Violência no RJ e na BA choca país e obriga governos a rever segurança
A violência nas cidades brasileiras tem obrigado governos, até então centrados na pauta econômica, a darem espaço à segurança pública
atualizado
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A execução de três médicos na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, chocou o país pela crueldade do crime e ligação de uma das vítimas com a política nacional. A barbárie compõe um quadro de violência que empilha cada vez mais casos de grande repercussão midiática. A situação se agravou a ponto de obrigar governos em todos os níveis a dar centralidade à pauta da segurança pública.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, comentou a execução dos médicos diretamente de Salvador (BA), onde cumpria agenda relacionada ao enfrentamento à maré de violência na Bahia. Apenas em setembro, 68 pessoas morreram em enfrentamentos com a polícia no estado.
A eclosão de casos de violência extrema em diversos pontos do país tem aumentado a sensação de insegurança da população, o que força os holofotes na direção da segurança pública na pauta política. O tema passa a dividir centralidade com a pauta econômica, até então a preferida dos gestores públicos.
O cientista político André César, da Hold Assessoria, considera que a busca por soluções para a insegurança nas cidades brasileiras entrou de vez na pauta da política nacional por força dessas circunstâncias. Ele descreve que dois fatores contribuíram para isso: o aumento da sensação de insegurança na população e a falta de respostas eficientes pelo poder público.
Resposta ainda insuficiente
Como resposta a essa onda de violência que atinge o país, o ministro Flávio Dino anunciou, nesta semana, o Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas. O investimento previsto para a iniciativa é de R$ 900 milhões entre 2023 e 2026.
Entre os objetivos do programa lançado pelo governo federal, está a integração das diferentes forças de segurança, incluindo as inteligências, para combater as facções criminosas. André César, porém, avalia que a gestão tem apresentado “uma grande carta de intenções, mas que efetivamente não tem nada de concreto”.
“Não tem nada claro ali, como de onde vem o dinheiro, para onde será distribuído, quais serão as competências dos governos municipais, estaduais e federal”, observa. “O governo federal tem que apresentar firmeza e capacidade de gestão. Até agora não vimos nada disso”, avalia o cientista político.
O anúncio ocorreu em meio a cobranças até mesmo de apoiadores do governo Lula, que avaliam negativamente a gestão de Dino na segurança pública. O governo federal é alvo de pressões para que a pasta seja dividida em um Ministério da Justiça e um da Segurança Pública, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) resiste até agora em fazer esse movimento.
Pressão também em São Paulo
Nos últimos meses, foram muitos os exemplos de violência crescente pelo país. Na Baixada Santista, o assassinato do soldado Patrick Reis, das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), desembocou em operação policial que resultou em dezenas de mortes em comunidades dominadas pelo tráfico – levantando a preocupação com a prática de extermínio e vingança por parte de agentes públicos paulistas.
Entre janeiro e agosto, de acordo com dados da Polícia Militar, ocorreram ao menos 54 óbitos em circunstâncias violentas nas cidades de Santos e Guarujá, na Baixada Santista. Desse total, 33 foram provocadas por policiais militares em serviço.
Outra caso que chama a atenção em São Paulo é o da falta de sucesso na luta contra a cracolândia, na capital do estado. Apesar das ações empreendidas pela Prefeitura de São Paulo com a internação de dependentes e prisão de traficantes, o fluxo do local segue alto, e a criminalidade assusta os moradores da região, que vivem sitiados e com medo.
Dificuldade histórica
O cientista político André César explica que, historicamente, os setores da esquerda têm dificuldade de lidar com questões de segurança pública. No entanto, ele avalia que a crise atual que atinge o país tem testado respostas de gestores dos mais diversos matizes ideológicos.
“Está todo mundo batendo cabeça”, afirma André César. “Historicamente, a esquerda teve dificuldade em abordar a segurança pública, mas no caso atual não só a esquerda está sendo afetada. Tarcísio e Cláudio Castro, por exemplo, também estão sendo afetados”, diz ele, referindo-se aos governadores de São Paulo e Rio de Janeiro, que são de direita.
Ele avalia que a pauta de segurança pública, que perdeu lugar nas Eleições de 2022, deve retornar ao centro das propostas no pleito marcado para 2024. Assim, a criminalidade que assola as cidades do país deve mobilizar políticos que esperam angariar eleitores.
“Nós vamos ter eleição municipal ano que vem, e certamente vai entrar na agenda pelo menos das grandes cidades”, diz.