YouTube já deletou 33 vídeos de Bolsonaro por fake news sobre Covid
Rede social já puniu o presidente por defesa de hidroxicloroquina no tratamento da doença e disseminação de informações falsas sobre vacinas
atualizado
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Com mais uma publicação retirada do YouTube, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) soma 33 vídeos removidos da plataforma devido à disseminação de informações falsas sobre a pandemia da Covid-19. Ao todo, o mandatário da República já teve 34 gravações vetadas — apenas uma delas não foi por propagação de teor inverídico. Todas as exclusões são deste ano, não havendo punições ao chefe do Executivo federal registradas em outros períodos.
Na última segunda-feira (25/10), a live rotineira do presidente – no caso, da quinta-feira anterior (21/10) – foi deletada da internet. Na publicação, o titular do Palácio do Planalto espalhou desinformação ao relacionar as vacinas contra a Covid-19 ao desenvolvimento da Aids. Além do YouTube, o Instagram e o Facebook retiraram o conteúdo do ar.
O vídeo também foi removido do canal de Carlos Bolsonaro, filho do presidente. A gravação havia sido republicada pelo vereador, mas acabou deletada na sexta-feira (29/10). Segundo o YouTube, a punição ocorreu por causa de violação das diretrizes da empresa, que proíbe conteúdos de criadores que estejam sob alguma restrição.
O YouTube removeu do seu domínio outra vez o vídeo em que o presidente aparece relacionando a vacina contra a Covid-19 à Aids. Desta vez, a gravação estava no canal do filho Carlos Bolsonaro. Na segunda-feira (25/10), a plataforma suspendeu o perfil do mandatário do país no site, por uma semana, devido às fake news disseminadas sobre o imunizante contra o coronavírus.
No vídeo, Bolsonaro afirmou que “relatórios oficiais do governo do Reino Unido sugerem que os totalmente vacinados, aqueles com 15 dias após a segunda dose, estão desenvolvendo a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids) muito mais rapidamente do que o previsto” – declaração falsa e rejeitada, nos dias subsequentes, por uma série de entidades médicas e científicas.
Entre os conteúdos deletados, grande parte demonstra, logo na chamada, a razão pela qual as regras da plataforma foram infringidas. Um dos vídeos excluídos tinha como título a frase “Imunologista/oncologista Nise Yamaguchi e o uso da hidroxicloroquina no tratamento do Covid-19″. A médica citada foi uma forte figura na defesa do medicamento sem eficácia contra a doença. A profissional chegou a ser ouvida pela CPI da Covid-19 por sua militância no assunto.
O vídeo de uma entrevista dada pela médica ao canal de televisão CNN foi postado por Bolsonaro em 13 abril do ano passado. O YouTube, entretanto, demorou mais de um ano para a exclusão do material. Segundo dados guardados pela plataforma de arquivamento de informações WayBackMachine, a publicação contabilizou mais de 42 mil visualizações apenas no dia da postagem.
Outro vídeo deletado da conta do chefe do Executivo federal continha uma conversa, veiculada em live de 12 de abril de 2020, entre o ex-assessor da Presidência da República Arthur Weintraub e o filho do presidente Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Como revelado pelo Metrópoles este ano, a gravação faz parte de uma série de conteúdos que apontaram a participação de Weintraub no chamado gabinete paralelo, grupo que orientava o mandatário do país na defesa do chamado “tratamento precoce”.
Somente após quase um mês da revelação do portal a plataforma excluiu o vídeo. Até isso acontecer, ao menos 3,3 milhões de pessoas já tinham assistido ao conteúdo.
Durante a conversa, Weintraub afirmou ter “estudado” o uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19: “Seu pai virou pra mim e disse: ‘Ô, magrelo, você que é porra louca, vai lá e estuda isso daí. Aí comecei a ler artigo científico, artigo que o pessoal começa a soltar. Esses caras me mandando, o Luciano Dias Azevedo, Paulo Zanotto, e falei pra ele [Bolsonaro]: cloroquina tá funcionando, já tem resultado. Passei pra ele os estudos, ele lê. Eu passo no zap e depois tá impresso na mesa dele”.
Exclusivo 🚨 Vídeos levantam suspeita de que Arthur Weintraub, ex-assessor presidencial, teria – sob orientação de Jair Bolsonaro – coordenado o “ministério paralelo” da saúde em 2020. À época, Arthur defendeu a mudança na bula da Cloroquina citada na #CPIdaCovid
🎥: @sampancher pic.twitter.com/V50q5wVLp0
— Metrópoles (@Metropoles) May 22, 2021
O levantamento de conteúdos deletados foi realizado pelo cientista de dados da empresa de análise Novelo, Guilherme Felitti, que vem mapeando as exclusões feitas em canais de extrema direita no país e contabilizando os casos em um banco de informações. Segundo o especialista, a publicação do material na plataforma, mesmo com risco de retirada do ar, tem uma função: a de alimentar aliados do presidente.
“É como um repositório, onde o que está ali se torna facilmente um conteúdo viral, que pode ser disseminado em outras redes sociais”, explica.
Para Felitti, chama a atenção a demora da tomada de decisões do YouTube. Em julho deste ano, a plataforma apagou de uma só vez 15 vídeos postados pelo presidente — 10 deles tinham sido publicados no ano passado, incluindo a entrevista com Yamaguchi.
“O YouTube tem regras boas, mas eles próprios não as executam como deveriam. E quando ocorrem as exclusões, ocorrem após pressão, em efeito cascata. A plataforma facilita [a disseminação de notícias falsas] quando não cumpre com as próprias regras”, assinala.
Veja a lista de vídeos deletados na página do presidente Jair Bolsonaro:
Em nota, o YouTube afirmou que utiliza tecnologia de machine learning para ajudar a detectar conteúdo potencialmente violador e enviá-lo para análise humana. Pontuou que se esforça “o máximo para garantir que o conteúdo que viole nossas regras não seja amplamente exibido, ou mesmo visualizado, antes de ser removido”. Ainda segundo a plataforma, 10 mil pessoas são responsáveis pela revisão e remoção de material que viola as diretrizes.
A Presidência da República foi procurada, mas não respondeu às tentativas de contato da reportagem. O espaço permanece aberto.
Trem copiado
De todos os vídeos excluídos do canal de Bolsonaro, apenas um não foi deletado por disseminação de notícias falsas sobre a pandemia. Intitulada “Ferronorte, na cidade de Alto Taquari/Mato Grosso”, a gravação, publicada pelo presidente em janeiro deste ano, mostra um comboio da empresa Rumo Logística saindo de Alto Taquari (MT).
A inauguração da primeira parte do trecho da Ferronorte aconteceu em 1999, o mais recente ocorreu em 2003. No entanto, publicações enganosas na época afirmavam que o trem era o primeiro a trafegar nos trilhos que fazem o caminho de Mato Grosso ao Porto de Santos (SP).
O vídeo foi originalmente publicado pelo entusiasta de trens e ferrovia Jeferson da Luz, no dia 24 de novembro de 2020, em seu canal no Youtube, Ferrovia Sul.
A publicação de Bolsonaro, entretanto, mostrava apenas a locomotiva passando, sem nenhuma mensagem de alusão a uma conquista de seu governo, como afirmavam outras postagens que circulavam. A exclusão se deu por direitos autorais.