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RP brasileira revela segredos da experiência com a família real britânica

A paulistana Gilda Fleury compartilhou com a coluna curiosidades sobre a realeza e experiências que vivenciou como profissional

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Família Real
1 de 1 Família Real - Foto: MSI/Mirrorpix/Getty Images

Quem assistiu à série The Crown pode perceber que a vida na realeza detém de uma extensa lista de deveres e protocolos a serem seguidos. Uma simples visita da rainha Elizabeth a outro país, por exemplo, envolve uma dezena de profissionais por trás da aparição.

Cada passo dado por ela é cronometrado. Cada alimento oferecido, preparado com todo o cuidado. Cada pessoa apresentada a ela tem um porquê. Orquestrar eventos oficiais não é tarefa fácil. Exige um código formal e extremamente detalhista. Quem conhece bem essa linha pragmática é a relações-públicas paulistana Gilda Fleury.

Expert quando o assunto é etiqueta no meio oficial — e na realeza —, ela conversou com a coluna Claudia Meireles para compartilhar de seu conhecimento, contar algumas experiências que vivenciou e revelar algumas curiosidades sobre os protocolos da família real.

Confira o bate-papo:

Como começou seu contato com o cerimonial de visitas oficiais?
Eu e minha família somos monarquistas. Nos meus 20 e poucos anos, a rainha Elizabeth veio conhecer o Brasil. O governador da época era muito amigo do meu pai. Ele e o meu tio eram secretários do governo. Eu fiquei encantada com a vinda dela e com todos comentando sobre os procedimentos de sua chegada.

Quando eu era pequena, convivia com um especialista em boas maneiras, Marcelino de Carvalho, que vivia lá em casa e me explicava como se comportar à mesa. Eu tinha esse tipo de vivência.

Voltando à visita da Elizabeth, eu falei com meu pai que gostaria de ver os preparativos para a chegada. Ele deixou, eu fui ao palácio e vi todos os procedimentos, a segurança e as ações que precisariam ser feitas, e eram imensas.

Em São Paulo, teve um banquete no Jockey Club em que ela e o príncipe Philip participariam. Ela era bem moça na época. Fiquei ainda mais encantada. Foi quando aprendi que sempre quando vem uma autoridade, é preciso fazer uma precursora. E foi aí que começou o meu interesse.

Rainha Elizabeth e príncipe Philip
Rainha Elizabeth e príncipe Philip

Passou um tempo, eu me formei e resolvi fazer relações públicas, o que tinha tudo a ver com isso. Não existia faculdade de cerimonial na época, como não existe até hoje, infelizmente. Eu tinha essa vontade de trabalhar com isso, não só com a realeza, mas com a recepção de visitas oficiais. E o RP motivava muito isso. Eu gostava de recepcionar e de conhecer hábitos e costumes de pessoas completamente diferentes de nós, de respeitá-los e de aceitá-los.

Montei uma empresa com meu marido e, na década de 1980, tínhamos muito trabalho voltado à assessoria de imprensa. Logo, fui convidada para trabalhar no governo de São Paulo como relações-públicas. Em seguida, fui trabalhar na Secretaria de Estado da Saúde. Dei consultoria para o governador Fleury. Naquela época, afastei-me da empresa e meu marido continuou.

O interesse pelas visitas oficiais foi aumentando. Então, comecei a me especializar e até escrevi sobre isso, chegando a lançar o livro O negócio é o seguinte – Hábitos e costumes dos povos e sua influência na vida empresarial, em colaboração com Maria Eliza de Araujo Barros, em 2005. Eu já tinha outra obra literária, Protocolo e Cerimonial – Normas, Ritos e Pompa.

Atendi também a Vale S.A. por mais de 20 anos. Eu dava capacitação e fazia recepção com eles. Eles recebiam muitas visitas oficiais, tudo objetivando a parte comercial. Uma vez, recebi uma comitiva árabe e fiquei muito impressionada.

Fale sobre sua experiência com a princesa Diana…
Na década de 1990, ela veio com o príncipe Charles. Fiquei encarregada de recebê-la na Febem (Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente, anteriormente chamada Fundação Estadual para o Bem-estar do Menor), em São Paulo. Na época, não havia celulares como os de hoje.

Lady Di
Lady Di

As crianças fizeram um buquê de flores e o colocaram em um balde de água para as elas não murcharem. Quando a Lady Di entrou, elas fizeram uma fila, cantaram e entregaram o buquê para ela. Só que, como ele estava no balde, acabou molhando a parte da frente de seu vestido. Então, eis que, na minha frente, estava uma princesa molhada, e não havia o que fazer.

Os seguranças e o cerimonial me perguntaram onde era o toilette e eu fui ajudar. Chegando lá, pensei: ‘o que eu converso com ela?’ Aí está a necessidade de pesquisar tudo antes sempre. Depois, eu soube pelo chefe de cerimonial dela que a gente deve sempre conversar sobre o nosso país e o dela, assim como a beleza, o clima, a fauna e a flora. E nunca sobre problemas pessoais. Foi uma grande lição. Diana era altamente simpática e extremamente atraente.

princesa diana e charles
Diana e Charles

E a experiência com a rainha-mãe Elizabeth, esposa do rei George VI e mãe da rainha Elizabeth II, no encontro com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso? 
Quando eu estava assessorando o Fernando Henrique Cardoso, na Presidência da República, nós fomos ao Palácio de Buckingham, e eu organizei um banquete no qual acontece uma troca de presentes. Chegando lá, tivemos um contato com a rainha-mãe, que hoje é falecida. Na época, ela participaria do banquete, porém, por determinação do protocolo real, não existe a possibilidade de que ela jante com alguém que não conhecesse antes. Então, foi marcado um chá para que o presidente e a senhora Ruth Cardoso fossem apresentados.

Fernando Henrique Cardoso
Fernando Henrique Cardoso

Simpaticíssima, a rainha-mãe havia dito que gostaria muito de receber um presente que tivesse alguma pedra brasileira. Foi escolhida uma escultura de um pássaro feita com ametista, pedra preciosa de cor violeta intenso. Ela ficou encantada e perguntou ao presidente que animal era aquele. Ele olhou para os que estavam presentes na hora e teve um lapso de inteligência, após se lembrar do nome do palácio em que morava o vice-presidente do Brasil, o Palácio do Jaburu. Foi um momento descontraído e a rainha-mãe tentava pronunciar a palavra “Jaburu”. Por sua vez, Fernando Henrique Cardoso ganhou um porta-retrato com a fotografia dela, peça que é uma verdadeira obra de arte.

À noite, eles conversaram por todo o tempo. A rainha-mãe perguntou ao presidente se ele sabia dançar tango, e ele respondeu que sabia muito pouco. Eles se deram muito bem.

Pode contar algumas curiosidades sobre o comportamento das autoridades nos eventos? 
Eles comem muito pouco. Sabe por quê? Problema de toilette. Já imaginou a rainha, algum sheik árabe ou o sultão do Brunei comerem muito em público e depois terem que ir ao toilette e interromperem a cerimônia? Tudo bem, é comum. Mas, em exibições em público, eles comem pouco para isso não acontecer.

Rainha Elizabeth II
Rainha Elizabeth II

Outra coisa é que eles não se alimentam com comida que pode fazer mal, como coquetel de camarão ou frutos do mar, pois pode dar indigestão ou alergia. E não dá para a rainha vomitar na frente de todo mundo. Embora possa acontecer, são prevenções que devem ser tomadas.

Ainda, a família real recebe muito bem. Além disso, eles são muito pontuais.

Todas as famílias reais têm damas de companhia, além de assessores. Eles são responsáveis até por colocar a pasta na escova de dentes. É uma questão de segurança. Quando o Obama assumiu o cargo de presidente dos Estados Unidos, por exemplo, as ameaças de morte se multiplicaram em cinco vezes. Outro caso foi a facada do Bolsonaro, ou até mesmo a tentativa de assassinato do Papa João Paulo II. Eles são altamente visados, não podem correr nenhum risco.

Facada/ Bolsonaro
Em campanha, Jair Bolsonaro levou uma facada

Profissionais que trabalham com autoridades têm que ser de confiança e manter tudo em sigilo. Se alguém ficar sabendo de algo, por exemplo, não pode contar a ninguém. Se estou atendendo o presidente e fico sabendo de uma reunião, eu não posso divulgar isso, pois pode ser prejudicial. É uma segurança técnica e operacional também, não só física.

Tudo precisa ser extremamente discreto, como o caso do rei Carlos XVI Gustavo da Suécia e da rainha Sílvia Sommerlath, que vieram ao Brasil e conheceram as Cataratas do Iguaçu. O rei, de repente, foi picado por uma abelha. Eu me lembro do olhar deles na hora que isso aconteceu. Mas todas as atitudes foram tomadas sem ninguém fazer alarde.

Do mesmo jeito ocorreu com o rei da Espanha que, ao entrar no plenário, em visita no Brasil, tropeçou e caiu no chão. Ele quebrou o nariz, imagina a dor! Rapidamente, os seguranças o envolveram para que não houvesse fotografia. Ele entrou e ainda fez a reunião, para depois se cuidar. Existe todo um atendimento médico e segurança, mas, novamente, sem alarde.

Dê exemplos de protocolos que devem ser seguidos mediante à realeza. 
Nos brindes oficiais com a família real, principalmente, e até governamentais, todas as pessoas se levantam e erguem os copos e dizem “saúde”, sem precisar bater os copos. Hoje, eu tenho a relação de todas as traduções da palavra “saúde”.

rainha elizabeth
Elizabeth II

Na hora do cumprimento, nós não estendemos as mãos para eles. Eles que devem ter a iniciativa. Sempre parte da autoridade mais importante.

Existe outro cumprimento para as mulheres. Na frente da rainha, por exemplo, nós fazemos reverência, abaixando o joelho esquerdo. O direito é só para Deus. Mas tudo isso está em desuso. Hoje em dia, as rainhas estendem mais as mãos. A rainha Letícia da Espanha, Sofia da Grécia, Sílvia da Suécia, Sônia da Noruega, entre outras, são muito mais atuais, sendo que algumas até beijam. Lógico que, hoje, tudo está mais moderno. A rainha Elizabeth foi a primeira a ter celular, por exemplo. Ela guarda dentro da bolsa junto com o batom, o espelho e o lenço. Continua a tradição, mas temos a tradição com a inovação.

Como devemos chamar cada autoridade real?
Para a rainha, usamos “vossa majestade”; os príncipes nós chamamos de alteza; usamos “excelência” para os condes e viscondes; já os duques, temos senhor duque.

O mesmo vale para os sheiks árabes ou os sultões. Todos eles são do nível de excelência. Os tratamentos diferenciam as pessoas.

Afinal, quantas são as famílias reais pelo mundo? E como elas são divididas?
Há 43 reinos no mundo, sendo três principados (Mônaco, Liechtenstein e Andorra), três emirados (Árabes, Kuwait e Qatar), dois sultanatos (Brunei e Omã), um império (Japão), um grão-ducado (Luxemburgo) e um papal (Vaticano).

Sobre a especialista

Gilda Fleury
Gilda Fleury

Formada em comunicação social pela FAAP, Gilda Fleury fez especialização em relações públicas e polivalência em jornalismo e publicidade. Concluiu pós-graduação na USP em ciências da comunicação e especializou-se também em RP na França, seguindo para os Estados Unidos com foco em comunicação empresarial.

Gilda é fundadora da empresa Ibradep, instituto voltado para capacitação e organização de eventos. Também trabalhou no governo de São Paulo e no governo federal, na década de 1990.

Para saber mais, siga o perfil da coluna no Instagram.

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