Ação da Agefis em pousada da família de Joe Valle acaba em exoneração
O órgão lacrou a casa da mãe do presidente da Câmara Legislativa, que funcionava como pensão mesmo sem ter licença
atualizado
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Operação da Agência de Fiscalização (Agefis) de combate a pousadas irregulares na 703 Sul, no último dia 13 de abril, azedou ainda mais a já conturbada relação entre os poderes Executivo e Legislativo do Distrito Federal. O órgão lacrou a casa da mãe do presidente da Câmara Legislativa, Joe Valle (PDT), que funcionava como pensão mesmo sem ter licença. A ação resultou na exoneração de dois servidores da agência.
Na terça-feira (24/4), o Diário Oficial do DF registrou a exoneração de Lucilene Abreu da Silva Nogueira da Superintendência de Fiscalização de Atividades Econômicas da Agefis. O diretor presidente adjunto, Wagner Martins Ramos, também perdeu o cargo. A medida foi determinada pelo governador Rodrigo Rollemberg (PSB).
A atitude, no entanto, não foi suficiente para acalmar Joe Valle. Embora reconheça o fato de a pousada não ter autorização para funcionar, o presidente da Câmara disse que a família foi vítima de uma ação violenta e truculenta por parte da Agefis.
Nenhuma família do Distrito Federal merece passar o que passamos. Minha irmã, que administra e mora na casa, ficou apavorada. Meus sobrinhos entraram em estado de choque
Joe Valle, presidente da CLDF
De acordo com Joe Valle, os agentes usaram pé-de-cabra para arrancar o portão, quebraram o mármore da casa, tiraram o corrimão, levaram os móveis e reviraram todo o lugar. “Se eles usaram dessa violência na casa da mãe do presidente da Câmara Legislativa, imagina com as famílias de periferia que não têm voz”, disse.
Segundo a Agefis, o local havia sido interditado e multado em 2008, mas voltou a funcionar. Para o parlamentar, porém, o conteúdo da operação pode até ser legítimo, mas a forma foi “absolutamente desastrosa”.
Veja as fotos da operação e do interior da casa:
Dois dias antes da ação de combate a pousadas irregulares em áreas exclusivamente residenciais, os deputados distritais aprovaram o novo Código de Obras e Edificações do Distrito Federal, que retirou poderes da Agefis.
Uma das emendas ao projeto estabelece que uma vez concedido Habite-se ao estabelecimento, a agência não poderá mais entrar no local. A mudança desgostou o comando da Agefis. A medida é avaliada como um possível motivo para uma retaliação ao Legislativo.
Aluguel de quartos
Conforme explicou Joe Valle, a casa pertence aos pais dele. A mãe já não mora no local, mas começou há décadas a receber funcionários do Banco do Brasil que vinham ao DF fazer treinamentos. O pai dele era servidor de carreira da instituição. A matriarca se mudou para a Paraíba e uma das irmãs, Rosaria Carla Viana Valle, assumiu o negócio, alugando quartos no subsolo do imóvel.
A atividade extra ganhou impulso em 2014, com a realização da Copa do Mundo em Brasília. A casa, contou o parlamentar, começou a funcionar recebendo hóspedes no sistema cama e café. De acordo com o distrital, desde 2008 a família tenta regularizar a pensão.
O presidente da CLDF afirmou à coluna não responder pelos atos da irmã. “Mas, se a Agefis tivesse de cumprir uma ordem de serviço, que o fizesse sem violência, sem truculência”. Ainda segundo Valle, mesmo ele tendo recebido uma ligação assustada do cunhado, não tomou qualquer medida ou fez ingerências.
Na semana seguinte, teria encontrado a presidente da Agefis, Bruna Pinheiro, em uma agenda comum: “Ela veio se explicar, pedir desculpas. Falou que estava viajando”. Conforme esclareceu o deputado, todo o ocorrido a partir daí foi por conta da agência e do GDF.
O outro lado
O chefe do Executivo local garantiu, por meio de sua assessoria, desconhecer que a ação da Agefis se daria na residência ocupada por familiares do presidente da CLDF. Tão logo soube, procurou se informar dos motivos da operação e, posteriormente, determinou o afastamento dos servidores que a teriam autorizado: “O governador Rollemberg e o seu governo não adotam qualquer tipo de medida específica e dirigida contra qualquer pessoa, seja física ou jurídica”.
Bruna Pinheiro reforça a versão: “A ação está no nosso acordo de resultados. Estabelecida em metas a serem cumpridas. Não houve nada fora do padrão, do ponto de vista técnico e jurídico, a operação foi correta”.
A presidente da Agefis explicou que existe uma sentença transitada em julgado (veja abaixo) determinando o fechamento de todos os estabelecimentos não residenciais naquela região, sob pena de sanção correspondente e exasperação no caso de persistência, com multa de R$ 2 mil por dia caso a agência não a cumpra.
A decisão, de 2010, transitou em julgado em 13 de setembro de 2017. De acordo com Bruna Pinheiro, a medida alcançou 45 estabelecimentos que insistiam em funcionar. Vinte oito teriam sido fechadas em operações desde 2016, 11 deixaram a atividade espontaneamente. Segundo a presidente da Agefis, ainda faltavam seis pousadas. Entre elas, a que funcionava na casa da mãe de Joe Valle. No dia 13, outra foi fechada na mesma quadra.
Em março deste ano, em uma nova tentativa de os estabelecimentos se manterem na região, o Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT) negou o pedido. Confira:
“Estava de férias e fui tomada de surpresa. As operações sempre geram consequências muito duras, desde a apreensão de mercadorias de ambulantes à derrubada de casas. Por isso, elas precisam ser comunicadas e aprovadas, para que avaliemos se realmente é a última alternativa”, ressaltou.
A presidente da Agefis informou que nesta quarta-feira (25), a família de Joe Valle entrou com recurso na agência: “Se tiver havido qualquer abuso, os autores serão responsabilizados”.