocante às ações relacionadas ao combate à doença; de forma altamente transparente, por sinal, condensa todas as suas ações em um sítio na internet para facilitar as ações de controle e também para favorecer a fiscalização exercida pela generalidade dos cidadãos brasilienses”, disse.
Retaliação
A motivação, de acordo com o processo, para a atitude alvo da reclamação, é suposta retaliação contra Ibaneis, segundo assinalou o próprio governador.
Isso porque o emedebista teria, como o próprio governador descreve, se recusado a pleitear junto ao ex-presidente da República Michel Temer (MDB) a nomeação de Gazzinelli como procurador-geral de Justiça do MPDFT para o biênio de 2018 a 2020. O promotor ficou em segundo lugar na lista tríplice.
O advogado Cleber Lopes teria feito a intermediação com Ibaneis a pedido de Gazzinelli. No documento enviado ao CNMP, Ibaneis ainda diz Gazzinelli foi preterido por falta de afinidade com Temer porque teve destacado papel na Operação Lava Jato, que ofereceu duas ações penais contra o ex-presidente.
“Ressentido com a falta de apoio e com a escolha presidencial da ilustre Dra. Fabiana Costa Oliveira Barreto, que ocupava a terceira posição entre os mais votados, para ocupar o cargo de chefe do MPDFT, o reclamado resolveu, portanto, em plena pandemia, retaliar o hoje governador, tentando lançar sobre a sua gestão em defesa da saúde pública do Distrito Federal a vil suspeita de desonestidade”, afirmou.
Segundo Ibaneis, Gazzinelli, “frustrado em suas aspirações políticas, flerta, em tese, com a prevaricação, em ato ilícito administrativo que se assemelha, perigosamente, ao delito tipificado no art. 319 do Código Penal Brasileiro”.
Inércia
Ibaneis destacou, no documento, que o CNMP deve atuar no caso porque houve inércia do MPDFT. Segundo o governador, o desvio de conduta noticiado ao CNMP foi comunicado primeiro à procuradora-geral de Justiça do MPDFT, Fabiana Costa. Na ocasião, foi pedida apuração de suposta violação funcional. Porém, não houve encaminhamento nem resposta, de acordo com o chefe do Executivo local.
O que diz o MPDFT
Em nota enviada à coluna, o MPDFT afirmou que Ibaneis cientificou o órgão acerca de visita realizada pelo promotor com o intuito de fiscalizar as instalações hospitalares do Estádio Nacional. “O documento questiona o fato de o promotor de Justiça não integrar a força-tarefa instituída no âmbito do MPDFT para fiscalização das ações de combate e prevenção à Covid-19”, disse.
“Ocorre que a força-tarefa foi instituída no âmbito do MPDFT com a finalidade de coordenar e otimizar a fiscalização das ações de combate e prevenção à Covid-19, mantendo preservadas as atribuições de cada Promotoria de Justiça, em respeito ao princípio do promotor natural e da independência funcional dos membros do Ministério Público”, destacou o órgão.
“Nesse sentido, o MPDFT esclarece que o Promotor de Justiça Eduardo Gazzinelli é titular da 3ª Prodep, que possui atribuição de defesa do patrimônio público e social do Distrito Federal. Entre suas atribuições está o controle da atuação dos agentes políticos e administrativos do Distrito Federal”, concluiu.
Confira na íntegra a reclamação disciplinar de Ibaneis contra Gazzinelli:
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Operação
A PCDF e o MPDFT deflagraram, no dia 15 de maio de 2020, a Operação Grabato, a fim de apurar supostas irregularidades em contrato emergencial firmado para construção do hospital de campanha no Mané Garrincha. A suspeita é de direcionamento no processo que levou a contratação no valor de R$ 79 milhões.
As investigações em curso alcançam, ainda, os procedimentos de admissão de empresa para gerir as UTIs do Hospital da Polícia Militar do DF (PMDF) e de aluguel de ambulâncias, ambas relacionadas aos esforços de enfrentamento à pandemia.
A suspeita dos investigadores é a de que a empresa contratada tenha se aproveitado da situação de calamidade para, com a participação de servidores públicos, supostamente, burlar regras legais e firmar contrato com a Secretaria de Saúde, causando prejuízo aos cofres públicos.
À época da operação, a Secretaria de Saúde informou que estava colaborando com as autoridades e que preza pela transparência e lisura dos processos de compras e contratações, tanto nos casos regulares, quanto nos emergenciais.