Busca pelo autoconhecimento aumenta interesse por medicina Ayurveda
A terapeuta brasileira que vive na França Tatiane Pinheiro dá dicas de como ter uma vida mais saudável com os ensinamentos indianos
atualizado
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O isolamento social forçado pela pandemia do novo coronavírus mexeu com os hábitos de pessoas dos quatro cantos do mundo. Para quem pôde ficar em casa, o período em confinamento pode ter significado tempo para cuidar do próprio bem-estar com novas práticas, como as da milenar medicina Ayurveda.
A prática foi criada há mais de 5 mil anos na Índia e tem adeptos até os dias de hoje. A Ayurveda é um sistema integral, que consiste em enxergar o indivíduo como um todo, fazendo o diagnóstico de doença através de práticas de alimentação específica individual, considerando clima, lifestyle, campo mental, atividade física, banho de sol e técnicas para melhorar a qualidade do sono.
Seus benefícios incluem colocar corpo, mente e alma em sintonia e ensinar as pessoas a ouvirem o próprio organismo para prevenir doenças e manter um estado de vida pleno.
A brasileira Tatiane Pinheiro está há seis anos inserida neste universo e trabalha como terapeuta ayurvédica na França, onde faz cursos e alimenta os seguidores do Instagram com conteúdo diário e simplificado sobre o assunto. Ela garante que a pandemia fez o interesse pelo tema aumentar nos últimos meses.
Segundo Tatiane, ao lidarmos com um vírus desconhecido como o causador da Covid-19, demos de cara com nossas fragilidades. Nos últimos meses, muitas pessoas entenderam ser o momento certo para se dedicar ao bem mais precioso: a saúde.
Na visão ayurvédica, uma pessoa está doente quando não se sente completamente bem. Quando tem dores de cabeça sem justificativa, o intestino que não funciona satisfatoriamente ou não está com a energia plena. “Muito diferente da forma como vivemos atualmente, na qual nos acostumamos com o mal-estar e a baixa qualidade de vida. Muitas pessoas não se sentem bem mesmo quando seus exames de sangue estão todos normais”, pondera.
Primeiros passos
Para quem está começando nesta jornada, Tatiane sugere um trabalho de autoconhecimento. Prestar mais atenção aos episódios de dor de cabeça e intestino preguiçoso sem explicação, por exemplo, são fundamentais para entender o próprio corpo. “São formas do corpo se comunicar dizendo que não está gostando da forma que está sendo tratado”, afirma.
Feito isso, a primeira dica é reduzir estímulos. “Não precisamos estar com 10 abas abertas no computador enquanto mantemos três conversas paralelas no WhatsApp e ainda estamos rolando o feed no Instagram. Focar em uma atividade por vez é poderoso para nos trazer ao momento presente, e assim a conversa com o corpo fluirá”, sugere.
A especialista no assunto considera a Ayurveda um sistema de saúde ritualístico. Ele envolve acordar e não usar o celular pela primeira hora do dia, beber um líquido quentinho – que não seja café– para despertar o corpo de forma gentil, ouvir o corpo e comer com fome real até a sensação de saciedade, praticar alguma atividade física, tomar sol e aprender a estar na própria companhia e em silêncio, por exemplo.
Duas das técnicas mais populares da medicina Ayurveda são a escovação do corpo e a raspagem da língua com um utensílio de metal. A primeira é um ritual simples, barato e antigo para eliminar as células mortas e toxinas do corpo de uma maneira suave a gradativa, com escova de cerdas naturais ou uma bucha vegetal. A frequência vai depender do nível de sensibilidade de cada pessoa. De modo geral, ela pode ser feita entre uma e duas vezes na semana em peles saudáveis. A raspagem da língua para observação da saburra, por sua vez, deve ser diária, antes de beber qualquer líquido, comer ou até mesmo escovar os dentes.
São pequenas atitudes ao longo de todo o dia para promover saúde perfeita e vida longa e feliz. Diferente de como vivemos.
Tatiane Pinheiro
Segundo a terapeuta, em cada momento do dia, há uma energia específica imperando. A forma como as pessoas tratam seus corpos e mentes nos primeiros instantes ao acordar define a qualidade de vida que elas terão durante toda a rotina, pois o corpo e a mente são constantemente colocados em estado de estresse.
“Logo quando nos levantamos, devemos nos preocupar em despertar o corpo, muito diferente do que fazemos normalmente com um despertador alto. Saltamos da cama, pois sabemos que estamos atrasados para sair, engolimos um café da manhã que não nos faz bem, mas não paramos para prestar atenção, enquanto usamos redes sociais e saímos correndo para ir trabalhar”, explica.
“Somos acostumados a uma vida sem presença. O corpo está no momento presente, porém, a mente está no passado ou no futuro, pensando nos ‘e se’ que em muitas vezes não acontecem e gastamos energia à toa”, completa.
Tatiane sugere que a principal refeição do dia seja feita com maior volume e variedade, entre 12h e 13h, quando o sol está mais forte no céu. A partir das 18h, quando o sol começa a se pôr, deve-se começar a desacelerar as atividades conforme for possível, bem como evitar excessos.
Apesar de milenar, a técnica passou por mudanças ao longo dos séculos para se adaptar ao mundo moderno, com novos estudiosos alinhando os conhecimentos com os avanços da medicina ocidental moderna. Tatiane trabalha com o que chama de Ayurveda vida real. “Eu faço este trabalho de compreender os ensinamentos milenares e trazê-los para essa vida agitada na qual não dá tempo para nada. Nós fazemos caber”, conta.
Em busca do autoconhecimento
A medicina Ayurveda entrou na vida de Tatiane por acaso, há seis anos, enquanto pesquisava por receitas da gastronomia indiana na Internet. Até então, ela atuava como arquiteta e urbanista, gestora de obras de varejo, com um estilo de vida exaustivo que envolvia muitas viagens e ausência de rotina.
“Eu venho de um total extremo, vivia uma vida com nenhuma qualidade, zero bem-estar. Sofri com compulsão alimentar a vida inteira e saúde é uma palavra que nunca esteve em meu vocabulário. O padrão do meu intestino era ficar mais de 10 dias sem funcionar. Eu não tinha disposição para fazer nada, memória fraca, mente confusa, enxaqueca crônica, TPM”, recorda.
Aos poucos, ela passou a introduzir as ferramentas da Ayurveda no dia a dia e logo começou a sentir a melhora. Tatiane lembra que, quanto mais se aprofundava nos conhecimentos e encontrava formas de aplicá-los ao estilo de vida, melhor se sentia. Atualmente, ela garante que todos os desconfortos ficaram no passado e vive um estado de bem-estar que jamais imaginou ser possível de existir.
Somos uma sociedade doente que não conhece o estado total de bem-estar para ter como referência de objetivo.
Tatiane Pinheiro
Em 2018, ela abandonou a carreira de formação e passou a se dedicar exclusivamente à medicina ayurvédica com atendimentos virtuais. Em julho deste ano, no meio da pandemia da Covid-19, lançou seu primeiro curso on-line, onde ensina de forma prática e simples como aplicar o Ayurveda à vida real.
“Tornar-me terapeuta passou a ser um caminho lógico para a minha completa transição de carreira. Naquela época, saí do Brasil para fazer um ano sabático pela Europa, colocar a cabeça no lugar e descobrir como tornar o Ayurveda uma profissão. O curso me trouxe a possibilidade de levar meu trabalho a mais pessoas, uma vez que já não estava mais conseguindo atender à procura das consultas individuais”, disse.
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